Cotidiano

Tenente-coronel diz que onda de crimes é resultado do caos no sistema prisional

A média de quase um assassinato a cada dois dias no Estado assusta a população, que convive diariamente com o medo e a insegurança

Os casos recorrentes de assassinatos, em especial os crimes de execução, em Roraima, têm preocupado a população, que convive diariamente com o medo e a insegurança das ruas. Conforme levantamento feito pela Folha, somente este ano, nos primeiros 70 dias, 34 pessoas foram assassinadas no Estado, média de quase uma morte a cada dois dias, sendo que dez destes casos com sinais de execução.
Para o tenente-coronel Jurandir Pereira Rebouças, da Polícia Militar de Roraima, especialista na área criminal e que recentemente lançou um livro sobre segurança pública no Estado, a maioria dos crimes praticados, tanto na Capital quanto no interior, tem relação com o sistema prisional. “Quando o sistema não consegue manter os presos trancafiados, eles acabam fugindo e aqui fora vão precisar se alimentar. É claro que não vão atrás de emprego, eles vão praticar assaltos e uma hora acaba acontecendo um homicídio”, explicou.
Segundo ele, o Estado não vem cumprindo com a Lei n° 7.210/84, que trata de execuções penais no país. “A Lei de Execução Penal diz que a pena tem dois objetivos: o primeiro é servir de punição para quem violou alguma regra e, o principal, é a ressocialização desse preso para que ele possa voltar, após o cumprimento da pena, à sociedade”, disse.
Conforme o tenente-coronel, Roraima não dispõe de nenhum presídio capaz de comportar presos em regime fechado. “Não existe penitenciária para aquele preso condenado há mais de oito anos de prisão em regime fechado, aqui em Roraima. O que existe é uma colônia agrícola, que deveria ser apenas para quem está no aberto e semi-aberto”, destacou.
O especialista disse ainda, que a onda de violência em todo o Estado só vem acontecendo porque não foi cumprida, por parte das autoridades, ao longo dos anos, a obrigação de construir locais adequados para os condenados. “Quem manda nos presídios são os presos. A realidade é bem clara, o sistema não consegue manter esses detentos trancafiados, inclusive os de alta periculosidade, porque não tem estrutura física para isso”, frisou.
De acordo com Rebouças, o maior erro do Estado é não admitir a presença de facções criminosas em Roraima. “Alguns outros estados, em outras regiões, como no Centro-Oeste e na região Sul, só admitiram a presença do crime organizado quando já estava enraizado. O maior erro aqui é não admitir isso”, ressaltou o especialista.

Estado erra ao não admitir presença do crime organizado, diz especialista
A recente transferência de um dos líderes do crime organizado em Roraima, Waldeneys de Alencar Souza, o “Diney”, ocorrida na quinta-feira, 12, para um presídio federal de segurança máxima em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, ocorrida após um pedido do Ministério Público (MPRR), seria o momento ideal, segundo o tenente-coronel Jurandir Pereira Rebouças, de o Estado “aceitar” a existência de facções nos presídios locais.  “Se não existisse, não estariam transferindo para outros estados”, afirmou.
Entretanto, para ele, a medida do órgão estadual não fará com que a violência diminua. “Existe uma diferença entre o crime semi-organizado e o organizado. Quando se tira ‘o cabeça’ no semi-organizado, a tendência é que deixe de existir. Achar que isso vai acontecer também com as facções é ledo engano. Não adianta pedir que a Justiça determine a transferência desses líderes para outros estados, porque no crime organizado quando um cai, outro assume”, frisou.
ANTES E DEPOIS – O especialista ainda fez questão de citar que, apesar dos altos índices de violência, o trabalho de controle na segurança pública tem melhorado ao longo dos anos. “Antigamente, comemoravam os dias que não havia fugas na Penitenciária Agrícola do Monte Cristo. Em outro momento, ficavam felizes por acharem apenas uma ou duas armas de fogo nas celas. Ora, não era para ter fuga em nenhum dia, muito menos armas de fogo em posse dos presos”.
CRIMES PASSIONAIS – Em relação aos assassinatos cometidos por motivos passionais, o tenente-coronel explicou que a justificativa sentimental não exclui a imputabilidade do criminoso. “Infelizmente acontece. Embora a emoção e a paixão não façam com que o assassino se torne imputável. O autor – se comprovado a autoria do crime – será condenado em júri popular como qualquer outro assassino”, disse.
TRÁFICO DE DROGAS – Sobre a questão da ligação do tráfico de drogas com a onda de crimes, Rebouças foi rígido nas palavras e afirmou que, da mesma forma que há o julgamento por parte da sociedade, sobretudo alguns da classe média, os mesmos alimentam o narcotráfico. 
“Grande parte dos delitos está relacionado com o tráfico. Infelizmente, a disputa pelo controle e disputa da hegemonia do tráfico gera a violência. Entretanto, enquanto a classe média, sem generalizar, cobra resposta da polícia, muitos vão às bocas de fumo alimentar o crime organizado”, pontuou o tenente-coronel. (L.G.C)