Cotidiano

Professores entram em greve de novo

Justificando que governo não cumpriu acordo firmado na greve de março, categoria se mobilizou novamente e cruzou os braços

Professores da rede estadual de ensino iniciaram, na manhã de ontem, uma greve pela segunda vez este ano. A concentração ocorreu na Praça do Centro Cívico, em frente à Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR), que ficou lotada. O movimento recebeu apoio dos alunos da rede pública de ensino e também de indígenas que participaram da IV Marcha dos Povos Indígenas de Roraima (veja na página 07A).

Segundo o presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Educação do Estado de Roraima (Sinter), Ornildo Roberto, a retomada da greve foi motivada pelo não cumprimento de acordos firmados com governo na greve anterior, assunto que ficou debatido durante várias reuniões com a categoria.

“Nós fizemos um movimento grevista no mês de março, quando passamos onze dias paralisados. Suspendemos a greve, negociamos com o governo sobre as necessidades dos professores, mas, para a nossa surpresa, infelizmente o Estado não cumpriu com aquilo que havia se comprometido. Nós demos ainda prazo de 90 dias para discutirmos a questão em comissão mista, mas não houve essa preocupação. A categoria se viu enganada e, não vendo outra solução, decidiu em assembleia geral que paralisaríamos as atividades por tempo indeterminado”, disse.

Conforme o Sinter, nesse primeiro dia de greve, 80% das unidades escolares aderiram à paralisação. A expectativa é de que até o final dessa semana a adesão ao movimento grevista chegue a 100%. “O movimento inicia forte, tendo inclusive a adesão das comunidades indígenas, que dispõe de aproximadamente 1.500 profissionais, justamente porque a situação dessas localidades, em relação à educação, está totalmente precária. Se aqui nas unidades da Capital e nas sedes do interior nós já temos essa dificuldade, imaginem como estão as mais de 200 escolas indígenas do Estado”, destacou Roberto.

Desde o início desse ano, os profissionais de educação buscam, junto ao governo, uma solução para uma série de situações vivenciadas pela categoria. Dentre as reivindicações dos professores estão a Gratificação de Incentivo à Docência (GID), o Plano de Cargos, Carreira e Remuneração (PCCR) dos técnicos de níveis fundamental e médio, entre outras. Entretanto, a principal questão diz respeito à sinalização pelo governo de revogar a Lei 892 pelo governo, o que é contestado pela categoria.

“Essa lei foi criada em janeiro de 2013 e até hoje não foi implementada na sua essência. Ficando do jeito que está, faz com que o trabalhador não seja reconhecido por seus méritos. Só para se ter um ideia, um trabalhador que tenha feito mestrado ou doutorado fica impedido de receber por esses títulos porque o governo não reconhece ainda a Lei 892, obtendo um prejuízo de cerca de R$ 1.600,00 ao mês. Temos conhecimento de colegas que estão nesse impasse há dois anos, e esse desgaste não é bom para o profissional”, frisou o presidente do Sinter.

“O governo tem dificultado o acesso ao direito dos trabalhadores em relação a essa lei, aí somos surpreendidos com o parecer da Proge [Procuradoria-Geral do Estado], enviado no dia 08 do mês passado, recomendando ao Estado a revogação da lei. Isso é um absurdo. A categoria exige que a lei seja implementada e que, se há alguma inconsistência, que a Secretaria de Educação sente e discuta a questão com o sindicato. Acreditamos no diálogo, pois somos inteligentes e queremos resolver esses problemas. A administração estadual não pode fazer vistas grossas e simplesmente ignorar toda a categoria, que entende que só está tomando essa decisão porque o próprio governo propiciou isso”, completou.    

Estudantes apóiam mobilização

A greve geral dos professores contou também com a participação de lideranças estudantis. O movimento contou com a participação em peso dos alunos das escolas Ayrton Senna, Gonçalves Dias, Ana Libória, Vitória Mota Cruz e Maria das Dores. Eles se solidarizaram em apoio à causa dos professores, alegando que há tempos sentem as dificuldades da falta de infraestrutura nas unidades de ensino.

