Cotidiano

“Mudança não gerou empregos prometidos”, diz especialista

Em Roraima, assim como no restante do país, houve redução considerável no volume de novas ações na Justiça do Trabalho durante período após reforma trabalhista

LEO DAUBERMANN

Editoria de Cidades

A reforma trabalhista, que trouxe mudanças na Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), não gerou os empregos prometidos, após um ano de implantação, colocando em dúvida o argumento de que era preciso modernizar a CLT para aquecer a economia. A afirmação é do especialista em direito trabalhista, Jaques Sonntag.

“A reforma trabalhista foi impulsionada grande parte pelo setor comercial e industrial, buscando uma maior segurança jurídica nas ações trabalhistas. Em relação a esse aspecto, nós não temos um reflexo direto, porque não houve um aumento considerável de empregos, pelo contrário, na verdade aumentou o número de desempregados, reduziu o número de pessoas com carteira assinada. Só não temos certeza ainda, se isso é reflexo da economia política do país ou se é reflexo da questão de alteração da legislação trabalhista. Isso ainda a gente vai ver em longo prazo”, enfatizou Sonntag.

Além do viés da segurança jurídica, de acordo com o especialista, a reforma trabalhista tem o viés político/judiciário, que era justamente para diminuir as demandas dentro da Justiça do Trabalho, e essa finalidade foi atendida. “Houve uma redução considerável no volume de novas ações na Justiça do Trabalho”, destacou.

Um aspecto positivo da reforma, de acordo com Sonntag foi a extinção das chamadas ações aventureiras. “Ainda que o trabalhador não tivesse razão, não havia qualquer problema em ajuizar uma ação. Essas ações aventureiras acabaram de vez, hoje, pois além de pagar os honorários, em caso de perda da ação, o trabalhador pode ser condenado por litigância de má-fé. Esse é um aspecto muito bom da reforma, porque dá uma credibilidade maior na Justiça do Trabalho, essas ações acabaram 100%”, enfatiza.

De acordo com o especialista em direito trabalhista, existe um terceiro aspecto que a reforma gerou, que é bastante negativo, que seria uma maior exposição do trabalhador, em relação aos riscos que ele corre no ambiente de trabalho. A reforma trabalhista trouxe uma menor interferência do estado e o trabalhador ficou um pouco mais exposto.

“Antes da reforma, uma mulher gestante, por exemplo, não poderia trabalhar em local insalubre, exposta à poluição, à sujeira. A partir da reforma, se a gestante tiver um atestado de médico, ela pode trabalhar em insalubridade de grau mínimo ou médio. O pensamento que se tem é que a gestante não faria isso, mas é claro que faz, porque uma insalubridade de grau médio, acrescenta 20% de aumento sobre o salário mínimo”, alerta.

Para o advogado, ainda existe um quarto reflexo gerado nesse um ano de reforma trabalhista. “Nós vemos de uma maneira bem incisiva, uma menor interferência do Estado nas relações entre particulares, o que, provavelmente estaria levando à extinção do Ministério do Trabalho, deixando a parte de geração de emprego e renda para o Ministério da Economia ou do Planejamento, o que seria um retrocesso”.

Sonntag ressalta que, em todo o mundo o Ministério do Trabalho tem sua importância. “O Ministério do Trabalho tem atribuição de fiscalização, de diretrizes, não só de emprego e renda, mas principalmente uma atribuição fiscalizatória. Tirando o Ministério do Trabalho você está tirando uma competência específica, deixando com que as superintendências regionais do Trabalho, por exemplo, fiquem sem um norte, sem uma diretriz anual perfeita, parando de fiscalizar relações de emprego, ações de empresas, danos morais coletivos, segurança no trabalho, que é um grande problema”, destaca.

O especialista também teme pela extinção da Justiça do Trabalho. “Há rumores em Brasília, de que existe a possiblidade de extinguir a Justiça do Trabalho até 2022, e para que essa extinção não ocorra, foi acionada uma PEC (Projeto de Emenda Constitucional) que busca levar à competência da Justiça do Trabalho para analisar questões previdenciárias, ou seja, tirar aquilo que se fala sobre regime de previdência, de INSS, da Justiça Federal e levar para a Justiça do Trabalho, abrindo o leque de atribuições”, completa.

Redução de processos judiciais foi o maior impacto

De acordo com o juiz do Trabalho, titular da 1ª Vara de Boa Vista, Gleydson Ney Silva de Rocha, o principal impacto da reforma trabalhista em Roraima foi a redução no número de processos. “Antigamente nós tínhamos uma média de 180 processos por mês e a média hoje é de 120 processos, então nós tivemos uma redução significativa, algo em torno de 30% a 40%.

“Um dos impactos da reforma nós chamamos de litigância responsável. No sistema anterior todo trabalhador que ingressava na Justiça do Trabalho com sua ação, ganhava ou não perdia, era um jogo que só havia vantagens, não existia nenhum risco. Hoje esse risco existe. Então, quando um trabalhador entra com uma ação, se não ganhar vai pagar honorários de sucumbência, que são os honorários que se paga para o advogado da parte contrária. Antigamente, por qualquer situação, se ingressava com uma ação, hoje não”, destaca.

Ainda de acordo com o magistrado, o sistema reduziu o que ele chama de “superproteção”. “Com as políticas de cotas é natural que o legislador vá moldando isso. Quando se atinge um patamar de conhecimento, de integração, de inserção, se reduz, não há mal nenhum em o legislador fazer isso”, falou.

Para o magistrado a reforma deu mais autonomia para negociação entre trabalhadores e empregadores, não partiu do pressuposto de que sempre o trabalhador é enganado. “No processo trabalhista houve um pouco isso, existia uma macro proteção que era importante nas décadas de 40, 50 e 60. Então o que se fez, tirou-se um pouco dessa proteção, isso o legislador pode fazer com razoabilidade e o fez agora com a reforma, então isso aconteceu para retirar um pouco essa situação desigual que havia”, disse.

Sindicato diz que reforma foi atentado contra a classe trabalhadora

O presidente do Sindicato dos Comerciários do Estado de Roraima, José Sipaúba da Silva (Foto: Nilzete Franco/Folha BV)

Para o presidente do Sindicato dos Comerciários do Estado de Roraima (Sinteco-RR), José Sipaúba da Silva, a reforma trabalhista é um “atentado” contra a classe trabalhadora no Brasil. “A reforma é um pacto criminoso que veio para retirar direitos conquistados com muita luta. As relações trabalhistas após as medidas ficaram extremamente fragilizadas, haja vista as grandes alterações aprovadas pela reforma a favor do setor patronal, como as flexibilizações de jornadas de trabalho entre outras”, declarou o sindicalista.

Com relação ao fim da contribuição sindical, o presidente do Sinteco afirma que sempre defendeu a livre contribuição. “Os trabalhadores devem contribuir livremente visando o fortalecimento do sindicato como instrumento de luta, mas essa contribuição tem que partir deles”, enfatiza.

O presidente do Sinteco destaca que a contribuição sindical que os trabalhadores eram obrigados a pagar, como se fosse um dia a mais de trabalho por ano, era rateada entre cinco instituições. “Esse imposto era dividido entre o Ministério do Trabalho e Emprego, centrais sindicais, confederações sindicais, federações sindicais e por último, os sindicatos”, ressalta.