Cotidiano

Cirurgias eletivas estão suspensas

Pacientes na fila para cirurgias ortopédicas também terão que aguardar a chegada de insumos

Devido à falta de materiais básicos para os cuidados de pacientes, tais como esparadrapos e insumos para procedimentos cirúrgicos, as cirurgias eletivas e ortopédicas do Hospital Geral de Roraima (HGR) estão suspensas por tempo indeterminado.

Quem confirma essa situação é a presidente do Conselho Regional de Medicina de Roraima (CRM-RR), que assumiu o posto no início de outubro, a pediatra Rosa Leal. Ela contou à equipe de reportagem da Folha que médicos estão sofrendo agressões, por serem apontados como culpados por essa situação.

“Nada foi feito após todas as fiscalizações que a última gestão fez. No momento, o HGR está realizando somente cirurgias de pronto-atendimento, pois essa é a única em que o médico deve se virar, não importando o tipo de material que tenha. Os recursos estão tão escassos que o paciente corre mais riscos de vida passando por uma cirurgia eletiva do que só tomando antibióticos. É unânime entre os médicos que não há mais como fazer cirurgias”, frisou.

Rosa Leal analisa que a troca constante de secretários de Saúde é um dos fatores que mais contribui para esse cenário, indicando uma desorganização administrativa pública. Ela também destacou que, apesar da falta de medicamentos, médicos se esforçam para pelo menos não saírem do trabalho com sintomas de depressão, em meio a toda a escassez.

“Enfrentamos muitas dificuldades, principalmente, porque estão tendo muitas mudanças na secretaria. Só na gestão anterior do CRM, de cinco anos, seis secretários assumiram a pasta. Isso dificulta bastante o nosso diálogo com a Sesau, pois com a troca de secretário e adjuntos, precisamos reiniciar toda uma negociação que tivemos com o último gestor. No mais, sempre tentamos oferecer um atendimento digno e humano, pois a falta de materiais está praticamente impossibilitando nosso trabalho e muitos médicos estão sofrendo psicologicamente com isso”, contou.

No fim das contas, quem acaba sofrendo mais por esse cenário são os próprios pacientes e seus parentes, que relatam situações dramáticas dentro do HGR. Lisiane da Silva Santos, que sofreu um acidente de moto na tarde de sábado, 13, está internada na unidade, e continua esperando por uma cirurgia ortopédica para o braço e a perna.

“Os médicos foram bem transparentes comigo sobre isso. Disseram que, no momento, não poderiam realizar a cirurgia na minha perna e no meu braço, por pura falta de equipamento. Eu tô tomando somente dipirona e um antibiótico, o que diminui a dor, mas ainda me coloca em situação de risco. Vejo que os médicos estão bem abalados com tudo isso, pois eles deixam claro que trabalhariam se tivessem os materiais necessários. Quase não dá para fazer exames aqui e eu tive que comprar o esparadrapo que estou usando”, afirmou.

Um caso semelhante, relatado por Gideone Santos Lima, que está acompanhando a esposa, Rosana Marques, internada no HGR há dois meses por lúpus, demonstra a falta de medicamentos na unidade. Ele contou que foi informado pelo médico que está acompanhando a esposa que as medicações necessárias para o tratamento da doença estão esgotadas.

“Pessoas estão morrendo todos os dias no HGR por causa desse descaso. O estado de saúde da minha mulher vem piorando muito nos últimos dias, e o médico conversou comigo, no sábado, dizendo que não haveria mais como dar as medicações necessárias. Agora estou tentando ver se encontro o remédio em Manaus, pois o medicamento não é vendido em Roraima”, relatou.

A vítima de uma tentativa de homicídio no domingo, 14, no bairro Equatorial, Maycon Douglas da Silva, de 22 anos, também está internado no HGR, e sua mãe, Dulcineia Severiana da Silva, contou para a equipe de reportagem que até mesmo as vítimas da violência urbana estão sofrendo na espera por cirurgias que foram suspensas.

“Ele foi cirurgiado de forma emergencial domingo à noite, com a reconstrução de uma veia na parte pélvica. Entretanto, ainda há uma bala alojada na cabeça dele. E os médicos dizem que precisaremos aguardar para que uma cirurgia seja marcada. Nós olhamos o hospital, e vimos que está faltando praticamente tudo, então dá até para entender porque está impossível conseguir uma cirurgia”, contou.

Compra de insumos não acompanha alta demanda de imigrantes, diz Sesau

A Secretaria Estadual de Saúde (Sesau) informou, por meio de nota, que vem envidando todos os esforços para garantir atendimento de saúde humanizado e com qualidade, com o aumento de recursos que passou de 12% para 18% na atual gestão. Entretanto, destacou que a crise migratória é o principal motivo dos atuais entraves em relação a materiais no Hospital Geral de Roraima (HGR).

“O número de atendimentos a estrangeiros cresceu mais de 6.500%. É uma situação atípica, que nenhum governo, no Brasil ou no mundo, está preparado para suportar financeiramente. A saúde não dispõe mais de orçamento para custear esse acréscimo em relação ao crescente número de atendimentos de imigrantes. Inúmeros pedidos de auxílio foram enviados ao Governo Federal, todos negados”, afirmou.

A Sesau também informou que a aquisição dos materiais para realização de cirurgias, tanto eletivas quanto de emergência, é feita de maneira contínua. Ressaltou que a direção do HGR faz o possível para dar celeridade à marcação e realização das cirurgias, mas devido à demanda muito alta, principalmente pelo grande número de venezuelanos atendidos na unidade, a realização desses procedimentos leva certo tempo.

“O agendamento de cirurgias eletivas segue os critérios da Fila Única, preconizados pelo Ministério da Saúde, em que é verificada a classificação do paciente, conforme a prioridade, para posterior encaminhamento para agendamento do procedimento”, reforçou. (P.B)