Há cinco anos, o bombeiro aposentado Germano Neto, hoje com 60 anos, abriu mão da convivência diária com a esposa Patrícia Pinheiro, 40, para perseguir o sonho do filho do casal, Leandro Germano, 15, que deseja ser jogador profissional de uma grande equipe do futebol brasileiro. Sonho que, na infância, o próprio pai desejou para si, mas que, sem perspectivas, desistiu do projeto para estudar e trabalhar em outra área.
Em 2016, o menino que atua como meia foi aprovado na primeira fase de uma peneira realizada pelo Flamengo, em Boa Vista, para no ano seguinte participar de outras etapas de avaliação, no Rio de Janeiro. “Decidi que, se ele passasse ou não, a gente ficava por lá, porque no pior time que ele jogasse lá, seria melhor que no melhor daqui”, disse Germano Neto.
Enquanto isso, a mãe ficou na capital de Roraima. “Não é fácil pra mim, nem pra ela, que tem que se virar com a situação da nossa filha [Érica Nataly, hoje com 20 anos e que sofre sequelas graves da Covid-19]. Mas é aquele negócio, pra realizar o sonho do filho…”, tenta dizer o bombeiro, que começa a chorar. “A gente aguenta a saudade”, completa Patrícia.
Desde então, pai e filho só vêm a Boa Vista nas férias escolares e a mãe, quando possível, vai ao Rio. Na época da decisão, segundo Germano Neto, a família levava uma vida difícil financeiramente. “Nunca tomei essas decisões pensando no meu filho ser jogador de futebol pelo dinheiro. Até porque hoje vivemos uma vida simples, mas bem confortável”, contou.
Inicialmente, o bombeiro desejava levar o filho para o América Mineiro, por ser um clube mediano, mas estruturado e com atenção à formação de base. “Ele atropelou todos esses planos, foi aprovado aos oito anos no Flamengo e falei que ia embora com toda dificuldade e tudo”, lembrou.
No Fla, Leandro Germano atuou por dois anos e meio e conheceu promessas, como o atacante David Viana, um dos atletas com grande potencial de se integrar ao elenco profissional. Tímido, ele lembra em poucas palavras a experiência. “Foi um período muito bom no Flamengo, pois aprendi muitas coisas, passei dois anos lá e duas vezes por semana treinava no Ninho do Urubu, depois fui pro Cefan [Centro de Educação Física Almirante Adalberto Nunes]”, relatou.
Ele explicou não ter morado no mesmo alojamento das vítimas da tragédia do Ninho porque era de uma categoria menor (Sub-13) e que não os conhecia. “Praticamente sentimos a tragédia como se estivéssemos presentes”, completou o pai, em virtude de eles morarem próximos do local, na época.
De 2020 a 2022, Leandro Germano jogou na base do Boavista (RJ), por onde foi bicampeão do torneio de base Copa Zico, tendo sido artilheiro da edição de 2020 com sete gols.
No início deste ano, o roraimense se transferiu para o Serrano (RJ), pelo qual jogou a segunda divisão do Campeonato Carioca Sub-15 e chegou às oitavas de final do Campeonato Brasileirinho Internacional de Clubes. No dia 23 de janeiro, ele se reapresenta ao clube para disputar o Campeonato Brasileirinho Sub-16. Para 2023, o atleta disse esperar “fazer grandes campeonatos para ir para times maiores”.
O passado
Muitas intempéries poderiam interromper a trajetória. Na infância, Leandro Germano foi atropelado por uma moto, quase foi picado por uma jararaca (o que podia matá-lo), quase se afogou em um igarapé e ainda perdeu as falanges distal e média do quarto dedo do pé direito (os ossos da ponta) em uma queda de bicicleta com o pai. “A gente pensou que ele ia ficar sensível, mas a força dele vem desse dedo”, relatou a mãe Patrícia.
Ele superou tudo isso para jogar futebol, que descobriu em casa, chutando a bola na parede, chegando a quebrar os objetos. E aprimorou o conhecimento começando a jogar futsal, tendo passagens pela base de Constelação, Tiradentes e Escolinha do Flamengo antes de deixar Roraima.
O futuro
Na caminhada rumo ao sonho, Leandro Germano tem o importante reforço do ex-jogador Fellype Gabriel, hoje empresário de atletas. O ex-meia teve passagens por Flamengo, Vasco, Botafogo e Cruzeiro, e chegou a ser chamado por Mano Menezes, então técnico da seleção brasileira, para um amistoso contra a Argentina. “O Fellype Gabriel já vinha observando ele há algum tempo e nos fez a proposta e assinamos o contrato dele pra agenciar a carreira dele”, relatou Germano Neto.
O pai é realista ao dizer que, caso o filho não consiga realizar o sonho, irá optar exclusivamente pelos estudos, tendo como alternativas a formação em Educação Física ou a carreira militar. “Se Deus me der um pouco de saúde, vou estar com ele até Deus dizer que isso [futebol] não é pra ele”, disse Germano Neto.
Enquanto isso, o garoto persegue o que deseja desde muito pequeno. “É um sonho que eu sempre tive, desde criancinha: querer jogar profissionalmente e ajudar meus pais”, disse Leandro Germano.