Nove em cada dez instituições que oferecem o curso de direito no Brasil aprovam menos de 30% dos alunos na prova da OAB (Exame da Ordem dos Advogados do Brasil). O desempenho mínimo na avaliação é obrigatório para o exercício da advocacia no país.
Os dados foram tabulados pela reportagem considerando a porcentagem de aprovados no exame da OAB em relação aos presentes nas provas em três anos (de 2017 a 2019). Três exames são realizados por ano.
Ao todo, 790 instituições de ensino superior que têm curso de direito foram avaliadas. Isso representa todas as escolas ativas do país com pelo menos 50 presentes ao ano nos exames da ordem (que não tenham zerado na prova). Na maioria delas (679), menos de 30% dos alunos e ex-alunos que fizeram o exame tiveram nota suficiente para passar na prova.
Uma delas é o Centro Universitário de Bauru, a 330 km da capital paulista, conhecido como Instituto Toledo de Ensino (ITE). A escola está em 122º lugar no ranking nacional da OAB (com 28,82% de aprovados no exame).
O ITE virou assunto recentemente, em abril, quando a advogada Claudia Mansani Queda de Toledo assumiu a presidência da Capes, agência federal ligada ao MEC que avalia a pós-graduação no país. Toledo era reitora da instituição, que foi criada pela sua família. Foi lá, também, que estudou o ministro da Educação, Milton Ribeiro.
Um número ainda menor de escolas –5,4% das instituições avaliadas– consegue aprovar pelo menos metade dos seus alunos no exame da OAB. Em 1º lugar nacional está a FGV Direito Rio (Escola de Direito do Rio de Janeiro) com 79,33% de aprovados, seguida pela USP (73,64%) e pela UFMG (73,10%).
O curso de direito tem a maior demanda nacional –passou, em 2014, o número de ingressantes de administração de empresas.
“É uma formação muito procurada por causa de profissões jurídicas que remuneram muito bem. Tem basicamente biblioteca, lousa e giz –e há muitos cursos de má qualidade”, diz Nina Stocco Ranieri, da Faculdade de Direito da USP.
Ela tem se dedicado a pesquisar indicadores de avaliação de cursos jurídicos. “É um curso conservador, as leis são conservadoras. Os cursos têm de repensar o seu formato”, avalia Ranieri.
Quem tem repensado é justamente a líder nacional em aprovação na OAB, FGV Direito Rio. O curso de direito da instituição nasceu há menos de 20 anos em período integral, baseado em projetos e com grande apelo internacional —há disciplinas em inglês, e os alunos são estimulados a fazer intercâmbio. Na grade tem até linguagem de programação. “A prova da ordem é apenas um indicador, uma consequência do rigor acadêmico”, avalia Sérgio Guerra, diretor do curso.
Outro aspecto que ele considera fundamental para o bom desempenho no exame é a proximidade entre professores e alunos –”que têm nome e sobrenome”. Isso é um diferencial: turmas de direito chegam a ter centenas de estudantes, o que dificulta interações com docentes e mentorias mais personalizadas.
A reportagem avaliou as instituições de ensino superior que oferecem direito a partir do seu cadastro no MEC. No caso de escolas com mais de um curso ou com graduação em mais de um campus, foi feita uma média da aprovação na OAB de todos os alunos daquela instituição.
Apenas no caso da USP –que oferece o curso de direito no Largo de São Francisco (em São Paulo) e em Ribeirão Preto (330 km da capital paulista)–, foi feita uma análise específica das taxas de aprovação na OAB em cada campus.
O curso de São Paulo foi criado por decreto imperial em 1827 –anterior à própria instituição da USP, universidade à qual o Largo de São Francisco foi incorporado mais de um século depois. Já o curso de Ribeirão Preto tem menos de quinze anos, e já passou por uma reformulação do projeto pedagógico em 2017.
Se fosse uma escola independente, a USP de Ribeirão Preto seria líder nacional com 79,88% de aprovados no exame da ordem. Assim como a FGV Direito Rio, a graduação USP do interior de São Paulo é em período integral e tem abordagem multidisciplinar, com disciplinas que vão além da área jurídica.
Essa é a segunda vez que a reportagem avalia a porcentagem de aprovação na OAB dos cursos de direito oferecidos no país, considerando o percentual de aprovados finais no exame. A primeira análise foi publicada no RUF – Ranking Universitário de 2019.
No RUF, foi avaliada a aprovação nos exames da ordem de 2015, 2016 e 2017. Na época, a Unesp liderava em aprovação na OAB no país, seguida pelas federais de Pernambuco (UFPE) e de Viçosa (UFV).
Também foram analisados no ranking indicadores como titulação do corpo docente, nota dos formandos no Enade (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes) e percepção do mercado de trabalho.
Com todos esses aspectos, as melhores escolas de direito do país no RUF 2019 foram, respectivamente, USP, UFMG e FGV-SP (que, nos dados do MEC, é uma instituição diferente da FGV Rio).
Como considera os exames da OAB de 2017 a 2019, o retrato atual é anterior à Covid-19. Para Nina Ranieri, a pandemia pode ter piorado a qualidade dos cursos de direito do país, que não se prepararam para a oferta da formação de maneira remota. “Temo que os próximos resultados sejam ainda piores.”
Fonte: Uol Notícias