Os moradores de Pacaraima, ao Norte do Estado, na fronteira com a Venezuela, discutiram o possível desmembramento da sede do município da Terra Indígena São Marcos, na manhã ontem. Os comerciantes da cidade não abriram as portas dos estabelecimentos para participar da audiência pública promovida pela Justiça Federal com o apoio do Ministério Público Federal, cujo objetivo era escutar a população para contribuir com uma possível solução para as ações judiciais que pedem a retirada de todos os moradores não índios da região.
Lideranças indígenas, comerciantes, vereadores, professores e toda a comunidade que reside no município estiveram presentes dando sua opinião sobre o tema. Alguns indígenas se manifestaram a favor da desocupação de todos não índios, em quanto que outros mostraram a vontade de chegar a um acordo.
O prefeito de Pacaraima, Altemir da Silva Campos (PSDB), explicou que vão oferecer uma área de 12.446 hectares ao povo indígena de São Marcos como permuta dos 740 mil hectares da sede do município, esperando que haja uma negociação. Em quanto isso, comerciantes entregaram documentos à Justiça Federal para juntá-los aos 51 processos que estão em andamento.
A juíza federal Clara Mota foi a mediadora da audiência que lotou o ginásio poliesportivo da cidade. Na mesa, também estavam o procurador do Ministério Público Federal, Gustavo Kenner, um procurador da Advocacia-Geral da União (AGU) e um representante da Fundação Nacional do Índio (Funai).
POPULAÇÃO – As primeiras pessoas ouvidas foram os comerciantes, que receberam carta de desocupação de suas propriedades, como a empresária Maria Mascaren, que reside em Pacaraima desde 1990 e recebeu a intimação no ano passado. Ela explicou que sempre tiveram uma relação pacífica com os indígenas e que espera uma resposta positiva da Justiça, já que não tem outra fonte de renda a não ser o comércio localizado no bairro Vila Nova.
O empresário Rogério Araújo disse que recebeu a intimação da Justiça esta semana e espera que se chegue a um acordo onde todos possam viver em paz.
O coordenador da Terra Indígena São Marcos afirmou que a associação que representa espera que a Justiça cumpra a lei e continuem os processos de desocupação. Da mesma forma, o representante do Conselho Indígena de Roraima (CIR), Mário Wapichana, afirmou que a Justiça deve continuar a retirada do que chamou de “invasores”.
Por outro lado, Anísio Pedrosa, da Aliança de Integração e Desenvolvimento das Comunidades Indígenas de Roraima (Alidicir), enfatizou que as 20 comunidades indígenas que a entidade representa são a favor da permanência dos não índios na região. “Estamos preparados para negociar, precisamos da população que faz vida na sede, que mobiliza a economia e nos presta serviços. Queremos viver em paz”, afirmou o líder Macuxi.
Darlene da Silva, indígena da comunidade Ingarumã, afirmou que não são todos os indígenas que estão contra a permanência dos não índios. “Nós precisamos de Pacaraima, sim. Se eles forem embora, vamos viver de quê? Podemos conviver todos juntos porque precisamos das instituições e dos comércios da sede”, salientou.
O representante da Sociedade de Defesa dos Índios Unidos do Norte de Roraima (Sodiur), Miracélio Lira, também se mostrou favorável à permanência dos não índios. “Eles chegaram aqui para trabalhar, não para invadir. Por isso temos hospital, supermercado, açougue, todas as polícias. Se desocuparem, vai ficar igual à Raposa Serra do Sol, onde não temos nada por falta de apoio do Governo Federal. Nós somos capazes, sim, mas como não temos apoio, precisamos das pessoas que trabalham na sede”, salientou.
AÇÃO – A sede do Município de Pacaraima, localizada ao Norte do Estado, na fronteira com a Venezuela, ocupa parte da Terra Indígena São Marcos. A ação (ACO 499), protocolada pela Funai e que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF), questiona a legalidade dessa ocupação. Além da ação originária, há diversas ações possessórias que tramitam perante a Seção Judiciária de Roraima contra a permanência dos moradores.
Cotidiano