Cotidiano

Prefeitura é condenada a implementar ações de combate ao trabalho infantil

O colegiado fixou em R$ 50 mil a indenização por dano moral coletivo

Em julgamento unânime, a Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região – Amazonas e Roraima (TRT-11) manteve a condenação solidária do Município de Boa Vista (RR) e da Empresa de Desenvolvimento Urbano e Habitacional (EMHUR) para implementar ações efetivas de combate ao trabalho infantil nas feiras livres municipais. Além disso, o colegiado fixou em R$ 50 mil a indenização por dano moral coletivo, elevando o valor estabelecido na sentença. 

O colegiado rejeitou o recurso do Município de Boa Vista –  que buscava a reforma total da decisão de 1º grau – e deu provimento parcial ao recurso do  MPT, que pleiteou o aumento da indenização por dano moral coletivo a qual havia sido arbitrada em R$ 30 mil. O voto da relatora foi acompanhado pelo desembargador David Alves de Mello Junior e pelo juiz convocado Adilson Maciel Dantas.

Por força da liminar deferida na sentença proferida pela juíza titular da 2ª Vara do Trabalho de Boa Vista, Samira Marcia Zamagna Akel, que foi mantida no julgamento da Turma Recursal do TRT-11, as obrigações deverão ser cumpridas de imediato, independentemente do trânsito em julgado e sob pena de aplicação de multa. A decisão ainda é passível de recurso ao Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Ação civil pública

A controvérsia foi analisada nos autos da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho (MPT) em junho de 2018, com base em inquérito civil que apurou a presença de crianças e adolescentes em situação de trabalho irregular nas feiras livres sob a responsabilidade do Município de Boa Vista.

A apuração ocorreu a partir de Relatórios de Fiscalização da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego em Roraima (SRTE/RR) entre os anos de 2013 e 2017, que identificou crianças e adolescentes trabalhando como flanelinhas, vendedores e tratadores de peixes, entre outras atividades.

De acordo com o MPT, a recomendação expedida ao Município de Boa Vista e à EMHUR, bem  como a atuação interinstitucional, envolvendo a Superintendência Regional de Trabalho e Emprego (SRTE/RR), o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti) e o Forum Roraimense de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (Forpeti), não foram suficientes para a implementação de políticas públicas eficientes de combate à situação irregular constatada nas feiras. O órgão ministerial comprovou, ainda, que propôs a assinatura de um termo de ajustamento de conduta visando sanar as irregularidades, mas a proposta foi rejeitada, não havendo outra saída senão a via judicial.

Ao acolher os argumentos recursais do autor da ação, a relatora foi enfática. “É imperioso ressaltar que a conduta ilícita das rés teve o condão de lesionar não apenas os direitos das crianças e adolescentes envolvidos, mas também negligenciou todas as normas de proteção ao trabalho do menor”, salientou a desembargadora Valdenyra Farias Thomé, acrescentando que tais normas visam garantir o pleno desenvolvimento, tanto físico quanto psíquico ao menor, bem como garantir a oportunidade de estudar e se qualificar adequadamente para o mercado de trabalho.

Obrigações

A primeira das obrigações a ser cumprida é a realização, no prazo de até 180 dias, do diagnóstico do trabalho infantil em Boa Vista, com a identificação de todas as crianças e adolescentes encontradas em situação irregular nas feiras livres municipais.

Além do diagnóstico, deverá ser comprovada a inclusão de todas as crianças e adolescentes – e respectivas famílias – que se encontram em situação irregular de trabalho nas feiras livres de Boa Vista (RR), em programas de assistência social, erradicação do trabalho infantil e profissionalização do adolescente. Em caso de descumprimento específico desta obrigação (diagnóstico e inclusão em programas sociais), a multa diária será de R$ 2 mil até o máximo de R$ 20 mil.

O Município de Boa Vista e a EMHUR deverão, ainda, exigir compromisso específico, por ocasião da concessão de alvarás, a fim de que  feirantes não utilizem mão-de-obra infanto-juvenil, bem como deverão fiscalizar semanalmente e punir os infratores. Por fim, serão responsáveis pela realização de reuniões semestrais de conscientização com os feirantes e promoção de atividades complementares à escola ou atividades lúdicas para as crianças e adolescentes. A multa será de R$ 5 mil por obrigação descumprida.

Prefeitura de Boa Vista – A Secretaria Municipal de Gestão Social reforça que desde o início da crise migratória em Boa Vista, onde houve um aumento considerável de casos envolvendo trabalho infantil, o município tem atuado de forma permanente, por meio de buscas ativas com o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI), para identificar e orientar as famílias que insistem em levar crianças para trabalhar ou mendigar na cidade, além disso, as equipes fazem os encaminhamentos necessários para a rede de proteção do município e de outras esferas.

Essa e outras ações fazem parte da campanha “Meu trabalho é brincar e ser feliz”, criado para combater este tipo de prática na cidade e sensibilizar a população a não fomentá-la. As equipes fazem abordagens em diferentes áreas da cidade e em pontos de maiores incidências de casos, com orientações a população sobre os males do trabalho infantil, prática que gera diversos problemas sociais a longo e curto prazo.

Além disso, durante todo o ano, os Centros de Referência e Assistência Social se mobilizam na ação solidária da campanha “Seu dinheiro me mantém na rua”, com doações da população de brinquedos, roupas, sapatos, fraldas descartáveis, bolsas, material escolar, alimentos não perecíveis e muito mais. Os produtos são destinados às famílias em situação de mendicância, mapeadas pelo Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) através de buscas ativas.