Cotidiano

Moradores pagam por vigilância privada nas ruas

Contratos com seguranças das ‘motinhas’ são verbais e não há garantia de serviço. Mas eles compram até medicamento de madrugada, se o cliente precisar

Eles começam circulando com motos pelas ruas do bairro durante a noite emitindo pequenas buzinas, depois passam a usar coletes de segurança e em seguida se apresentam aos moradores como vigilantes particulares. Estão espalhados em vários bairros de Boa Vista e cobram por um serviço clandestino de vigilância com motos e até carros equipadas com luzes giroflex e sons de patrulhamento. Estas pessoas se apresentam nas casas como seguranças das ‘motinhas’, como já está popularizado o serviço, oferecendo patrulhamento nas ruas e cobrando mensalidades que variam de R$ 70 a R$ 100. 

Entre os serviços propostos estão o de passar todas as noites várias vezes na rua, acompanhar pessoas do ponto de ônibus até a casa, comprar medicamentos e ajudar em emergências.  

A reportagem conversou com dois motoqueiros que informaram não poder dar detalhes do trabalho e forneceram telefone das empresas. A Folha tentou contato telefônico com as duas empresas que oferecem esse tipo de segurança se passando por cliente interessado na contratação do trabalho e soube que não existe contrato entre o morador e o segurança, além do fato de que o dinheiro deve ser pago diretamente a quem contrata. Apesar dessa situação estranha, alguns dos motoqueiros trabalham para empresas regularizadas na cidade.

A Folha conversou com moradores que já foram visitados pelos seguranças e fomos informados de que o contrato é apenas verbal e não há nada assinado entre o morador e a empresa prestadora do serviço. Um dos próprios motoqueiros passa recolhendo a mensalidade no dia combinado com o morador. Não há garantias de quantas vezes passa na rua e nem se o serviço será realmente executado. 

Sobre o tema, conversamos com dois moradores de Boa Vista. Um que aceitou a proposta e paga a mensalidade, e outro que não aceitou. Os dois apresentam visões diferentes sobre o mesmo tema.

Wenderson de Jesus é morador do bairro Pricumã e disse que se sente mais seguro depois que as motinhas passaram a atuar em seu bairro.

“O som da sirene nos dá uma sensação de segurança e acredito que iniba a ação de bandidos, já que depois que acabou o Ronda nos Bairros a bandidagem aumentou muito. Vale a pena pagar R$ 80 por mês”, disse.  

Já Michel Feitoza, morador do bairro Paraviana, disse que já passaram oferecendo os serviços, mas que não concordou. 

“Não vejo necessidade de pagar para ter a sensação de segurança, o que precisamos mesmo é de policiamento nas ruas e ter segurança de verdade, e não viver trancafiado em casa e não poder ir à praça do bairro”, disse. “Prefiro ter rum cachorro valente, colocar câmeras, cerca elétrica e concertina, para ter segurança”, afirmou. (R.R) 

Especialista afirma que criminalidade virou epidemia


Especialista em segurança pública, Carla Domingues  (Foto: Arquivo Folha)

Para falar sobre esse novo modelo de segurança privada em Boa Vista, conversamos com a especialista em segurança pública, Carla Domingues. Logo de início, ela estranhou o fato de as empresas não falarem sobre seu trabalho. 

“Se não quer falar é porque deve ter algo errado, ou não tem credencial para atuar no ramo de segurança privada. É fato que o setor que mais cresce no Estado é da segurança privada. Quer seja de contratação de seguranças, instalação de câmeras de vídeo, cerca elétrica e concertina nos muros das residências e comércios. Antes de falar sobre as motos que fazem a segurança nas ruas de Boa Vista é bom deixarmos claro que esse crescimento de mercado é o reflexo da falta de investimento na segurança pública, falta de efetivo aliado a problemas sociais e as indicações políticas que direcionam pessoas que não são técnicas a ocuparem cargos de extrema relevância na elaboração e execução de políticas públicas voltadas para a redução da criminalidade”, disse.

Em relação à eficácia ou não dos seguranças de moto que realizam o trabalho de segurança patrimonial, Carla Domingues disse que em algumas situações elas inibem pequenas infrações, como furtos e arrombamentos. 

“Entretanto, deixa o cidadão em situação de vulnerabilidade em situações de maior complexidade, como roubos cometidos com arma de fogo ou arma branca, por exemplo”, afirmou.

Carla Domingues lembrou que segurança pública é dever do Estado, cabendo a ele oferecer o policiamento preventivo e ostensivo. 

“Mas dada às circunstâncias atuais, infelizmente teremos que nos adaptar e dizer que a criminalidade virou uma epidemia, e, diante dessa afirmativa, o que fazer para me proteger? Evite andar por ruas com pouca iluminação, não abra o portão para desconhecidos, crie mecanismos de proteção entre seus vizinhos informando sobre seus horários, mude os trajetos que você faz para chegar a sua residência e dê uma volta no quarteirão antes de entrar em casa”, finalizou. (R.R)

 

O que saber para contratar vigilância para o seu bairro

Regularidade – É preciso verificar a regularidade da empresa antes da contratação. Verificar a situação legal junto à Polícia Federal e entidades de classe, como o Sindicato das Empresas de Segurança Privada.

Documentação – Os documentos que devem ser cobrados da empresa contratada são: certificado de segurança, autorização de funcionamento, alvará de revisão de autorização de funcionamento, certidões negativas de INSS, FGTS, impostos municipais, estaduais e federais, comprovante de recolhimento de contribuição sindical do exercício atual (GRCS).

Experiência – Pesquise o histórico da empresa, locais onde o serviço foi prestado, resultados obtidos e depoimentos de contratantes. Tudo para que a relação não azede após a contratação.

Estrutura – A frota de veículos, situação do fardamento, bases de apoio e rádios de comunicação, devem passar por renovação constante para que o serviço seja feito com eficiência.

Planejamento – Esteja atento ao planejamento que será oferecido pela empresa de segurança. Verifique se as ações propostas estão de acordo com a realidade do bairro e atende aos anseios da maioria comunidade.