Cotidiano

Pressão causa transtornos, diz psicóloga

Profissional avalia que policiais submetidos a pressões no trabalho ou até mesmo em casa podem sofrer descontroles emocionais

A psicóloga Letice Lima, especialista em casos familiares, afirmou que policiais que cometem crimes sofrem de claro transtorno psicológico. “Efetivamente é uma pessoa que não tem controle sobre a ira. Muito provavelmente, esteja adoecido”, disse. Para ela, a pressão pela qual os policiais são submetidos durante o trabalho, ou até mesmo em casa, pode levar a descontroles emocionais. “Não dá para dizer que os policiais sofrem danos com o esforço no trabalho, a não ser que estejam submetidos à pressão”, analisou.

A especialista comentou que a pessoa só comete um ato dessa natureza quando chega ao limite. “A partir daí, não há mais controle sobre a agressividade, o emocional ou o psicológico, a pessoa está adoecida. Isso é causado por um acúmulo de situações que fogem do controle, resultado de uma trajetória”, frisou.

Os sinais que indicam uma possível perturbação mental numa pessoa, segundo a psicóloga, podem ser percebidos em várias situações. “Dirigir com agressividade no trânsito, infringir regras e leis ou a contenção disso, como acontece com pessoas fechadas, caladas, que não têm reação”, apontou.

No caso do policial militar que cometeu triplo homicídio ontem (veja matéria na página 10A), a especialista destacou que não é possível considerar que os assassinatos foram cometidos a sangue frio, nem que o soldado seja psicopata. “Quando se fala em sangue frio, sugere que a pessoa que matou não sentiu dor e nem se sensibilizou, mas não significa que ela não tenha sido tomada pela ira, o que já excluiu a possibilidade de psicopatia”, frisou.

ESTRESSE – Um policial militar, que disse trabalhar no Comando-Geral, procurou a Folha para denunciar que muitos PMs são submetidos a jornadas extras de trabalho, causando estresse excessivo nos profissionais. “Um dos fatores que contribuem para atitudes impensadas como essa é o estresse, causado pela jornada exaustiva no trabalho. Depois que alguém surta, não há mais nada a se fazer”, reclamou o PM, que preferiu não se identificar.

EXAMES PSICOLÓGICOS
Comandante da PM diz que policiais deverão passar por novas avaliações

O caso do soldado da Polícia Militar (PM), Felipe Quadros, que matou a tiros três pessoas e deixou outra gravemente ferida, foi o quarto crime envolvendo policias militares na Capital em menos de uma semana. Desde o mês de setembro, foram seis ocorrências com a participação de PMs, que culminaram na morte de cinco pessoas.

Os recorrentes casos de crimes envolvendo policiais militares em Roraima, de diferentes patentes, escancararam a fragilidade no controle psicológico e na falta de preparo dos profissionais. Em entrevista à Folha, o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Dagoberto Gonçalves, anunciou que tomará medidas para identificar todo tipo de problema que possa afetar a corporação.

Ele afirmou que os recentes casos envolvendo policiais não têm nenhuma relação. “Tivemos casos de PMs que estavam se aposentando e outros com menos  de um ano em atividade. Infelizmente, se trata de um cidadão que porta como instrumento de trabalho uma arma, então há certa facilidade para usar”, disse.

O comandante destacou que uma das primeiras medidas a serem tomadas será a otimização dos serviços no Núcleo Integrado de Atenção Biopsicossocial da Polícia Militar (Niab) e no Centro de Valorização à Vida (CVV), órgãos ligados à Academia de Polícia Integrada, que contam com assistentes sociais, psicólogos e psiquiatras.

“Vamos estudar a melhor forma de trabalhar e identificar esses problemas. Eu preciso desses núcleos, pois é a partir deles que vou poder tomar decisões de como reduzir ou eliminar a questão do porte de arma”, afirmou.

Gonçalves anunciou que também pretende acelerar o levantamento de policiais com problemas psicológicos nas corporações. “Todos irão passar por novas avaliações para identificar quem são os policiais com problemas. Paralelo a isso, vamos fortalecer a corregedoria e implantar a ouvidoria da PM. Os que tiverem problemas, nós vamos afastar das ruas, prender ou expulsar”, declarou.

CASOS – Nos últimos meses, outros caso envolvendo policiais ocorreram no Estado. Em 8 de setembro, o tenente da Polícia Militar  foi morto pelos colegas de farda após ter dado oito tiros na ex-mulher, Denise de Lima, de 27 anos. O caso ocorreu na residência onde o casal já havia morado junto, no bairro Senador Hélio Campos, zona Oeste.

Em outro caso, no dia 5 de outubro, o sargento da PM Eder Andrade cometeu suicídio após discutir com a esposa. Na segunda-feira, 02 de novembro, o jovem Ruidglan Souza morreu na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Hospital Geral de Roraima (HGR) após sofrer abordagem de policiais militares, que alegaram terem usado técnicas policiais de imobilização. O laudo do Instituto Médico Legal (IML), no entanto, atestou a causa da morte como politraumatismo.

Quatro dias depois, em 06 de novembro, o sargento da PM, da Companhia Independente de Policiamento Ambiental (Cipa), disparou vários tiros contra o portão da residência da esposa. Uma das balas atingiu de raspão a mulher.

Na manhã de ontem, foram registrados dois casos envolvendo policiais militares na Capital. O primeiro deles foi o do soldado Felipe Gabriel Martins Quadros, que matou a tiros três pessoas e deixou outra gravemente ferida. Logo após, o soldado Jeferson Barreto foi detido portando uma pistola ponto 40 de uso exclusivo para serviço da instituição, com munições. Os dois eram amigos.

Ainda durante revista no veículo de propriedade do soldado, foi encontrado um revólver calibre 38, sem procedência, e três trouxinhas de entorpecentes, aparentando ser pasta à base de cocaína. (L.G.C)