Economia

Contratações devem ser com salários menores e sem carteira, diz pesquisa

Número de profissionais que recebem de zero a um salário mínimo avançou 18,11% do primeiro trimestre de 2020 ao terceiro semestre de 2021, segundo pesquisa da LCA Consultores

A profissional de logística Camila Fioravanti, de 38 anos, perdeu o emprego em que atuava na área de compras por 17 anos em outubro de 2019 — pouco antes da Covid-19 chegar ao Brasil.

Por conta do fim do ano e da chegada da pandemia logo em seguida, ela levou 11 meses para ser recolocada. A dificuldade para se adaptar à nova empresa, no entanto, fez com que ela fosse demitida novamente, em agosto de 2020.

Na busca por uma nova oportunidade, Camila disse ter se deparado com diversos processos seletivos exaustivos, que exigiam alta qualificação, mas ofereciam baixa remuneração e não eram registrados. Em janeiro de 2021, ela foi contratada como analista de compras em uma empresa de médio porte, com salário quase 50% inferior ao que ganhava na empresa onde fez carreira.

“Aceitei a vaga por ser perto da minha casa, oferecer benefícios e por ser um ramo que já conheço, mas não quero me acomodar. Não deixarei mais a porta fechada”, disse Camila.

Salários em queda

A realidade de Camila não é isolada. Pesquisa realizada pelo economista Bruno Imaizumi, da LCA Consultores, aponta que os empregos criados no país realmente estão pagando menos.

De acordo com o levantamento, feito a partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do primeiro trimestre de 2020 ao terceiro semestre do ano passado o número de ocupados que recebem de zero a um salário mínimo (R$ 1.212) passou de 28,476 milhões para 33,635 milhões, uma alta de 18,11%.

Ao mesmo tempo, a quantidade de profissionais ocupados com rendimentos superiores a dois salários mínimos (R$ 2.424) passou de 28,883 milhões para 26,547 milhões no período — uma queda de 8% (veja no gráfico abaixo).

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) divulgados na sexta-feira (28) corroboram a pesquisa da LCA: a taxa de desemprego no Brasil recuou para 11,6% no trimestre encerrado em novembro. No entanto, o rendimento real habitual caiu 4,5% frente ao trimestre anterior, para R$ 2.444 – o menor rendimento da série histórica iniciada em 2012.

Sem crescimento econômico, sem recuperação dos salários

De acordo com Imaizumi, o Brasil deve retomar a quantidade de vagas que tinha no pré-pandemia, mas a qualidade dessas oportunidades não deve melhorar enquanto a economia do país não se recuperar. A expectativa da LCA Consultores é que o PIB do país cresça 0,7% este ano.

“Olhar só para a taxa de desemprego não conta muito bem a história do que acontece com o mercado de trabalho. As pessoas estão se ocupando em vagas de menor ocupação e logo vão tentar se realocar em um nível melhor. Será uma recuperação limitada”, explicou o economista.

Na avaliação de Márcio Pochmann, professor de economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), como o ambiente econômico do país não é favorável , os empregadores estão contratando profissionais em formatos que geram menos riscos, como contratos curtos e salários menores. Desta forma, eles mitigam as perdas caso a retomada demore a acontecer.

Inflação é fator negativo

Além dos novos contratos de trabalho pagarem menos, a inflação, fechada em 10,06% em 2021, também teve um grande impacto nos rendimentos de quem já estava trabalhando.

Boletim produzido pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) aponta que 50,2% dos reajustes salariais em 2021 ficaram abaixo do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Apenas 18,2% dos reajustes conseguiram superar o índice inflacionário.

“O mercado de trabalho é um mercado como qualquer outro. E, desta forma, quem dita as regras é a oferta e a demanda. Quando a oferta é grande, os salários caem”, explicou Hélio Zylberstajn, professor sênior da Faculdade de Economia da Universidade de São Paulo (USP), que coordena o boletim.