Desde as primeiras horas da manhã de quinta-feira, 15, agentes da Polícia Federal (PF) começaram a deslocar-se para o Município do Cantá, a Centro-Leste do Estado, e a vários bairros da Capital. Eles cumpriram a 2ª fase da Operação Libertatem a fim de desarticular suposta organização criminosa do alto escalão daquela Prefeitura, suspeito de fraudar licitações e desviar mais de R$ 20 milhões em recursos públicos.
De acordo com a PF, a principal investigada e suspeita de comandar o esquema seria a prefeita do município, Roseny Araújo (DEM), conhecida como Rose do Zaca, que foi afastada do cargo e conduzida coercitivamente para a sede do órgão. Ela prestou esclarecimentos sobre o envolvimento no suposto esquema de desvios de recursos públicos, provenientes das áreas de saúde e educação no Cantá.
Secretários e servidores do município que supostamente atuavam na fraude de licitações também foram conduzidos para a sede da PF. Foram cumpridos 51 mandados de busca e apreensão, 50 de condução coercitiva e nove mandados de afastamento de servidores públicos dos cargos.
A investigação apontou fortes indícios de associação criminosa, corrupção ativa e passiva, dispensa irregular de licitação e crimes de responsabilidade de prefeito, crimes previstos nos artigos 288, 317 e 333 do Código Penal Brasileiro. Todos serão indiciados e, se condenados com as penas somadas, podem pegar até 40 anos de prisão.
MODUS OPERANDI – Conforme a PF, o “modus operandi” do gruo, supostamente comandado pela prefeita do Cantá, além de secretários das pastas de Finanças, Saúde e Educação, bem como servidores da Comissão Permanente de Licitação (CPL) do Cantá, funcionava como uma espécie de “escritório do crime”.
Eles utilizavam um escritório investigado para montar processos licitatórios falsos e justificar pagamentos efetuados a empresas fantasmas ou que prestavam serviços de assessoria contábil, fornecimento de peças e pneus de caminhões, entre outros.
De acordo com o delegado responsável pela operação, Alan Robson, os envolvidos desviavam os recursos públicos a partir da simulação de licitações. “Esses processos eram juntados como se lícitos fossem e os recursos, ao invés de destinados à população, eram destinados a essas pessoas. Simulavam aquisição de bens para as secretarias, de veículos, peças e equipamentos, mas tudo era uma simulação total em benefício da prefeita e outros secretários”, afirmou.
Os investigadores apuraram que 90% dos recursos desviados iam para as mãos da prefeita. As demais verbas eram distribuídas entre servidores, empresários e laranjas, que seriam donos das empresas de fachada.
No caso de empresas com diversos objetivos sociais, parte dos donos participante aumentava, pois colocava sua empresa no esquema criminoso.
OUTRO LADO – A Folha tentou entrar em contato com os advogados de defesa da prefeita Roseny Araújo para falar sobre as acusações, mas, até o fechamento desta matéria, às 15h30 de ontem, não obteve retorno.
LIBERTATEM – O nome Libertatem remete ao termo liberdade, em latim, em relação à cessação da submissão da população do Município de Cantá à organização investigada. O inquérito apontou que há constantes prejuízos à saúde e à educação naquele município decorrentes dos desvios de recursos públicos.
A primeira fase da Operação Libertatem foi deflagrada em novembro do ano passado, em atuação da Polícia Federal e fiscalização da Controladoria-Geral da União (CGU). Um mês depois, em dezembro, um dos secretários investigados, pela suspeita de desvios, foi preso por movimentação de contas públicas com aval da prefeita e afastado de cargo público. (L.G.C)
Grupo mantinha carros de luxo e ostentava dinheiro nas redes sociais
Durante a operação Libertatem II, os policias federais apreenderam, nas residências dos envolvidos, grande quantidade de dinheiro em espécie, documentos, escrituras de imóveis e veículos incompatíveis com as rendas lícitas dos investigados, os quais teriam sido adquiridos com a quantia desviada dos recursos federais.
Cerca de 20 veículos, entre caminhonetes que custam R$ 120 mil, jipes utilizados em trilhas, com valor estimado de R$ 80 mil, além de modelos de luxo, como uma BMW, avaliada em R$ 350 mil, foram levados para o pátio da Superintendência da PF. De acordo com a PF, os veículos estavam em nomes de laranjas, mas a maioria pertencia à prefeita Cantá.
“Nós apuramos nesse ano de investigação que enquanto a prefeitura sofre com a carência de recursos e os servidores públicos que trabalham em prol da população estão com seus salários atrasados, além de as crianças estarem assistindo aulas em pocilgas, a prefeita e secretários estavam se beneficiando desses recursos de forma ilícita”, disse o delegado Alan Robson.
Segundo o delegado, além de possuir bens incompatíveis, os acusados ostentavam com o dinheiro desviado nas redes sociais. “Na casa da prefeita encontramos uma caminhonete que estava em nome de outra pessoa, além de documentos de imóveis. Os outros se exibiam nas redes sociais com os bens adquiridos por meio de desvio, postando fotos com carros, caminhonetes e joias”, frisou.
O material apreendido nos domicílios dos investigados será analisado e confrontado com as provas do inquérito policial. “As licitações montadas podem estar ocorrendo em outros municípios, portanto, os desvios podem aumentar. Contamos com a ajuda da população para colaborar e denunciar as fraudes, pois isso é fundamental para desvendarmos esses crimes e cessar com essa corrupção”, frisou. (L.G.C)
Morte de ex-secretária pode ter sido queima de arquivo, diz PF
Os rumores de que a morte da ex-secretária de Saúde do Cantá, Hadácia Alves, pode ter sido queima de arquivo a mando dos envolvidos no esquema de desvio de recursos no município ganharam força após a deflagração da 2ª fase da Operação Libertatem. “Um dos quesitos de todos os interrogatórios é sobre esse crime. A Polícia Civil tirou suas conclusões, mas há a possibilidade de ter sido queima de arquivo, e isso está sendo investigado nessa operação”, informou o delegado responsável, Alan Robson.
Ele revelou que informações sobre a morte de Hadácia constam em alguns documentos apreendidos durante a operação. “Todos que foram conduzidos à PF foram sendo questionados sobre essa morte, sobre o que sabem disso. E os documentos apreendidos apontam sobre essa morte. É possível que novos dados sejam trazidos para elucidar esse crime, mas, a princípio, tratamos como possível queima de arquivo”, afirmou.
A ex-secretária de Saúde do Cantá, Hadácia Silva Alves, de 29 anos, havia desaparecido no dia 17 de fevereiro de 2016. Após duas semanas do sumiço, a polícia começou a trabalhar com várias linhas de investigação, entre elas a de que Hadácia teria desaparecido por ameaça por conta da investigação na operação da Polícia Federal “Libertatem”, na qual seu nome estava envolvido.
Dois meses após o desaparecimento, em abril, a ossada da ex-secretária foi encontrada no meio de um matagal próximo a uma fazenda localizada na BR-401, no Município do Cantá. O crime segue sendo investigado. (L.G.C)