Cotidiano

Pesquisadores de Roraima visitam vila afetada por barragem em Rondônia

Lago formado por barragem de usina em Porto Velho, onde moradores tentam explorar o turismo.

Uma equipe de pesquisadores de três universidades federais, Roraima, Rondônia e Ceará, esteve em trabalho de campo na cidade de Porto Velho (RO) para realizar pesquisas científicas em comunidades tradicionais em situação de vulnerabilidade.

A visita da missão de estudo ocorreu no dia 19 de novembro. Os pesquisadores pertencem as áreas acadêmicas da Geociências, como a Geologia, a Geografia física e humana, fato que possibilita uma diversidade de olhares para o objeto pesquisado, diferencial do projeto aprovado na Capes.       

As três universidades, em conjunto, submeteram o projeto ao edital do Programa Nacional de Cooperação Amazônica (Procad Amazônia/2018), promovido pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Ministério da Educação (MEC) que aprovou a iniciativa no contexto amazônico. A ideia do projeto, que inclui ensino e pesquisa, partiu do Programa de Pós-graduação em Geografia da UFRR (PPG-Geo/UFRR).

Essa é mais uma fase do trabalho de campo que estudou, inicialmente, a região do baixo rio Branco, em Roraima, com missões desenvolvidas em 16 comunidades, contemplando uma extensão de aproximadamente 350 km pelo principal rio do estado. 

Nova Teotônio – A vila de Nova Teotônio, localizada há 32,6 km da área urbana de Porto Velho (RO), é um importante símbolo da desterritorialização comunitária e da tentativa de reterritorialização por parte dos agentes envolvidos na construção dos megaprojetos de infraestrutura na Amazônia, notadamente, a hidrelétrica de Santo Antônio no rio Madeira.  

O morador vila Nova Teotônio, Idevan Silva Damasceno, viveu 15 anos na antiga vila, hoje alagada pela barragem. O ribeirinho gerencia, com a família, um restaurante às margens do lago. Ele lembra que antes havia a cachoeira de Teotônio, ponto turístico muito frequentado. “Vivíamos muito bem lá. Era uma vila muito aconchegante, um povo muito acolhedor. Era simples, mas a gente tinha abundância de peixe, a paisagem que era uma maravilha e tivemos essa perda. Se você hoje me perguntar se eu prefiro, em porcentagem, lá em baixo ou aqui? Eu diria: – aqui é zero e lá era 100%”, descreve Damasceno, em tom de tristeza e saudosismo. 


 O morador ribeirinho, Idevan Damasceno, 43 anos, luta para não abandonar o empreendimento (Foto: Equipe Procad / Éder Santos – UFRR)

 O morador ribeirinho, Idevan Damasceno, 43 anos, luta para não abandonar o empreendimento.

A geógrafa e professora do PPG-GEO/UFRR, Drª Luiza Câmara nessa linha de pensamento, explica que está previsto o mapeamento e o contato com essas comunidades que representam a localidade. Elas serão inseridas em documento técnico que demostrará o cenário local. “Temos a possibilidade de desenvolver pesquisas que vão colaborar com as comunidades, a fim de deixar uma contribuição para aqueles que se fazem presente em áreas esquecidas pelo estado”, assinalou. 

Para a integrante da missão de estudo, professora do PPG-GEO/UFRR e geógrafa, Drª Elisângela Lacerda, da UFRR, o Procad Amazônia é uma oportunidade única de promover o intercâmbio de práticas científicas e ao mesmo tempo proporcionar a visibilidade de alguns problemas enfrentados pelas populações amazônicas. De acordo com a professora, há décadas a região recebe atores e projetos que impactam o modo de vida e a dinâmica territorial, e analisa criticamente que a obsessão por um pretenso ideal de progresso, manifesto na implantação de rodovias e hidroelétricas, tem promovido o [des] envolvimento de muitas comunidades com o seu espaço de vivência, entretanto: “violentos processos de desterritorialização estão sendo observados, sem que as comunidades tenham possibilidade de serem ouvidas pelo poder público”, alertou. 

 A equipe foi composta por pesquisadores de três universidades (UFRR, UNIR e UFC).

Foto: Divulgação

A vila de Nova Teotônio, possivelmente, seja parte do resultado de um modelo de desenvolvimento que tem no pensamento estatal e de mercado a imposição do progresso a qualquer custo, no qual o capital está acima da espécie humana e não-humana. O que pode ser visto é um território artificial criado pelo empreendimento da usina. Os poucos moradores remanescentes resistem e se reinventam, mantendo as memórias de um mundo que outrora existiu e proporcionou renda e um modo de vida peculiar, somado às emoções e sentimentos despertados pelas intervenções dos pesquisadores presentes na vila, que desejam contar essas histórias para o mundo.