Cotidiano

Prejuízos para economia marcam 1° mês de fronteira fechada

Prejuízo com produtos exportados por Roraima que deixaram de cruzar fronteira chega a aproximadamente R$ 150 milhões neste período

Esta quinta-feira, 21, marca o primeiro mês que a fronteira da Venezuela com o Brasil foi fechada por decisão unilateral do presidente venezuelano Nicolás Maduro. A Folha faz um resumo destes primeiros 30 dias e mostra os conflitos iniciais e os prejuízos que isso tem causado para a economia do Estado, em especial para as exportações, importação de insumos agrícolas e para o comércio de Pacaraima.   

A fronteira foi fechada em 21 de fevereiro e logo começaram os conflitos com manifestantes favoráveis à entrada de donativos da ajuda humanitária. Houve tumulto e os militares venezuelanos reprimiram o movimento com tiros. A decisão gerou revolta de moradores da comunidade de San Francisco de Yuruani, em Gran Sabana, que tentaram impedir a passagem dos agentes. Uma pessoa acabou morrendo no dia 22. 

No sábado, 23, durante a tentativa de incursão da ajuda humanitária no país vizinho, houve novos conflitos. As ruas de Santa Elena de Uairén viraram campo de guerra com pelo menos cinco mortos e vários feridos que foram encaminhados para hospitais de Roraima. Três dos que receberam atendimento acabaram morrendo. 

EXPORTAÇÃO – O prejuízo com os produtos exportados por Roraima que deixaram de cruzar a fronteira chega a aproximadamente R$150 milhões neste primeiro mês, segundo dados fornecidos pelo auditor-fiscal da Receita Federal em Pacaraima, Allysson de Oliveira Rocha. Neste período, pelo menos 50 carretas por dia deixam de cruzar a fronteira com produtos de Roraima, em sua maioria com alimentos perecíveis. 

“O fluxo de saídas do Brasil era de aproximadamente 50 carretas carregadas por dia para a Venezuela, com média de 30 toneladas cada e a nota fiscal de cada carreta era de aproximadamente R$ 100 mil. Então, são R$ 5 milhões que deixam de ser movimentados por dia”, afirmou. 

Além da exportação, há também os prejuízos contabilizados com as importações, como produtos para o agronegócio, a exemplo do carbonato de cálcio e do calcário que vêm da Venezuela.  

“Tudo isso prejudica a economia do Estado, pois temos muita gente que depende do comércio com a Venezuela. É toda uma cadeia que está sendo prejudicada. Além dos caminhoneiros e transportadoras que dependem do frete”, disse, lembrando que atualmente 66 carretas carregadas com farinha de trigo, arroz, açúcar, óleo de soja, manteiga e macarrão continuam paradas no pátio da Receita Federal em Pacaraima.

Rocha afirmou que tem caminhoneiro pedindo para liberar a carga e voltar para seguir viagem para outro local. “Uma carga de manteiga já está estragada e outras cargas correm o risco de perecer”, relatou.

COMÉRCIO – Com a fronteira fechada, os prejuízos logo apareceram no comércio. O presidente da Associação Comercial e Empresarial de Pacaraima (Acep), João Kleber, informou que o setor teve impacto imediato com o fechamento da fronteira e logo na primeira semana houve redução de aproximadamente 90% nas vendas, o que fez algumas lojas demitirem funcionários e outras fecharem as portas. 

“O comércio não estava preparado para o fechamento da fronteira e no início pegou muita gente de surpresa. Houve demissões e pelo menos seis lojas fecharam as portas. Mas aos poucos o movimento está voltando com as pessoas passando pelos caminhos alternativos. Já podemos dizer que recuperamos 50% da economia”, destacou.   

No auge das vendas, com a fronteira aberta, o comércio vendia uma média de R$ 1,5 milhão por dia. Logo depois do fechamento, esse número caiu drasticamente para R$ 150 mil, o que representou uma queda de 90%. Hoje, com a passagem de venezuelanos por caminhos alternativos, a economia volta a dar sinais de recuperação com cerca de 50% do total arrecadado no início.

“Ainda estamos distantes de equivaler ao que era antes do fechamento, mas já sentimos uma melhora com a passagem de venezuelanos pelos caminhos alternativos e podemos afirmar que isso tem deixado os comerciantes mais confiantes. Não está mais havendo demissões e nem lojas fechando”, afirmou. 

Governo de Bolívar fala em ‘transbordo’ de alimentos

Com a proibição da passagem das carretas que estão carregadas de alimentos no posto da Receita Federal de Pacaraima, empresários venezuelanos e representantes do governo de Bolívar procuraram o posto da Receita em Pacaraima e até já cogitaram fazer transbordo das cargas a fim de que os alimentos cheguem ao seu destino. 

O auditor-fiscal da Receita em Pacaraima, Allysson de Oliveira Rocha, afirmou que representantes do governo de Bolívar têm procurado o posto em busca de entendimento para liberar as cargas. 

“O governador de Bolívar tem se mostrado preocupado com a situação de calamidade da região e seus representantes já vieram nos procurar para tentar resolver o problema de desabastecimento, inclusive passam áudios de conversas que tiveram com governadores e generais da Guarda Bolivariana. Eles também perguntam sobre a situação das cargas e explicamos que elas estão liberadas pelo Brasil. A questão é que as ordens vindas de Caracas não deixam as carretas passarem pela fronteira”, avaliou.

“Esta semana, eles chegaram a falar da possibilidade de fazer o transbordo das cargas para caminhões menores da Venezuela e tentar passar pelos caminhos alternativos, mas entendemos ser uma opção complicada, até pela posição de Maduro, que está bloqueando a passagem, e isso pode ter sérias consequências”, argumentou.

PROPINA – Allysson Rocha afirmou que apesar da fronteira continuar fechada, constantemente têm chegado veículos e pessoas venezuelanas em Pacaraima que pagam propina e são liberadas pela Guarda Venezuelana. 

“A Guarda Bolivariana institucionalizou mais um tipo de propina e isso tem sido extremamente lucrativo para eles. A cobrança é de R$ 150 por veículo para atravessar a fronteira e pessoas a pé com fardos de comida nas costas são abordadas e têm que pagar dinheiro ou deixar comida pra eles. É triste ver isso.”  

Essa informação também foi compartilhada pelo presidente da Associação Comercial e Empresarial de Pacaraima (Acep), João Kleber.

“Temos filmagens e fotos de pessoas sendo extorquidas pela Guarda Bolivariana para voltar à Venezuela, quer seja de carro ou a pé”, disse. “Pelo que soubemos, a Guarda está passando necessidades e isso seria uma forma de se alimentar”, completou. (R.R)