Cotidiano

Salão de beleza recebe doações de cabelos há 14 anos

Doar cabelo pode ser um ato muito mais significativo do que parece e simbolizar o desejo de bem-estar para o próximo que está sofrendo as consequências de alguma doença ou acidente que faça com que haja a perda das madeixas.

O Salão da Leo, localizado na Avenida Sebastião Diniz, bairro Centro, é um ponto já tradicionalmente conhecido por receber doação de cabelos há 14 anos. Para isso, é preciso que a parte doada tenha pelo menos 20 centímetros, pois o processo de tratamento e confecção pode acabar encolhendo o cabelo, e esteja com crescimento natural, sem uso de produtos químicos.

A dona do salão, Leonici Ana Strieder, explica que começou a receber doações após se sentir sensibilizada com clientes que faziam quimioterapia.

“Eu atendia algumas mulheres que eram pacientes portadoras de câncer e faziam tratamento. E para mim era a coisa mais triste pegar em uma mecha de cabelo delas e ver se despedaçando. Pior ainda é quando vinham para raspar, pois ver a reação delas dava muita dor no coração. Então, comecei a acumular cabelo de quem quisesse doar, sem ter muito bem um lugar para mandar”, afirmou.

Os cabelos são mandados para o Hospital de Câncer de Barretos, em São Paulo, considerado referência em tratamentos do tipo no Brasil. Leo explicou que acabou escolhendo mandar caixas de cabelos para a entidade a cada seis meses por acreditar na sua transparência.

“Eu tenho gente que mora até no Cantá que já passou no Hospital de Barretos para fazer tratamento e recebeu a peruca. E gosto de ver que é um lugar que realmente usa para os pacientes. Dentro do hospital, há um local de confecção, que é feito por voluntários e até mesmo com ajuda de alguns pacientes que moram lá fazendo tratamento”, afirmou.

Apesar da longa parceria com o Hospital de Barretos, Leo afirmou que está em busca de novos parceiros na Região norte.

“Existe uma casa em Manaus que parece que faz a confecção de cabelos também. Eu ainda estou pesquisando melhor sobre o trabalho que fazem por lá, pois para mim precisa ter transparência e a certeza de que o cabelo será doado para quem mais precisa”, complementou.

Quem já doou cabelo no mesmo salão foi a jornalista Vanessa Vieira, em janeiro de 2018. Ela contou que deixou o cabelo crescer por três anos e está deixando-o crescer desde então novamente, mas ainda está em dúvida se doará dessa vez. Sua inspiração para o ato de solidariedade foi uma reportagem vista por ela há alguns anos mostrando casos de mulheres vítimas de escalpelamento por motores de barco.

“Isso geralmente ocorre com mulheres de cabelos grandes que trabalham com barcos, principalmente aqui na Região Norte. Minha ideia inicial era doar para alguma instituição que as acolhe. Cheguei a entrar em contato com uma entidade, mas o processo era bem complicado e muitas informações foram dadas de forma vaga, então, não senti segurança. Daí, me deparei com a Leo, que manda para vítimas de câncer. E como já houve casos na minha família, para mim foi uma coisa que me sensibilizou da mesma forma”, contou.

Vanessa salientou que o ato de doar cabelo é mais importante do que pode parecer, frisando que mesmo parecendo algo simplesmente estético, faz toda diferença para o psicológico de quem enfrenta adversidades.

“No fim das coisas, o cabelo não foi para quem eu queria a princípio, mas foi para alguém que precisa tanto quanto. Para nós, doar cabelo pode parecer algo pequeno. Mas para mulheres que estão sofrendo com o câncer e seu tratamento ou com as feridas após um escalpelamento, também perde autoestima, por não conseguir se ver sem cabelo. Então, é um ato que faz toda a diferença para essas pessoas”, frisou.

MIRO CABELEIREIRO – Além do Salão da Leo, é possível doar cabelo para o Miro Cabeleireiro. Por lá, os cabelos sãos encaminhados para confecção na organização não governamental (ONG) Cabelegria, que trabalha com mulheres e crianças vítimas de doenças ou acidentes que levam à queda de madeixas e possui 18 pontos de coleta no Rio de Janeiro e em São Paulo.

SENTINDO A EXPERIÊNCIA – Eu, repórter Pedro Barbosa, deixei o cabelo crescer durante pouco mais de dois anos visando doar. A última vez que cortei foi em setembro de 2016, e dali em diante resolvi deixar crescer. Acabei enfrentando alguns “desafios” como cuidar de um cabelo grande,  usar “xuxinha” e não deixar as pontas se prenderem. Fiquei até com fama de “repórter cabeludo” ou de “Jesus” ao longo de 2018. Doei na última quinta-feira, 17, e sinto que foi o final de um ciclo. Recomendo a experiência para todos, pois às vezes não temos ideia do quanto podemos mudar a vida de alguém com atitudes tão simples como essa. (P.B)