Dentro da sala de aula na Escola Estadual Gonçalves Dias, a professora de física Dulce de Oliveira nunca imaginaria estar entre os principais pesquisadores da física moderna e poder proporcionar aos alunos um olhar diferente sobre a disciplina em que muitos ainda têm dificuldade. Tudo mudou quando foi selecionada para ser a única representante roraimense na primeira Escola de Síncrotron para Professores do Ensino Médio (ESPEM), em Campinas, no Estado de São Paulo.
Recém-formada no Mestrado Nacional em Ensino de Física pela Sociedade Brasileira de Física (SBF), a professora teve a oportunidade de passar uma semana imersa no Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Minerais (CNPEM) com outros 19 docentes de escolas públicas de 16 Estados. O objetivo principal era mostrar os conceitos e aplicações da área em laboratórios e, dessa forma, levar a física moderna para as escolas.
De 14 a 18 de janeiro, os professores se tornaram alunos novamente. Participaram de minicursos e visitaram o laboratório Sirius, uma das principais fontes de luz síncroton do mundo e único da América Latina. As despesas foram custeadas pela SBF, que procurou encontrar profissionais que atuam no interior dos Estados que são frequentemente excluídos.
“Foi uma oportunidade ímpar porque todos divulgam a física como a pior disciplina e eu me senti na condição de aprender, de divulgar que a educação é a única solução e que o estudo vale a pena. A nossa bandeira é a da educação”, relatou a professora. Nas escolas, a teoria da área pode ser complexa e espantar os alunos, que muitas vezes nem sabem como ou por que vão utilizá-la no cotidiano.
Para Dulce, entender a aplicação das teorias e mostrar que, com a física, as mais diversas áreas da ciência, como medicina, agricultura e biotecnologia, podem ser expandidas e melhorar a qualidade da sociedade. O laboratório de síncrotron em Campinas é um dos únicos no mundo, sendo o outro na Austrália. “Imagina para o Estado de Roraima ter participação nisso. Eu ter o privilégio de conhecer a ciência de ponta”, comemorou.
Professores precisam mudar abordagem para atrair interesse, defende educadora
No Ensino Médio, não é estudada a física moderna, o que aumenta o desinteresse dos estudantes por acharem que a teoria é complicada. “Tem alguns livros que falam sobre, mas os alunos perguntam ‘o que isso tem a ver?’. Então, o que eu mais achei brilhante foi a interdisciplinaridade na prática. Todos são bacharéis e doutores em física, mas eles não praticam a física e, sim, aplicam nas ciências”, relembrou.
Dulce enfatizou que nas salas de aulas das escolas ainda acontece uma forma dura de ensinar a física e que, a partir de agora, após ter passado pela ESPEM, quer desmitificar os temores dos próprios estudantes e também dos professores de outras disciplinas, relatando sobre como as áreas podem atuar juntas.
“Eu quero mostrar para o meu aluno que o que ele está fazendo na sala de aula, pode até não ver, mas tem a aplicação que ele não conhece ainda. Nesse sentido, quero que os professores se sintam motivados a estudar e difundir a ciência”, frisou. A possibilidade de fomentar a vontade de formar novos cientistas faz parte da nova metodologia da professora de física, pois ela percebeu que a ciência não pode ser limitada para um pequeno grupo de pessoas, assim como a falta de divulgação sobre os projetos feitos na área.
“Temos muita evasão escolar, a maior parte é reprovação em física. Então, tinha que mudar isso dentro de mim. Não quero obrigar ninguém a ser físico, mas não podemos deixar isso morrer. Não existe capacitação se o professor permanecer fazendo prova em sala de aula. Existe um muro além disso”, prosseguiu.
A professora pretende fazer seminários, rodas de conversas e palestras para difundir a disciplina e ainda tem planos de poder levar alunos para um dia conhecerem os laboratórios da SBF. “Eu tive orgulho de ser brasileira porque seremos pioneiros, estamos ensinando e fabricando. Tem ciência no Brasil!, encerrou.
Entenda o que é síncrotron
O síncrotron é uma das mais poderosas fontes de raio-x. A luz é emitida quando elétrons acelerados a velocidades muito altas têm sua direção desviada pela ação de ímãs. O Sirius, único da América Latina, fica no Laboratório Nacional de Luz Síncrontron (LNLS). São várias estações de pesquisa montadas ao longo do círculo por onde os elétrons giram.
Cada estação funciona como uma superlanterna, que permite aos cientistas “enxergar” o interior da matéria e obter informações sobre a distribuição dos átomos e moléculas e suas ligações químicas. (A.P.L)