Com cartazes e faixas, o grupo marchou para frente do Palácio Senador Hélio Campos, sede administrativa do governo. Com gritos enfatizando que “a aula hoje é aqui na rua”, eles cantaram os hinos nacional e do Estado, exigiram reação imediata da governadora Suely Campos (PP) frente aos problemas enfrentados pelos profissionais no Estado.

“O que impede o governo de dar uma boa educação para os estudantes? Eu me pergunto onde está a administração do Estado que ainda não tomou uma ação mais eficaz para resolver esses problemas. O movimento dos professores é justa e várias escolas estão reunidas aqui para dar apoio a eles”, disse o representante do Movimento Estudantil do Estado e presidente do Grêmio Estudantil da Escola Ayrton Senna, Lúcio Ferreira.

Representante internacional do parlamento juvenil do Mercosul em Roraima, a estudante Ísis Graziele também é uma das apoiadoras do movimento. Ela disse que a grande maioria dos estudantes se sente insatisfeita com a precária situação das unidades do Estado.

“Nosso movimento é em apoio aos professores e também para exigir os nossos direitos com relação à LDB [Lei de Diretrizes Básicas da Educação]. Nós queremos uma educação com acesso a todos e de qualidade, que atenda às necessidades dos alunos. A partir de hoje a aula é na rua e a gente está aprendendo que temos o direito ser ouvidos”, destacou.

O grupo disse ainda, que pretende manter as manifestações até que a administração do Estado tome providências a respeito da situação dos professores. “O movimento continua, nós vamos fazer uma manifestação durante a gincana das escolas, que será realizada no dia 11. O objetivo é que o governo ouça o que estamos exigindo”, frisou Lúcio Ferreira.

Seed diz que reivindicações fogem do acordo feito entre sindicato e governo

Em coletiva com a imprensa na tarde de ontem, na sede da Secretaria Estadual de Educação e Desportos (Seed), a titular da pasta, Selma Mulinari, contestou as alegações do Sinter sobre o não cumprimento de acordo. Segundo ela, o governo tem buscado um entendimento sobre as reivindicações da categoria, entretanto, a cada reunião, as pautas de reivindicação fugiriam dos acordos estabelecidos entre governo e o sindicato.  

“A pauta que nos foi apresentada na primeira conversa que tivemos com o sindicato é completamente diferente dessa pauta que foi apresentada agora. Como há sempre mudanças a cada vez que reunimos com o Sinter, é preciso que a gente tenha também muita cautela na hora de responder, porque a gente não está nem entendendo o porquê dessa situação chegar a esse ponto”, disse.

Selma destacou que a deflagração de greve realizada pelos trabalhadores seria inoportuna, uma vez que a administração estadual tem se esforçado ao máximo para promover a reestruturação do ensino público no Estado. “A gente pede para que os alunos retornem às escolas, até pelo fato de que nem todas as unidades paralisaram. Nós temos um número expressivo de professores que estão aguardando o retorno dos alunos. Também aproveitamos para convocar os professores para retornarem às salas de aula, porque esse não é o momento para uma greve, e sim de dar uma oportunidade para que possamos terminar o trabalho que iniciamos”, destacou.

“Todo mundo está vendo o esforço que a governadora Suely Campos [PP] tem feito na retomada do realinhamento e também da revitalização das escolas. Então, eu acho que não é o momento oportuno para isso e grande parte dos pontos daquele ofício de reivindicações encaminhado pelo Sinter tem sido cumprido. Então, essa paralisação é totalmente desnecessária”, complementou.

A secretária de Educação reforçou que está de portas abertas para receber o sindicato e espera sensibilidade da categoria com a questão do calendário escolar, já que, segundo ela, o descumprimento prejudica apenas os alunos.

“A pauta atual encaminhada pelo sindicato tem 30 itens. Então, é preciso que a equipe técnica sente e verifique ponto por ponto, justamente para ver se a Seed não descumpriu nenhum item. O Sinter acha que descumprimos, então vamos ter cautela na hora de responder aos questionamentos, até pelo fato de ver que o que está em jogo nessa história é o cumprimento do ano letivo. Ninguém está se incomodando nesse momento, principalmente o sindicato, com a questão dos alunos. Nós estamos incomodados. Queremos que os professores retornem às aulas porque o prejuízo já foi longe demais”, frisou. (M.L)