Defensora e militante dos direitos dos povos indígenas, a professora wapichana Pierlangela Nascimento da Cunha, 45, tomou posse como diretora-geral do Campus Amajari do Instituto Federal de Roraima. A solenidade ocorreu na manhã desta quarta-feira, 13 de janeiro, na área de convivência da unidade, distante 158km da capital e está disponível no canal oficial do IFRR no YouTube.
A reitora Nilra Jane Filgueira, que está de luto pelo irmão Aldemir Filgueira, foi representada pelo pró-reitor de Desenvolvimento Institucional, Sivaldo Silva, que deu posse à diretora. Respeitando os protocolos de biossegurança referentes à Covid-19, o evento teve a participação do ex-diretor do CAM, George Sterfson Barros, de tuxauas, da prefeita de Amajari, Núbia Lima, da deputada federal Joênia Wapichana, dos diretores-gerais dos Campi do IFRR, Joseane Cortez (Boa Vista), Vanessa Rufino (Novo Paraíso) e Moacir Augusto de Souza (Avançado Bonfim), dos pró-reitores Romildo Nicolau (Propesq) e Rosely Bernardo (Proex), de servidores do IFRR e da comunidade.
Pier é a primeira mulher indígena eleita para dirigir uma unidade do IFRR. O CAM é a unidade com o maior percentual de alunos autodeclarados indígenas. Segundo a Coordenação de Registro Acadêmico (Cora/CAM), dos 230 matriculados nos cursos técnicos e superiores presenciais, 121 se declaram indígenas, ou seja, 52,60%.
Esse foi o segundo processo de escolha de dirigentes do Campus Amajari, implantado por meio da Portaria 1.366, de 6 de dezembro de 2010. Eleita com 63% dos votos, Pier, como é conhecida, é natural da Comunidade Indígena Barata, Município de Alto Alegre, e vai substituir Sterfson Barros. Desde os trabalhos de expansão do antigo Centro Federal de Educação (Cefet) no Amajari, em 2008, e implantação do CAM, Sterfson estava na condição de nomeado pela gestão, e em 2016 foi escolhido pela comunidade acadêmica como diretor-geral.
Pier iniciou em 2014 a carreira como professora de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico (EBTT) no Campus Amajari. Ela vai comandar a unidade com 72 servidores, os quais promovem a inclusão social de 230 estudantes matriculados nos cursos presenciais de formação técnica e superior. No momento, a unidade está sem turmas na modalidade de Educação a Distância (EAD).
Entre as prioridades iniciais ao assumir o cargo de diretora-geral, Pier disse que dará continuidade ao atendimento dos estudantes que estão em atividades não presenciais, planejando as ações de ensino, pesquisa e extensão para serem desenvolvidas em 2021, sejam de forma remota ou presencial.
Comentou que vai reorganizar a estrutura da unidade para o retorno às atividades presenciais atendendo a todos os protocolos de recomendações sanitárias no âmbito do IFRR. “Além disso, estaremos organizando as ações voltadas para o acolhimento dos servidores, utilizando protocolos que orientam para os cuidados do retorno gradativo à convivência coletiva e superação das dificuldades relacionais que possam surgir no momento de retomada do trabalho presencial”, disse.
Sobre o retorno ao trabalho e às aulas presenciais, a diretora disse que a equipe seguirá as definições do Comitê de Crise para o Enfrentamento ao Coronavírus do IFRR. “Com isso, estaremos trabalhando para atender essas orientações com vista a preservar a vida dos servidores e estudantes. Nossa prioridade é ofertar uma educação de qualidade, porém preservando vidas”, afirmou.
PERFIL
Pierlangela Cunha tem Licenciatura Intercultural (2008) pela Universidade Federal de Roraima e Mestrado em Sociedade e Cultura na Amazônia (2013) pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam). No IFRR, além de atuar como docente, assumiu a coordenação do Programa Mulheres Mil/Pronatec e, em 2016, assumiu a Direção de Ensino, de onde se afastou em 2020 para sair candidata ao cargo de dirigente. É membro do Comitê Gestor de Políticas de Educação Escolar Indígena e líder do Grupo de estudos e pesquisa sobre o Ensino Técnico e Tecnológico, povos indígenas, interculturalidade e gênero. Além disso, é membro de várias comissões dentro do IFRR.
Ela tem um filho, Nalbert da Cunha Vieira, 26 anos. Filha de Roberto Soares da Cunha e Zenilda Nascimento Silva, o pai era servidor público e a mãe cuidava do lar e de 11 filhos. Pier morou com os pais até os 15 anos, quando foi selecionada para cursar o 1.º ano do ensino médio na Escola Técnica Federal de Roraima (ETFRR), mas por dificuldades financeiras, teve que retornar à casa dos pais.
No entanto, voltou a Boa Vista para continuar os estudos. Durante o dia era responsável por um pequeno comércio e à noite estudava na Escola Camilo Dias. Com essa experiência, aos 17 anos, participou da seleção para a empresa Buffet Vale Verde, empresa de catering da Varig, onde foi contratada para gerenciar o atendimento aos aviões. Estudava à tarde e trabalhava à noite até 3horas da manhã. Também trabalhou na empresa Expansão como auxiliar administrativo.
Em 1995, concluiu o ensino médio e, em 1996, foi para a Comunidade Indígena Canauanim (município do Cantá) trabalhar como professora da Educação Básica. A partir daí envolveu-se ativamente do movimento de professores indígenas. Participou de reuniões comunitárias, assembleias regionais e estaduais. Através dessa participação e contribuição com o movimento dos professores indígenas foi escolhida para representar a Organização dos Professores Indígenas de Roraima (OPIRR) em eventos nacionais.
Assumiu em 2002, a direção da Escola Estadual Indígena Tuxaua Antônio Horácio, na comunidade Boca da Mata, na T.I São Marcos, permanecendo até 2009. Durante esse período foi eleita para assumir a Coordenação Geral da OPIRR, cumprindo dois mandatos, concluídos em 2009.
Nesse período também fez parte da Comissão Nacional de Educação Escolar Indígena (CNEEI) do Ministério da Educação, contribuindo com vários debates e proposições sobre a educação escolar indígena em nível nacional. Participou ativamente como membro da comissão organizadora nacional da Conferência Nacional dos Povos Indígenas, realizada pela Fundação Nacional do Índio (Funai), da Conferência Nacional de Educação Escolar Indígena, do Ministério da Educação-MEC e, da 1ª Conferência Nacional de Política Indigenista, do Ministério da Justiça.
Foi membro da Comissão Nacional de Política Indigenista (CNPI) do Ministério da Justiça, do Conselho de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Roraima (UFRR), do Conselho Estadual do Meio Ambiente de Roraima e do Conselho do Instituto Insikiran de Formação Superior Indígena, da UFRR.
Participou dos debates para a elaboração dos projetos dos cursos de Licenciatura Intercultural na Universidade Federal de Minas Gerais, Universidade Federal de Goiás e Universidade Federal do Ceará. Além de participar de eventos para tratar sobre o movimento indígena e a formação superior nos estados do Pará e Amapá.
Realizou várias palestras sobre movimento indígena, educação superior indígena, políticas públicas para os povos indígenas em eventos estaduais, regionais, nacionais e internacionais realizados por instituições estaduais e federais. Em 2019 e 2020 participou de eventos realizados pelo Conselho Nacional de Educação/CNE e como especialista convidada na Comissão que trata da Educação das Relações Étnico – Raciais Quilombolas e Indígenas/Câmara de Educação Básica/CNE.