Cotidiano

MPF pede que venda de minérios apreendidos seja revertida para indígenas

Órgão de controle recomenda que leilão seja feito o mais rápido possível, para garantir que os indígenas possam ser minimamente ressarcidos dos danos causados pelo garimpo ilegal

O Ministério Público Federal (MPF) recomendou que a Agência Nacional de Mineração (ANM) e a Fundação Nacional do Índio (Funai) garantam que o dinheiro arrecadado com o leilão de cassiterita em Roraima seja destinado a indígenas. O órgão cita que o material extraído de garimpo ilegal na Terra Indígena Yanomami vale R$ 25 milhões.

Procurada, a ANM limitou-se a dizer que “pauta as atividades institucionais na observância das leis e normativas constantes do ordenamento jurídico brasileiro”. A Funai não comentou a recomendação até a publicação da reportagem.

O pedido foi feita no último dia 10 e as instituições receberam dez dias para informar sobre as medidas adotadas. O MPF recomenda que a ANM faça o leilão o mais rápido possível e reverta os valores levantados de forma integral para a Funai (Fundação Nacional do Índio), para garantir que os indígenas possam ser minimamente ressarcidos dos danos causados pelo garimpo ilegal.

À Funai, o órgão de controle pede que aplique os recursos em ações, programas, aquisição, manutenção ou operação de equipamentos necessários para efetivação da desintrusão do território Yanomami e proteção da área após a retirada dos invasores. O MPF defende que a verba não seja usada para pagamento de pessoal ou outras despesas correntes.

O órgão determina ainda que o dinheiro seja aplicado com a participação da população indígena e em cooperação com outros órgãos competentes no combate aos crimes nas reservas. A Funai deverá ainda prestar contas às comunidades indígenas e ao MPF sobre a aplicação dos recursos.

A recomendação foi feita após o MPF receber informações de que a agência prepara um edital para se desfazer de cassiterita e outras substâncias minerais apreendidas em Roraima e que pretende receber os valores levantados com a venda. Por outro lado, o órgão de controle defende que isso representaria grave inversão de ônus dos crimes ocorridos.

O MPF argumenta que, caso o montante seja destinado à ANM, ele seja direcionado para os cofres federais e usado nos custeios administrativos. Na recomendação, a instituição afirma que a União vem contribuindo diretamente para a atividade ilegal, na medida em que descumpre o dever constitucional de proteção da terra indígena e tem desrespeitado ordens judiciais em que é obrigada a promover a retirada de invasores da Terra Indígena.

“Seria no mínimo contraditório que a União Federal fosse agraciada com o decreto de perdimento que, em última análise, resulta da incapacidade estatal de proteger e salvaguardar o território indígena, conforme, aliás, expressamente impõe o art. 231 da Constituição da República, de modo que não se pode admitir que o Estado brasileiro lucre com a tragédia enfrentada pelo povo Yanomami”, argumentam os procuradores signatários.

Garimpo ilegal

De janeiro de 2021 até agora, foram apreendidos mais de 200 mil quilos de cassiterita, substância usada amplamente na indústria. O minério tornou-se importante subproduto do garimpo em Roraima devido à sua fácil extração e alta demanda de mercado.

Segundo as investigações, o material foi retirado em sua grande parte da Terra Yanomami, área de 10 milhões de hectares situada em Roraima e Amazonas. Entre agosto de 2020 e fevereiro de 2022, houve mais de três mil alertas de garimpo na região, atingindo área de 10,86 quilômetros quadrados. Só em janeiro deste ano, foram 216 alertas de extração mineral.

A recomendação do MPF ressalta ainda que a Constituição Federal proíbe o garimpo em terras indígenas, salvo em casos especiais, e mesmo nesses casos, a população indígena deve ser beneficiada pela extração. Atualmente, em Roraima, toda atividade garimpeira é ilegal uma vez que não há lei que permita a exploração no Estado.

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