Cotidiano

Poder público não dispõe de projetos que incentivem a doação de cabelo

As únicas ações realizadas nesse sentido envolvem apenas empresas do ramo da beleza, como salões

Que o cabelo é considerado uma das marcas registradas da vaidade feminina, disso todo mundo já sabe. Essa parte do corpo, porém, é uma das primeiras a sofrer quando a mulher passa pelo doloroso tratamento de quimioterapia, procedimento indicado no combate ao câncer.

Não é incomum encontrar pelo país exemplos de iniciativas que promovam a doação espontânea de cabelos para a confecção de perucas, destinadas para pacientes oncológicos, sejam elas promovidas por entidades privadas ou pelo próprio poder público.

Em Roraima, as ações nesse sentido são praticamente raras. A Folha buscou junto à Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) e à Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) informações sobre iniciativas voltadas para pacientes com câncer.

À reportagem, a Sesau informou que não tem nenhum projeto voltado para doação de cabelo, entretanto, ressaltou que a Unidade de Alta Complexidade em Oncologia (Unacon) está aberta a receber sugestões que visem melhorar a qualidade de vida dos pacientes com câncer no Estado.

A Superintendência de Comunicação da Assembleia Legislativa de Roraima (SupCom-ALE) não retornou a solicitação da Folha até o fechamento da matéria, às 18 horas.

A generosidade não tem idade

“Sou uma adolescente de 15 anos e tenho um amigo de 17 anos que teve leucemia na infância. Ele relatou que durante o processo de quimioterapia perdeu algo que ele gostava bastante em seu corpo. Hoje, livre da doença, ele até agradece por estar vivo, mas ainda sim sente falta do cabelo que tinha antes”. É com essa frase que a estudante Deborah Shayane relata uma das experiências mais marcantes de sua vida. 

A adolescente conta que, desde o relato do amigo, uma vontade enorme de fazer o bem começou a tomar conta de seu coração. Ostentando lindos cabelos negros, a estudante decidiu escrever um e-mail para a Folha, com a intenção de saber informações sobre locais que aceitem doação de cabelos para confecção de perucas. “Se para esse meu amigo, o cabelo representava muito em sua vida, imagina para tantas mulheres e crianças que sofrem com um tratamento contra o câncer”, frisou.

A princípio, a ideia encontrou resistência da mãe, a administradora Marilda Viriato, 50 anos, que se posicionou contra a proposta da filha. No entanto, após muita conversa e ao perceber o gesto nobre da filha, acabou concordando com a iniciativa. “Inicialmente minha mãe não foi muito a favor da ideia, mas depois de muita conversa, ela foi entendendo meu lado e acabou aceitando a ideia”, ressaltou.

Apesar da boa intenção de tantas Deborahs, muitas acabam esbarrando na falta de instituições que fazem o recolhimento de cabelos para a confecção de perucas para pacientes com câncer. Por sorte, há sempre alguém para fazer a diferença no mundo, como é o caso da cabeleireira Leonice Strieder, 53 anos.

Dona de um salão de beleza no Centro da capital, a gaúcha de palavras firmes arrecada doações há pelo menos quatro anos. “Trabalho como cabeleireira há mais de 30 anos e percebi que os índices de câncer estão bem elevados nos últimos anos. Além disso, não existe nada pior no mundo que você atender uma pessoa e ver que o cabelo dela começa a cair. As lágrimas começam a descer, porque você acaba se sensibilizando com aquela situação”, disse.

Leonice conta ainda que, graças à doação espontânea de muitas clientes, acabou criando vínculo com algumas instituições de apoio ao portador de câncer, sendo a principal delas o Hospital do Câncer de Barretos, em São Paulo.

“Como muita gente corta e não quer mais o cabelo, eu comecei a arrecadar o que pode servir para repassar às instituições que trabalham com isso. Inicialmente busquei saber se havia entidades no Amazonas, mas não tinha, então foi aí que tomei conhecimento do trabalho desenvolvido no Hospital de Barretos. Lá, existe uma equipe específica para esse tipo de trabalho, que envolve os pacientes oncológicos na confecção dessas perucas. É um trabalho lindo, que atende a muita gente”, destacou.

A cabeleireira explicou ainda que o comprimento ideal para doação é de cabelos com no mínimo 10 centímetros. Há ainda todo um cuidado para que o material seja útil para a doação. “Há todo um preparo para que esse cabelo seja apto para doação. Eu deixo-o secar naturalmente, para ver as fibras, e deixo guardado em um saquinho, porque se ele estiver molhado, ele pode mofar e ai não serve para a doação”, complementou.

Quem tiver interesse em saber um pouco mais sobre o trabalho desenvolvido por Leonice, pode entrar em contato pelo telefone 3224-9168, ou fazer uma visita a seu salão de beleza, que fica localizado na avenida Sebastião Diniz, no Centro, quase em frente ao prédio da Defensoria Pública Estadual (DPE). (M.L)