O primeiro caso de raiva humana registrado em Roraima foi confirmado por médicos do Hospital Geral de Roraima (HGR) na tarde de ontem. O paciente é um adolescente de 14 anos que está internado em estado grave na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) da unidade de saúde desde o dia 11 deste mês.
O paciente está em coma induzido e recebendo tratamento à base de antivirais e sedação profunda. Ele contraiu a doença após ser mordido por um filhote de uma gata que havia sido adotada pela família. O caso ocorreu no dia 8 de abril, no bairro Asa Branca, zona Oeste da Capital.
Após de ter sido ferido pelo felino, o menino foi levado pela família à Policlínica Cosme e Silva, no bairro Pintolândia, também na zona Oeste, onde ele foi medicado e liberado. O animal, que havia apresentado sintomas anormais de secreção, morreu uma semana depois. Alguns dias depois de ter recebido atendimento, a criança voltou a sentir mal-estar e retornou à unidade.
No local, o menino apresentou sintomas de náuseas, febre e vômito, com o membro que havia sido mordido pelo gato apresentando inflamações. A médica que atendeu o adolescente rapidamente suspeitou que ele pudesse ter contraído a raiva e o transferiu para o HGR, onde foi internado na UTI.
À Folha, um dos médicos que atendeu o adolescente, o infectologista Mauro Assato, confirmou que ele foi infectado com a raiva humana. “Está confirmado já. A criança realmente contraiu a doença e está recebendo tratamento. Tem que esperar para ver. O tratamento é prolongado e o importante é o suporte. Ele está em coma induzido, mas o prognóstico é ruim e a evolução também”, disse.
O tratamento realizado no adolescente, que não utiliza vacinas, é denominado de Protocolo de Recife, preconizado pelo Ministério da Saúde (MS) em casos semelhantes. No mundo, apenas dois pacientes que utilizaram o tratamento obtiveram a eliminação viral e a recuperação clínica, sobrevivendo à doença, considerada letal: um nos Estados Unidos, em 2004; e outro no Brasil, em 2008.
MUNICÍPIO – O superintendente municipal de Vigilância em Saúde, Emerson Capistrano, informou, em entrevista coletiva realizada na tarde de ontem, que um dos exames feitos no adolescente deu positivo para a doença. “O que chama atenção é o que o resultado tem anticorpos presentes, isso só aconteceria se ele tivesse tomado a vacina em algum momento ou tivesse tido contato com o vírus da raiva. Pelo que conhecemos da história, ele não tomou vacina e tudo leva a crer que realmente possa ter sido infectado pelo vírus da raiva”, disse.
Conforme ele, o tratamento preventivo que está sendo feito pelo adolescente é a melhor alternativa no momento. “É um tratamento que se baseia no Protocolo de Recife, que usa uma medicação disponibilizada pelo Ministério da Saúde e visa dar um aporte melhor ao paciente para que ele possa se recuperar”, explicou.
O superintendente afirmou que a baixa cobertura vacinal registrada nas campanhas de vacinação antirrábica é um dos fatores que contribuem para o risco da doença. “Fizemos uma série de campanhas itinerantes de combate à raiva, com etapas de vacinação em todas as unidades de saúde, mas, infelizmente, só conseguimos vacinar em torno de 15 mil dos 28 mil animais esperados. Um fato curioso é que, quando nós fomos fazer a vistoria e inspeção no bairro onde foi detectado esse caso, encontramos e vacinamos em torno de quase 300 animais domiciliados que não foram vacinados nas campanhas”, destacou.
SEM PÂNICO – Apesar da gravidade da doença, Capistrano pediu para que a população evite clima de pânico e que vacine os animais. “Não há motivo para pânico. A grande proteção é a vacinação e as doses estão disponíveis. “Estamos em processo de mobilização neste fim de semana agora para abrir as unidades de saúde, principalmente em locais de menor cobertura e maior agregado populacional para aumentar a cobertura, propondo parcerias para ampliar a participação para uma boa cobertura vacinal”, informou.
