A redução de ruídos na cidade de Boa Vista será tema de uma audiência pública aprovada em única sessão nesta quarta-feira (15), na Câmara Municipal. A audiência ficou marcada para a próxima quinta-feira, 23 de março, às 8h, na casa legislativa dos vereadores da capital.
A audiência pública foi requerida após anos de tramitação da Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público de Roraima (MPRR) em 2014, que alegou inconstitucionalidade na lei 1.237, aprovada em 2010 com alterações. Na época, a promotoria de Defesa do Meio Ambiente destacou que as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), as orientações da Sociedade Brasileira de Otologia e os parâmetros reconhecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS), não foram seguidos ao aprovar a alteração da lei municipal.
A OMS indica que a exposição humana por longos períodos a sons acima de 50 decibéis (dB) pode ser nociva às pessoas. Em conversa com a assessoria do MPRR, a ação, que atualmente já é uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), foi destinada, principalmente, à nulidade da lei e inconstitucionalidade dos parâmetros reguladores dos carros de som.
Mas, o que foi alterado?
Foram alterados os parágrafos 3º do art. 47 e os 1º e 2º do art. 51, além do acréscimo do 5º parágrafo neste último, da antiga lei nº 513/2000. Com as alterações, os carros de som destinados à propaganda comercial, propaganda política ou de caráter pessoal esportivo foram obrigados a interromper qualquer emissão sonora antes da proximidade mínima de 50 m de hospitais, casas de saúde, escolas, creches e templos religiosos.
O nível máximo de som ou ruídos produzidos por veículos automotores (carros, motocicletas ou congêneres) ficou permitido em até 85 dB. E, para os carros de som, de qualquer natureza, destinados à propaganda comercial e/ou propaganda política, até 100 dB.
Aos locais de residência, estabelecimentos industriais, comerciais, de prestação de serviços, igrejas, vias e logradouros públicos, foi permitido 70 dB em ambiente externo até às 22h e 55 dB entre 22h e 07h do dia seguinte. Em ambientes internos abertos e fechados, de acordo com os horários, decrescem de 65 dB até 45 dB.
Ainda, que, em ambos os casos, a aferição destes decibéis é medida na curva “A” do decibelímetro, à distância de 7 m do veículo parado ao ar livre, em situação normal, de qualquer ponto das divisas do imóvel ou do ponto de maior intensidade de ruídos no edifício
Sindicato é contra a redução
O Sindicato dos Garçons e demais Trabalhadores no ramo de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares do Estado de Roraima (Sintag) é contra a redução de decibéis. Para os empresários e trabalhadores, caso a lei seja alterada nos termos sugeridos, irá prejudicar a todos os profissionais envolvidos direta ou indiretamente com o serviço de entretenimento de Boa Vista.
“Quando ele toca na situação dos decibéis, que é referente a música, ele acaba afetando uma cadeia. Não apenas a classe dos músicos, mas bares e restaurantes que contratam os músicos; lojistas que vendem roupas para que as pessoas saiam para evento; salões de beleza, lojas de calçados e sapatos, vestuários, taxistas, motoristas de aplicativo e vários outros. Então, assim, não está ali pontuando um único setor, é uma cadeia na verdade”, destacou Carol Dantas, representante dos empresários de bares e restaurantes.
Carol, Gabriel Carrero, presidente interino da Associação de Músicos, Técnicos de Sonorização e Iluminação e Auxiliadores de Roraima (ASIMUTRR), e Baia Garçom, presidente do Sintag, foram entrevistados pela FolhaBV. Para eles, a redução dos níveis de ruídos para 40 dB é um reflexo do retrocesso, diante da quantidade de locais de entretenimento atualmente em Boa Vista.
“Nós já estamos passando por uma tentativa, e a gente tem que compreender isso, de se reerguer de um período que o mundo todo ainda está sofrendo de pandemia. E aí quando a economia está começando a tomar um gás vem isso. A gente não é contra [a lei], mas é preciso pensar na parte da humanização. [A alteração] está sendo muito técnica e esquecendo que existe uma sociedade e famílias que serão atingidas. E quem vai ressarcir? Quem vai repor essa renda que será perdida?”, questionou Carrero.
Para elucidar, 40 dB é o mesmo que uma conversação silenciosa entre duas pessoas, em tom de voz baixo quase sussurrando. Conforme Carol, com um nível de ruído tão baixo, o máximo que haveria dentro das casas de show, boates, bares e restaurantes seriam apresentações em voz e violão, o que não é muito requisitado pela população local.
Os representantes também alegam não ser contra a lei ou alterações. Mas que é preciso um estudo de campo sobre a realidade desses locais para que seja definida uma legislação justa nos níveis de ruídos tanto para essas empresas, quanto para a população.
“Eu acho que antes de uma medida radical, é preciso ter uma medida educativa. Eu acho que na verdade o que está precisando ser feito hoje é essa medida educativa. Aqui, a gente tá falando com pessoas que têm essa informação. Mas outras pessoas que trabalham no MEI e que vivem na mesma situação, mas não têm acesso a informação”, ressaltou Carol.
Por fim, Baia reforçou que o sindicato e os trabalhadores irão à audiência da próxima semana, além de convocar todos, independente de ser do setor ou não. Entre eles estão: músicos, operadores de som, carregadores de apoio, garçons, cozinheiros, serviço gerais, barman, seguranças, restaurantes, casas de eventos, cerimonialistas, decoradores, ambulantes, DJs, Igrejas e outros.
“Nós estamos indo para Câmara Municipal para demonstrar no dia 23, que existem várias categorias, profissionais e segmentos que serão prejudicados. No próprio município vai ter redução de arrecadação com empresa fechando e eu, como representante das categorias que trabalham na noite, estou vendo aí uma carreta muito ruim para o estado de Roraima”, ressaltou.