Cotidiano

Mudança em Lei de Acesso à Informação limita transparência

Assinado pelo presidente interino, Hamilton Mourão, novo decreto possibilita que servidores e entidades públicas possam ter dados ultrassecretos

A garantia ao acesso à informação dos órgãos públicos, regulamentada pela Lei nº 12.527/11, voltou à discussão esta semana com a assinatura do novo decreto que possibilita que servidores comissionados, dirigentes de fundações e empresas públicas imponham sigilo ultrassecreto a dados públicos. O Decreto nº 9.690/19, assinado quarta-feira, 23, pelo presidente em exercício, Hamilton Mourão (PRTB), causou surpresa em alguns setores.

Previamente, as informações ultrassigilosas só poderiam ser classificadas em documentos feitos pelo presidente da República, vice-presidente, ministros de Estado, comandantes da Marinha, Exército e Aeronáutica e chefes de missões diplomáticas, além de consulares permanentes no exterior.

Na Lei de Acesso à Informação (LAI), qualquer pessoa, física ou jurídica, pode solicitar informações públicas dos órgãos e entidades. No texto, é explícita a publicidade de informações de interesse público, independentemente de solicitações, utilização nos meios de comunicação, fomento à cultura da transparência e o desenvolvimento do controle social da administração pública.

As informações ultrassecretas, o grau máximo de sigilo, só podem se tornar públicas após 25 anos. O sigilo secreto tem prazo de 15 anos e o grau reservado é de 5 anos antes dos dados se tornarem públicos.

Jornalistas repudiam mudança de decreto e citam prejuízo para profissão

Para a imprensa, o novo decreto representa a falta de transparência e a limitação ao acesso de informações públicas, o que afeta diretamente no trabalho feito pelos jornalistas. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) emitiu uma nota oficial lamentando a assinatura do decreto e repudiando as mudanças.

“A LAI, uma importante conquista da sociedade brasileira aprovada em 2011, estabeleceu a transparência como regra para a administração pública. Ao alterar a lei para autorizar que servidores públicos, ainda que de alto escalão, possam classificar dados do governo federal como informações ultrassecretas e/ou secretas, o governo Bolsonaro joga por terra o princípio da transparência”, relatou o comunicado.

Conforme enfatizou Adriana Cruz, presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de Roraima (Sinjoper), a mudança é preocupante.

“Na prática, a partir de agora, fica prejudicado o desenvolvimento da atuação [dos jornalistas] que tem grande importância junto à população, já que o jornalismo sério e investigativo é, e sempre foi, o principal aliado dos cidadãos”, relatou.

Ela afirmou ter uma falta de discussão mais ampla sobre o assunto e que deveria ter sido debatido anteriormente com os órgãos de controle e representantes da sociedade.

“A Lei de Acesso é fundamental para a democracia”, pontuou.

Cientista político vê limite de acesso à informação como antidemocrático

Na visão do cientista político Roberto Ramos, um dos pontos da democracia é a transparência dos dados públicos e o acesso à informação a essas questões deve ser para todos.

“Quando limita esse acesso, tira a credibilidade da transparência e isso não é democrático. Eu tenho uma visão negativa disso. Os atores públicos têm que ter responsabilidades públicas”, frisou.

Ramos acredita que a democracia brasileira não está em risco, mas que um dos pressupostos de liberdade, tanto à informação, quanto de opiniões podem ser inibidos se não tiver a transparência necessária.

“É essencial em processos republicanos e democráticos. Em regimes ditatoriais, seja de esquerda ou de direita, civis ou militares, uma forma de autoritarismo é sempre o controle da informação”, encerrou. (A.P.L)

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