Vendedor abandonou o emprego para abrir loja de açaí sem ter um real

Em 2016, o paraense Wilson Oliveira de Sousa resolveu finalizar seus 12 anos de trajetória em uma distribuidora de produtos alimentícios de Boa Vista para abrir uma loja de açaí na parte frontal da própria casa, no bairro Pintolândia.

Isso, segundo ele, sem ter um real. “Inaugurei a primeira loja numa rua morta, escondida. Todo mundo me chamando de doido”, lembrou.

Para levantar o negócio, Wilson disse ter emprestado R$ 40 mil da irmã e recebido a ajuda de uma cliente da distribuidora onde trabalhava. Ela comprou para ele uma máquina de açaí por R$ 25 mil, com a condição de que o novo empreendedor começasse a pagar a dívida após um ano.

A loja, inicialmente, tinha 32 metros quadrados, apenas uma diarista e uma moto Honda Biz como veículo de transporte de mercadorias. O empreendimento começou apresentando um cardápio com apenas um tipo de açaí: o “frozen”. O menu, que começou com uma página, hoje tem dez folhas e oferece, por exemplo, balde de açaí de 800ml, salada de frutas, sorvete, salgados, sucos, milk-shake, vitaminas, tacacá e vatapá – estes dois últimos elementos marcantes da culinária paraense.

Em cinco anos, a loja se transformou em um negócio lucrativo, com três unidades (uma delas abertas no pico da pandemia), um galpão distribuidor e dois veículos a serviço da empresa. Com o atual faturamento mensal de R$ 800 mil, uma média de 1 mil atendimentos diários e 70 revendedores autorizados espalhados pelos 15 municípios de Roraima, a empresa segue em expansão, a exemplo da compra de dois terrenos vizinhos da loja matriz, que passará a ter área de mais de mil metros quadrados. “Aqui não foi sucesso, aqui foi pela fé”, declarou Wilson.

Negócio que virou sonho para pessoas, como Monaliza Lobato. Nove meses atrás, quando estava desempregada, ela resolveu se candidatar a uma vaga na loja e, mesmo sem experiência, foi admitida como auxiliar de montagem. Depois, passou para o atendimento ao público e, atualmente, exerce o cargo de gerente de atendimento. “Sempre falava: um dia irei trabalhar nesse lugar”, lembrou ela, que com o salário, ajuda os dois filhos e a mãe.

Monaliza conta que, em menos de um ano, teve a vida modificada trabalhando com o açaí. “Comecei a conquistar minhas coisas. Eu tinha um sonho, que era ser independente e ter meu cantinho. Nesse período de trabalho, procurei dar o meu melhor”, declarou.

Para a gerente de atendimento, a empresa cresceu graças à fé, garra, espírito empreendedor, força de vontade e coragem de Wilson. “Sem contar que ele cuida da própria empresa de perto, e isso é uma das coisas essenciais num primeiro momento. O cuidado, a preocupação com o manuseio e a estocagem dos produtos, com o bom atendimento ao cliente”, disse.

Empresário viveu o fundo do poço

O sucesso do negócio representa, para Wilson Oliveira, o ápice da superação dos sofrimentos que viveu na vida, como o alcoolismo, o qual ele aponta como um dos motivos que causaram sua separação da mãe de seus dois filhos e da convivência com eles. Ainda em sua cidade natal, Itaituba (PA), ele escolheu a sobriedade pelos filhos. “Eu decidi dar pros meus filhos um pai sóbrio. O meu início de sobriedade não teve nada a ver com religião, igreja. Tudo teve a ver com as duas crianças”, lembra.

Assim como foi tomar uma atitude de fé em 2016, 12 anos antes ele resolveu apostar uma nova vida em Boa Vista. “Na separação, eu não quis nada, eu decidi sair sem nada e deixei a mulher com as crianças. E eu estava disposto a iniciar a minha vida só”, disse.

Ao chegar à capital de Roraima, com a roupa do corpo e R$ 10 no bolso, Wilson pagou para fazer uma foto sem camisa para registrar que tinha perdido 20 quilos por conta da depressão sofrida. Era um registro símbolo do “fundo do poço” que vivia. “A intenção não era ser mentor, palestrante. Era algo pessoal meu. Estava registrando pra mim”, destacou. “Foi o pior dia da minha vida, quando eu cheguei, frustrado, quebrado, os filhos ficaram para trás, o futuro incerto. A magreza foi por conta de depressão, pela perda material, pela distância dos filhos”.

Inicialmente, ele foi acolhido por dois sobrinhos em uma quitinete alugada, até arrumar um emprego na logística de uma distribuidora local, quando teve condições de alugar um apartamento. Três anos depois, após ser promovido a vendedor, ele trouxe os filhos Giovanna e Lohmann para Boa Vista e comprou uma moto, a qual guarda até hoje.

“E nessa época que eu morava com eles, durante um ano, nós tomávamos a água que eu levava do meu trabalho ou da igreja, nós não tínhamos geladeira e nem mesa durante o ano com as crianças, e nós almoçávamos no restaurante de R$ 1”, relembrou.

Em 2016, como supervisor de vendas da distribuidora, Wilson descobriu o potencial empreendedor do açaí durante uma visita à vila Colina, em Rorainópolis. “Um cara vendia açaí na tigela. Fui lá uma vez conferir. Fui no outro mês. Tomei de novo. E no terceiro mês, falei: ‘cara, e esse ramo de açaí?’ Ele falou: ‘esse ramo é bom demais’. O cara me motivou. Eu vim de Rorainópolis só pensando em açaí. Quando eu cheguei aqui, mandei uma foto desse terreno [foto abaixo] aqui pra um amigo meu, que fez eu sonhar alto. Mas aí como tu ia montar algo sem dinheiro?”, disse ele, que no mesmo mês, pediu demissão da distribuidora para abrir o negócio próprio, com a ajuda da irmã e de uma antiga cliente do tempo de distribuidora.

Cinco anos depois, com o sucesso do próprio negócio, Wilson estampa na camisa dos funcionários frases como “valeu a pena” – que reflete sobre a superação dos maus bocados que ele passou na vida -, e “até amanhã”, uma espécie de assinatura final do atendimento ao cliente.