“Hoje eu sinto paz e é a melhor coisa. Estou me tranquilizando. Uma separação não é fácil, você começar do zero, mas você consegue. Agora eu me vejo livre”. O relato é da zeladora Ediane Cristiele, de 45 anos, que se divorciou após 18 anos em uma relação marcada por agressões físicas e danos emocionais.
Assim como Ediane, cerca de 27% das mulheres brasileiras já sofreram violência psicológica no relacionamento. O dado faz parte de uma pesquisa do Instituto Patrícia Galvão, em parceria com Ipec e apoio do Instituto Beja, divulgada neste mês de novembro.
A violência psicológica contra a mulher foi tipificada pela lei 14.188 de 29 de julho de 2021. No texto, inserido no Código Penal Brasileiro, o dano emocional à mulher é caracterizado por ações “que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões”.
Este crime pode ocorrer por meio de ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, chantagem, ridicularização, limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro método. A pena é de reclusão de seis meses a dois anos e multa.
A norma também incluiu na Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006) o critério de existência de risco à integridade psicológica da mulher como um dos motivos para o juiz, o delegado, ou mesmo o policial (quando não houver delegado) determinarem o afastamento do agressor do local de convivência com a vítima. Até então, isso só poderia ser feito em caso de risco à integridade física da vítima.
Há um ano, Ediane saiu de casa com a filha, de 5 anos, e o filho, de 16, um ventilador, uma TV e roupas. Após receber auxílio jurídico e acolhimento na Casa da Mulher Brasileira, ela fez sete meses de terapia e agora diz que se sente “livre”.
“Eu vou e volto para onde eu quero, faço o que eu quero, eu trabalho, corro atrás o tempo todo. Isso é força de vontade. Sua paz é a melhor coisa que tem. Hoje eu tenho paz”, afirma Ediane.
A delegada Verlânia Assis, titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), explica que, ao chegar na Casa da Mulher, a vítima de violência passa por uma análise no setor psicossocial, com psicólogos e assistentes sociais, que identificam o dano emocional. Após isso, caso ela deseje que o agressor seja punido, é encaminhada à delegacia.
Na unidade, também é ofertado auxílio jurídico por meio da Defensoria Pública e Ministério Público, além de apoio assistencialista por meio da Secretaria do Trabalho e Bem-Estar Social (Setrabes). Mas um dos principais apoios, conforme Verlânia, vem da família da vítima.
“Uma coisa fundamental para a vítima, é a família. Ela precisa ser apoiada, pois traz consigo a vergonha de ter feito uma má escolha. Daí, a necessidade de apoio daqueles que estão próximos. As providências são adotadas, mas ela [a vítima] precisa ser fortalecida”, explica a delegada.
A delegada explica que os sinais de que o parceiro comete violência psicológica são ofensas verbais diárias, menosprezo, provocação de abalo à imagem da mulher, alegação que ela está “criando situações na própria mente” e outras situações.
“O autor dessa violência psicológica diariamente afeta a autoimagem dessa mulher, a ideia, a autoestima de uma forma geral”, comenta a delegada.
Prevenção
Verlânia defende que é necessário o engajamento da sociedade e família no combate a violência, pois nem todos os casos são denunciados.
“O Estado, muitas vezes, não alcança a esfera íntima daquela mulher, ou seja, a privacidade do lar. É preciso que se denuncie. Por isso a importância de um engajamento de toda a sociedade para que aquela violência seja comunicada. A conscientização da sociedade e da família que essa mulher precisa de apoio, é muito importante”, finaliza.
Denúncia
As vítimas ou pessoas próximas podem denunciar as ações de violência pelo 180, canal de atendimento a mulher; ou no 190 da Polícia Militar. Além disso, a vítima também pode procurar a Casa da Mulher Brasileira e a Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM), no bairro São Vicente.