Os dados divulgados pelo Cimi (Conselho Indigenista Missionário) no relatório “Violência contra os Povos Indígenas do Brasil de 2018”, que aponta Roraima com 62 assassinatos de índios no ano passado, foram colhidos sem base de notificação de causas das mortes, etnias, sexo e idade.
A reportagem da Folha pesquisou o relatório e constatou que das mortes divulgadas, apenas em sete casos foram informadas as causas, localização, sexo e etnias. O relatório foi divulgado na terça-feira, dia 24, na sede da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), em Brasília-DF.
A Folha falou com o conselheiro do Cimi, Luiz Ventura, da regional Norte 1, que integra os estados de Roraima e Amazonas. Ao ser questionado sobre o número de homicídios divulgados, e o porquê de não constar informações mais detalhadas sobre as mortes, ele afirmou que não tinha os números.
“No relatório deixamos claro que os dados não permitem análises mais aprofundadas, seja de faixa-etária ou das condições em que se deram”, disse. “As informações que aparecem são do Sistema de Informação de Mortalidade (SIM), que é alimentado pelas secretarias de saúde dos estados e que é de livre acesso”, afirmou.
As mortes encontradas no relatório com informações mais detalhadas foram de Ronilson Caetano, Makuxi de Canauanin, município do Cantá. Ele havia desaparecido após sair de uma festa e foi encontrado morto às margens de um igarapé. De acordo com a polícia, o corpo tinha sinais de pauladas na cabeça e um corte profundo no pescoço. (informações: Folha de Boa Vista);
Recílio da Silva Nascimento, Wapixana, comunidade Muriru, Município do Cantá. A vítima foi atingida por arma branca, de madrugada, em frente à casa onde morava. A motivação do crime não foi esclarecida pelo filho do indígena. (informações Folha de Boa Vista);
Alexsandro Melquior da Silva, Makuxi da Raposa Serra do Sol, Município de Uiramutã. O crime aconteceu na comunidade Macuquem, onde foi morto pela própria mulher que usou um canivete para matar o marido. (informações do G1/RR)
Dois crimes aconteceram na região Serra da Estrutura, Terra Yanomami no Município de Mucajaí. Conforme denúncia da associação Hutukara Yanomami, encaminhada ao MPF-RR, em julho de 2018, dois indígenas isolados Moxihatëtëa teriam sido mortos por um grupo de garimpeiros que teriam adentrado até a região da Serra da Estrutura, onde a presença de grupos indígenas isolados é bastante comum. Os nomes dos indígenas não foram citados.
Caciano Ambrósio, Wapixana da Tabalascada, Município do Cantá, foi atingido por um carro quando andava de bicicleta na BR- 432. (informações do G1/RR).
Dalvan Gomes Ingarikó, Ingarikó da Raposa Serra do Sol. Foi encontrado morto às margens da BR-174. O motorista fugiu do local sem prestar socorro (informações da Folha de Boa Vista)
Uma criança Yanomami foi atropelada e morreu no hospital após ser socorrida. Nenhum familiar compareceu ao hospital (informações da Folha de Boa Vista).
Cimi afirma que não tem informações detalhadas sobre homicídios
Luís Ventura, Coordenador do CIMI Regional Norte I. (Foto: Lígia Apel.)
Luiz Ventura informou que o Sistema de Informação de Mortalidade (SIM) é formado por informações que são repassadas pelos distritos de saúde indígena, no caso de Roraima, o Dsei Leste, e o Yanomami pelo Siase (Sistema de Informação de Saúde Indígena), referentes a óbitos nas comunidades indígenas. A estas informações são agregados os dados registrados pela Sesau (Secretaria Estadual de Saúde) dos óbitos de indígenas registrados nos núcleos urbanos.
“Por essa razão não temos como informar como aconteceram estas mortes, nem em que local. Não temos estas informações”, afirmou.
Sobre o fato de apenas sete mortes terem sido divulgados com detalhes no relatório, Ventura justificou como sendo crimes considerados culposos (quando uma pessoa mata outra sem a intenção).
“Foram homicídios culposos, como estão caracterizados, são mortes que podem acontecer como acidentes nas rodovias”, disse. “Mas queremos deixar claro que estes homicídios não aconteceram nas comunidades, mas pela soma dos homicídios divulgados pelos Dsei e pelo que acontece nas cidades. Dissemos isso no relatório”, afirmou.
No relatório o Cimi informa que conseguiu as informações divulgadas com base na Lei de Acesso à Informação, junto à Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), e através de consultas às secretarias estaduais de saúde de Roraima e dos estados da Bahia, do Mato Grosso do Sul, Pernambuco e Paraná.
Ontem, a Secretaria Estadual de Saúde desmentiu que tenha dado ao Cimi a informação de que 62 indígenas foram assassinados em 2018, em Roraima. Segundo a CGVS (Coordenação Geral de Vigilância em Saúde), não foi feito nenhum levantamento de homicídios de indígenas pelo órgão. “Cabe esta atribuição à Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), órgão vinculado ao Governo Federal”.
Quanto ao número de homicídios, Ventura disse que o Cimi considera muito alto e preocupante. “Isso é extremamente preocupante e por isso vimos que era necessária que essa informação se tornasse pública. Tentar entender o que está acontecendo, já que o Sistema mostra que houve essas mortes que teve como causa o homicídio”, disse. (R.R)