Diariamente, centenas de venezuelanos atravessam a fronteira em fuga da fome e crise humanitária no país chavista. Com a grande quantidade de imigrantes buscando meios de sobrevivência em território brasileiro, os espaços disponíveis para abrigamento estão lotados. Para evitar viver em situação de rua, muitos ocupam prédios públicos abandonados após anos em desuso.
Logo na fachada, a janela do antigo prédio da Secretaria Estadual de Educação e Desporto (Seed) exibe as redes atadas. Desabitado há mais de 10 anos, o local atualmente serve como moradia de 25 famílias, mais de 50 pessoas entre adultos e crianças, que convivem com lixo, documentos antigos e materiais de computação utilizados pela secretaria e que hoje estão jogados no chão. A estrutura do prédio está deteriorada após dois incêndios ocorridos no ano anterior.
Mesmo com os pisos inundados por conta da chuva e sem eletricidade, Katiuka Lara, de 25 anos, prefere permanecer no local por não ter para onde ir caso seja despejada. Com três filhos e o esposo, a família dorme em cima de isopores e papelão há uma semana. “Fico muito mal de viver assim, penso nos meus filhos, mas é melhor do que viver na Venezuela. Não tinha abrigo, então tive que vir aqui”, lamentou enquanto lavava roupa em um latão de tinta.
Durante a visita da equipe da Folha, os venezuelanos recolhiam materiais de metais para venderem por R$ 0,25 o quilo. Conforme relatou uma das ocupantes, Edelin Espinoza, de 37 anos, a forma de conseguir comida é pedindo em outras casas e por esmola nas ruas, mas que não há alimento para todos os dias, já que todos da morada realizam a alimentação juntos.
A situação é a mesma encontrada no antigo depósito de alimento da Seed, localizado na Avenida Mario Homem de Melo, em frente à Praça do Caimbé. O local está cheio de redes e malas. Há um ano morando com o filho em um colchonete, Yennifer Jimenez, de 31 anos, também não conseguiu abrigo e decidiu ficar no local pela água e banheiro que encontrou.
“São pelo menos 30 pessoas dormindo aqui. Choro muito porque eu nunca me imaginei nessa situação, trabalhava em uma loteria na Venezuela. Eu queria tentar ir para Manaus, conseguir um emprego. Fiz o cadastro, mas não me chamaram”, contou.
Da mesma forma, a Avenida Minas Gerais se tornou endereço de venezuelanos que ocuparam o prédio da antiga Escola Estadual Hidelbrando Ferro Bittencourt. Uma placa foi colocada em dezembro informando que no local funcionará a sede da Polícia Militar. Atualmente, as roupas estendidas nas grades das janelas podem ser vistas de longe, assim como diversas pessoas caminhando dentro do terreno.
Famílias com crianças vivem no local sem eletricidade e pegando chuva, mas têm medo de serem despejadas (Foto: Diane Sampaio/FolhaBV)
Governo alerta que prédios não são apropriados
A Secretaria Estadual de Comunicação informou, em nota, que a gestão da imigração venezuelana é da Operação Acolhida, responsável pela remoção voluntária de imigrantes que ocupam prédios públicos desativados. “Esclarece ainda que os referidos prédios aguardam reformas nas estruturas físicas e que não são locais apropriados para moradia”, completou.
Não há previsão de ampliar vagas, diz Exército
Moradores fazem fogo com gravetos e exercito diz que não tem vagas em abrigos (Foto: Diane Sampaio/FolhaBV)
Em nota, o Ministério da Defesa informou que no trabalho desenvolvido pela Operação Acolhida, tanto o abrigamento quanto a interiorização são processos voluntários. Há 11 abrigos em Boa Vista e dois em Pacaraima, que atendem diferentes públicos.
“No momento são disponibilizadas seis mil vagas nesses abrigos, que não possuem previsão de ampliação no momento. Sobre a população de rua, a Operação oferece serviços voltados para esse público, como ceder local para pernoite, refeições e materiais de higiene pessoal”, ressaltou o posicionamento. A nota destacou ainda que para que ocorra o fluxo nos abrigos, o processo de interiorização é fundamental.