ARRASTÃO – Após registrar o caso de raiva humana, profissionais da Secretaria Municipal de Saúde e da Unidade de Vigilância e Controle de Zoonoses isolaram áreas dos bairros Asa Branca, onde ocorreu a transmissão, e Cambará, que é vizinho. “Tomamos alguns critérios. No caso, a gata tinha seis meses e não tinha entrado no cio. O dono garantiu que o animal era domiciliado e não caminhava fora da residência.
Sabendo disso, nós fizemos uma amplitude do raio de 30 quadras, sendo 20 no Asa branca e 10, no Cambará”, explicou o diretor da unidade, Rogério Gomes.
Segundo ele, o animal infectado que morreu foi exumado. “O animal já estava enterrado havia mais de 20 dias. Nós escavamos, retiramos o animal morto e conseguimos retirar o encéfalo, onde ainda tinha muito líquido e acreditamos que poderemos lograr êxito nos exames que faremos. Essa gata tinha um irmão que brincava com ela no local, que também recolhemos para ficar em observação e evitar um possível acidente”, disse.
Médica veterinária alerta para gravidade da doença
A médica veterinária da Unidade de Vigilância e Controle de Zoonose, Cira Barreto, explicou como funciona a transmissão da raiva. “É uma zoonose transmitida do animal para o homem. Existem outras formas de transmissão, mas são raras. O que temos que ter cuidado é quanto ao contato do animal com o homem. É transmitida por meio da lambedura e mordedura do animal”, explicou.
Conforme ela, é possível identificar que o animal possa estar infectado com a doença por alterações no comportamento. “O animal geralmente é agressivo, quando observa que o animal apresenta diferenças do estado normal dele. Nesse caso, o animal não foi vacinado e era doméstico, dócil, não era um animal raivoso. Ele mordeu o menino porque o menino abriu a boca dele para tentar fazer com que ele comesse alguma coisa”, disse.
A médica alertou para a gravidade da doença e ressaltou a importância da vacinação. “O vírus da raiva é grave, é uma doença letal e tem que prevenir por meio de vacinação. A vacinação na unidade sempre existiu. Durante todo ano estamos lá de segunda a sexta-feira, das 08h às 12h e das 14h às 18h”, frisou.
SEM FOCINHEIRA
Garoto de 10 anos é mordido por cão em praça do bairro Caçari
Além do risco de serem mordidos por animais de rua, muitos enfrentam o perigo de serem atacados por cachorros de donos que desrespeitam a regulamentação e passeiam com os animais sem os equipamentos de proteção. Foi o que aconteceu com o filho de 10 anos do advogado Luis Felipe Jaureguy, que foi mordido por um cão da raça rottweiler que não usava focinheira, na praça do bairro Caçari, zona Leste.
“Estávamos em uma praça e meu filho foi mordido por um cachorro que estava com duas senhoras. Eu ouvi o grito do meu filho e ele disse que o cachorro havia pegado ele. Eu perguntei da mulher se o cachorro era vacinado e ela disse que era e virou as costas. Não deu a mínima, como se nada tivesse acontecido”, relatou.
O advogado levou o filho até o hospital, onde a criança levou quatro pontos em uma das pernas e tomou a vacina antirrábica. “Quero que o poder público tome providências. Existe uma lei que trata sobre o controle e permanência de cães em locais públicos, que só podem permanecer nesses lugares com focinheiras e coleiras”, disse.
Luis Felipe reclamou da falta de conscientização da população e vigilância sobre situações como essa. “A lei fala que quem descumprir, tem o cão apreendido e só o retira mediante pagamento de multa de um a dois salários, mas não tem fiscalização. Tem gente que não respeita, e se a gente reclama, xingam a gente. No meu caso, estou procurando a proprietária do cão e ela vai pagar todos os danos”, frisou.