As seguidas fugas em massa ocorridas na Penitenciária Agrícola do Monte Cristo (Pamc), localizada na zona rural de Boa Vista, que culminaram na fuga de quase cem presos, motivaram o Ministério Público de Roraima (MPRR) a propor a abertura de uma nova ação civil pública contra o Governo do Estado.
Segundo o promotor de justiça Carlos Paixão, desde 2004 o MPRR tem ingressado com ações pedindo melhorias no sistema prisional de Roraima. “Mas isso ainda quando o problema era somente na Cadeia Pública. A coisa transbordou para a Pamc, que virou aquela desgraça. Aquele presídio só serve para acolher presos do regime semiaberto e olhe lá”, disse.
Conforme ele, não há outro jeito para tentar resolver o caos do sistema prisional se não entrar com uma ação contra o governo. “Estamos analisando mais uma ação para propor contra o Estado e, se for o caso, contra a governadora, para resolver essa questão. Ela tem o dever de administrar aquilo ali com competência e condições, e a única coisa que pode ser feita é desmanchar aquilo ali e construir um presídio para os presos do regime fechado”, afirmou.
Para o promotor, as obras que estão sendo feitas na Penitenciária para tentar evitar a fuga de presos não resolvem a situação. “Estão fazendo uma obra que não vai dar em nada. Estão construindo uma muralha no meio do presídio com uma passarela. Mas, ao invés de resolver, os presos estão construindo escadas para fugir com restos das obras”, declarou.
O promotor afirmou que nem a presença da Polícia Militar dentro do presídio foi capaz de conter as fugas. “Lá tem policiais, mas os presos não respeitam e agridem os PMs com pedradas. Os policias não podem revidar com munição letal porque se atirarem o mundo cai em cima e os vagabundos sabem disso”, comentou.
Paixão citou que poucos presídios no Brasil possuem tantas facilitações para fugas de presos como a Penitenciária do Monte Cristo. “Eu não conheço os presídios todos, mas eu conheci muitos presídios e posso dizer que esse aqui é ‘filé’. Na penitenciária quem manda são os presos. Se colocar um tatu na Pamc ele vai sair por baixo. É tão fácil fugir que quebram muro e fazem buraco”, ironizou.
Ele criticou a escolha do governo na nomeação de gestores da Sejuc. “O governo tem que colocar pessoas com capacidade e vontade de fazer. A Sejuc tem que ter equipe para investigar, aí de repente muda o cara e não faz nada e no final acaba entrando em acordo com vagabundo. Infelizmente é assim”, frisou.
O promotor aconselhou as vítimas de criminosos que fugiram do sistema prisional a processarem o governo. “Tem que entrar com ação contra o Estado para pedir indenização por danos morais e materiais. Tem que pedir, porque o Estado é inerte em relação a isso e parece que não dá muito voto e a sociedade fica à mercê”, pontuou.
FUGAS – De acordo com a Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc), dos 2.290 detentos da população carcerária do Estado, 105 são atualmente considerados foragidos do sistema prisional. Os números, porém, não incluem os detentos que escaparam da Penitenciária do Monte Cristo, justamente o presídio onde tem ocorrido o maior número de fugas.
Do total de foragidos incluídos na lista da Sejuc, 13 são da Cadeia Pública Feminina de Boa Vista; 74, da Casa do Albergado de Boa Vista; e 18, do Centro de Progressão Penal. No levantamento, na parte que lista a Pamc, consta que não há informações sobre o quantitativo de foragidos.
Ações para reforma nos presídios são de 2006
Desde 2006, a Promotoria de Justiça, com atuação junto à Vara de Execução Penal e Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público, já havia protocolado na Justiça uma ação para que, à época, o executivo estadual realizasse melhorias nos estabelecimentos prisionais, tais como: recuperação total das instalações físicas, elétricas e hidráulicas da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo, Cadeia Pública de Boa Vista e da Cadeia Pública de São Luiz do Anauá, no Sul do Estado.
Após quatro anos do ajuizamento da ação civil pública, o juiz da 8ª Vara Cível, em primeira instância, julgou parcialmente procedente o pleito do MPRR e condenou o Governo do Estado de Roraima a promover, no prazo de 180 dias, a contar da data da notificação da decisão judicial, diversas melhorias no sistema prisional.
À época, o governo de Roraima recorreu da decisão judicial e o caso foi parar no Supremo Tribunal Federal. O ministro do STF, Dias Toffoli, relator do processo, decidiu pelo improvimento do Recurso Extraordinário nº 687.758, interposto pelo Governo do Estado, e suspendeu o andamento do referido recurso, determinando a devolução do processo ao Tribunal de Justiça Roraima.
Em agosto de 2015, o Plenário do STF decidiu que o Poder Judiciário pode obrigar a União ou governos estaduais a realizarem obras em presídios para a garantia constitucional da integridade física dos presos, independentemente de dotação orçamentária.
Com o julgamento do caso concreto, que envolveu o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul (MP-RS) e o governo estadual, a respectiva decisão, que teve como interessados a União, o Distrito Federal e os estados do Acre, Amazonas, Minas Gerais, Espírito Santo, Piauí, Rondônia, Bahia, Roraima, Amapá, Santa Catarina, Mato Grosso do Sul, São Paulo e Pará, a decisão vale para os demais recursos que tramitam no STF sob o mesmo argumento.
Secretário diz que investimentos na segurança acabarão com fugas
À Folha, o titular da Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc), Josué Filho, afirmou que o Estado tem investido em segurança para evitar as fugas nos presídios. “Tomamos, agora, a medida de concluir uma nova guarita de uma obra nossa que está sendo feita no meio da Pamc e estamos iniciando, agora, as instalações das cercas elétricas e câmeras”, disse.
O secretário informou que outra medida foi a aquisição de um gerador para suprir a energia do presídio em casos de apagões. “Por duas vezes os presos aproveitaram a questão da falta de energia para fugir. Os geradores foram adquiridos agora e até a próxima semana serão instalados. Fizemos isso porque antes não havia essa perspectiva de falta de energia, e agora tem”, explicou.
A vigilância interna, com a presença de agentes, e a retirada dos materiais de construção dentro do presídio também estão sendo providenciadas, segundo Josué. “Fizemos toda a revisão da instalação elétrica e hidráulica que estão praticamente concluídas, a segurança por meio das cercas elétricas e câmeras. Todo o trabalho está sendo feito para que haja rotina de fiscalização interna que não havia”, destacou.
Ele informou que a obra que está sendo feita contempla a construção de mais guaritas, uma passarela e um muro dividindo a penitenciária. “Estamos destruindo algumas alas que não tinham condições de recuperação e serviam de esconderijo dos presos. São três ou quatro alas que serão destruídas para dar visibilidade melhor, inclusive na passarela e guaritas que estão sendo feitas”, ressaltou.
Conforme ele, a conclusão do presídio de Rorainópolis, no Sul do Estado, também deve reduzir a população da Pamc. “As obras lá estão 70% concluídas. Com tudo isso e reduzindo o número de presos vamos praticamente acabar com as fugas”, frisou. (L.G.C)