Prestes a completar 23 anos, o município de Pacaraima, na fronteira com a Venezuela, vive uma realidade bem diferente da imaginada por seus moradores. Hoje a cidade se divide entre os brasileiros que lá vivem, a maioria há mais de uma década, e os imigrantes que atravessam a fronteira em busca de uma vida melhor.
Se de um lado os comerciantes brasileiros buscavam em Pacaraima uma cidade mais calma e com a temperatura mais amena, os venezuelanos entram com a esperança de construir uma nova história no país vizinho. Mas é só olhar a rua Suapi, considerada a principal para o comércio daquele município, que é possível perceber como brasileiros e venezuelanos disputam não só o espaço, mas também os poucos clientes existentes no local.
Na rua percebe-se um grande número de lojas fechadas e as que continuam abertas reclamam da insegurança e da concorrência que eles consideram desleal com os ambulantes venezuelanos, que vendem de tudo, de chamada por telefone a TV. A competição para as vendas chega ser considerada acirrada quando, em frente a uma padaria, os ambulantes tentam vender pão caseiro pela metade do preço. Vale tudo na hora das vendas e, nesse quesito, os imigrantes não têm medo de usar a voz. “Prove, aprove e compre, moça” e “Me ajude a comprar comida” são algumas das frases “promocionais” ditas pelos ambulantes.
Para os moradores, o cenário retrata de forma clara uma Santa Elena que existiu até pouco tempo. Pela desorganização, falta de limpeza urbana, acúmulo de pessoas no mesmo lugar e principalmente a falta de segurança.
Para Francisca de Souza, comerciante em Pacaraima há 28 anos, mais de 50% das vendas mensais são feitas para venezuelanos. “Por essa e outras, fechar a fronteira não é uma solução para mim. Eles sempre estiveram aqui, assim como nós lá. A diferença agora é que eles moram aqui”, disse.
O que ela questiona é a insegurança que sofre com a entrada sem controle de bandidos e meliantes que se aproveitam da situação para se dar bem. Francisca contou à Folha que ela mesma já foi vítima de um assalto à mão armada durante o dia e um casal de amigos foi feito de refém na própria casa. Além de amarrados e amordaçados, o casal foi espancado e roubado por um grupo de imigrantes. “Não sou contra os imigrantes, mas sou contra a falta de controle, nós vemos aqui que não há uma preocupação com a seleção”, frisou.
A opinião de Francisca é a mesma de outros moradores e comerciantes. Para eles, o lado negativo da imigração se resume à questão de insegurança e ausência de seletividade na entrada ao país. “Por que antes precisávamos ter carteira de vacinação para entrar lá e agora eles entram aqui sem nada? Por que em outros países de primeiro mundo inclusive precisamos dizer o que vamos fazer e principalmente onde vamos ficar e aqui tá entrando de qualquer jeito”, questionou um comerciante que não quis ser identificado.
“É preciso saber o que eles querem fazer aqui. Se for procurar por emprego, tudo bem, mas se não for, que pelo menos não deixe ficar nas ruas. Vai ter um momento que eles vão precisar comer e, se for preciso, eles vão roubar. É instinto”, acrescentou o comerciante Geraldo Aquino.
Outra comerciante, que preferiu também não se identificar, reforçou a insegurança durante o período noturno sem o devido policiamento. Por morar atrás da loja onde trabalha, ela informou que a rua Suapi acaba sendo cenário de prostituição e venda de drogas por parte de imigrantes. “Sei disso porque muitas vezes ouço as vozes deles e o que estão negociando, tenho medo de arrombarem minha loja enquanto durmo”, disse.
Para o comerciante Manoel Soares, que trabalha no terminal rodoviário Rubens Cabral de Macêdo há mais de 20 anos, “a imigração veio pra destruir o Estado, que já não produz nada e ainda precisa dar conta de mais um mundo de gente”. Além das famílias que ocupam esquinas e terrenos baldios, ele contou que cerca de 300 pessoas dormem na rodoviária durante a noite.
A reportagem da Folha pôde constatar a situação caótica em que estão as ruas do município. Como só existe um abrigo destinado aos imigrantes indígenas da etnia Warao, os outros venezuelanos estão morando nas ruas ou em terrenos baldios sem estrutura de banheiros ou água potável, fazendo com que eles tenham que fazer as necessidades fisiológicas na rua e usar as torneiras espalhadas na cidade para beberem água e, em alguns casos, tomarem banho.
Polícia Civil diz que efetivo desenvolve um bom trabalho
Hoje o efetivo da Polícia Civil em Pacaraima é de 26 funcionários, sendo destes dois delegados, apenas um escrivão, 19 agentes de polícia, um papiloscopista, dois serviços gerais e um agente da Força Nacional. Ainda segundo a Polícia Civil, “o efetivo tem mostrado ótimos resultados, prova disso tem sido o maior número de ações policiais que resultaram na prisão de traficantes, membros de organizações criminosas e apreensões de armas”, diz a nota.
Através de nota, a Polícia Militar afirmou que realiza o policiamento ostensivo com radiopatrulhamento 24 horas por dia em toda a área urbana do município e, quando solicitado, nas vicinais e adjacências. Em áreas de conflito frequentes a corporação intensifica as ações com operações pontuais, com reforço do efetivo e de outras guarnições especiais, como Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) e Força Tática.
A Secretaria Estadual de Segurança Pública (Sesp), por meio do Gabinete de Gestão Integrada (GGI), informou estar articulando operações na faixa de fronteira. A primeira foi executada em Pacaraima e contou com a participação de todas as instituições de segurança, entre eles: PM, Polícia Civil, Polícia Rodoviária Federal (PRF), Polícia Federal e Corpo de Bombeiros.
REPASSES – O Governo esclareceu que realiza repasses não somente para Pacaraima, mas também para todos os municípios com a arrecadação de impostos como Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e Imposto Sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA), e que estes recursos são enviados constantemente. “Reforçamos que a assistência aos imigrantes é de responsabilidade do Governo Federal, por meio do Exército Brasileiro”, finalizou. (A.G.G)