Cotidiano

Presos usam redes sociais para arquitetar crimes e dar ordens

Detentos atualizam perfis no Facebook e usam o WhatsApp para planejar assaltos, recrutar jovens e indicar novos pontos de venda de droga

Presos de dentro da Penitenciária Agrícola do Monte Cristo (Pamc), zona rural da Capital, e da Cadeia Pública de Boa Vista, no bairro São Vicente, zona Sul, estão planejando e ordenando crimes utilizando as redes sociais em meio aos “selfies” e frases de efeitos, inclusive religiosas, algumas em um português precário. Há mais de uma semana, a Folha vem monitorando a ação desses detentos pela internet. Além de arquitetarem assaltos e indicarem novos pontos de venda de droga na cidade, também aliciam jovens para a vida do crime.

Os presos que usam páginas no Facebook e o aplicativo de celular WhatsApp fazem parte do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios do País. Eles não têm o menor receio de postar fotos de dentro da cadeia, mostrando celas abertas, drogas e armas. Ainda fazem várias apologias ao crime, incentivando o consumo de maconha e publicando fotos até de dinheiro de assaltos.

Para dificultar as investigações da polícia, a maioria dos presos usa nome e perfil falsos. Apenas os membros da facção sabem dessas páginas. Em uma delas, por exemplo, o detento da Penitenciária Agrícola, Sérgio Murilo, preso por tráfico de droga, usa o nome “Oliveira Correa” para se comunicar com comparsas fora da cadeia e passar as ordens da facção.

“Naldo da Conceição”, outro que tem página no Facebook, na verdade é o detento Josinaldo da Conceição, trancado também na Penitenciária Agrícola, acusado de cometer vários assaltos na Capital. Ele é mais um que debocha da cara das autoridades públicas, postando fotos e publicando frases que só os detentos entendem, como: “Mais um dia, de boa, na casa de pedra [na cadeia]”; ou “A mente criminosa faz o crime, e não o crime faz a mente”. Outro publica em seu status: “A dificuldade faz nois cometer delito [sic]”.

A utilização das redes sociais para o crime é tão normal na Penitenciária Agrícola que o detento José Monteiro, vulgo “Bombeiro”, não teve medo sequer de revelar sua verdadeira identidade. Mesmo trancado, ele ordena assaltos para “levantar dinheiro” ao PCC. Ele está preso, acusado de roubo, artigo 157, o popular assalto. É considerado de alta periculosidade.

Os presos do PCC roraimense utilizam as redes sociais e ordenam assaltos para pagarem a “mensalidade” da facção criminosa, que tem sua “diretoria-geral” em São Paulo e no Rio de Janeiro. As ordens atualmente são para roubar motocicletas e assaltarem casas, segundo fontes da Polícia.

 
Bandido morre e comparsas ficam de luto no Facebook

Os presos, os internautas do crime, são tão organizados que todos estão de luto em suas páginas sociais pela morte de Valterlins Moraes da Silva, de 29 anos, conhecido como “Vasco”. Foragido da Penitenciária Agrícola, o elemento morreu após uma troca de tiros com policiais militares no bairro Jardim Olímpico, zona Oeste, na tarde de segunda-feira, dia 18.

O preso vinha sendo investigado, acusado de cometer vários assaltos na cidade, desde que fugiu da penitenciária, em 29 de setembro do ano passado. “Vasco”, segundo a polícia, pertencia a uma facção criminosa que atua na Penitenciária. Ele teria sido autorizado pela facção a fugir do presídio para cometer assaltos e “levantar dinheiro” para a sua facção. (AJ)

 
Detentos usam código para despistar a polícia

Ainda no Facebook, “Alfredo Articlínio”, que na verdade é o presidiário Jeferson Articlínio, deixa bem claro que as ordens de dentro da cadeia são dadas pelo PCC. Em sua página, ele faz apologia ao crime e utiliza o código 1533. A Folha descobriu que o 15 representa a 15ª letra do nosso alfabeto, o “P”, e o 3 refere-se à 3ª letra, o “C”. Juntando, surge PCC, a sigla da facção criminosa.

Articlínio foi preso acusado de matar e roubar um ourives. O latrocínio ocorreu em 2014, em uma joalheria no Centro da Capital. Mesmo assim, ele não se intimidou em postar fotos de sua bem arrumada cela, com ventilador, televisor e até um aparelho de som. O detento “Lekinha Almeida”, também trancado na Penitenciária Agrícola, é outro que zomba das autoridades. Junto com o traficante Reis Márcio, vulgo “Dogão”, eles aliciam jovens pela internet para entrarem na vida do crime. A dupla é encarregada de mandar o maior número possível de solicitação de amizade no Facebook para o público juvenil. Eles prometem vida boa, fácil e cheia de “aventuras criminosas”. (AJ)
 
Detector de metal e raio-x não impedem entrada de celulares

Nas revistas feitas pela polícia na Penitenciária Agrícola já não é mais nenhuma novidade a apreensão de aparelhos celulares, alguns até de última geração. Apesar de a unidade já contar com detector de metal e equipamento de raio-x, os telefones celulares continuam entrando.

“A falha então é humana e ocorre principalmente nos dias de visita. Servidores públicos da Penitenciária podem estar facilitando a entrada desses aparelhos. O PCC tem dinheiro para pagar agentes e até policiais. Se a polícia investigar, vai descobrir como esses celulares entram”, observou um servidor público da Penitenciária Agrícola, que, por motivo de segurança, pediu para não ser identificado.

Para piorar a situação, mas facilitar a investida de bandidos, a internet na Pamc é de dar inveja a qualquer internauta, principalmente a quem mora em bairros mais afastados do Centro. Quem trabalha na unidade prisional garante que a velocidade da rede é “alta e surpreendente”. Por isso, os próprios servidores cobram a instalação de bloqueadores de sinal de internet via rádio. (AJ)

 
Governo diz que foram apreendidos 300 celulares nas prisões em 2015

O Governo do Estado informou que no ano de 2015 foram apreendidos aproximadamente 300 aparelhos celulares nas unidades prisionais do Estado. Para evitar a entrada dos aparelhos e outros materiais ilícitos, ainda no ano passado, a Secretaria Estadual da Justiça e Cidadania (Sejuc) instalou equipamentos de controle de acesso de pessoas e materiais adquiridos junto ao Departamento do Sistema Prisional (Depen) do Ministério da Justiça.

As unidades contam atualmente com uma esteira de raios-x, detectores de metais pórticos, detectores de metais portáteis e detectores de metais para inspeção íntima tipo banqueta. A instalação de bloqueadores de sinal telefônico também faz parte das metas do Governo do Estado para garantir o cumprimento de pena no sistema e evitar a prática de ilícitos.

O secretário adjunto de Justiça e Cidadania, coronel Francisco Borges, informou que a aquisição destes equipamentos está em fase de levantamento de recursos junto ao Depen.

Em relação às penas impostas ao detento flagrado com celulares, ele responde junto ao Conselho de Disciplina do Sistema Prisional para aplicação de sanções administrativas disciplinares previstas em Lei. O caso também é informado à Vara de Execuções Penais para que sejam adotadas as providências cabíveis.