Polícia

Mandante de chacina teria sido uma garota

Áudios revelam preparação do crime

Na manhã de ontem, dia 05, a reportagem da Folha teve acesso a uma grande quantidade de áudios que revelam conversas entre membros de uma facção criminosa que estariam planejando a morte de apenas um dos jovens. O teor dos áudios discorre sobre um suposto envolvimento amoroso entre uma jovem da facção com um dos irmãos, que seria, segundo as conversas, rival.

No primeiro áudio, a jovem diz: “Bom dia e um abraço a todos os “irmãos” [companheiros de crime]. É o seguinte: Esse Neto aí faz um tempão que esse bicho vem me perturbando, só que daí minha cunhada viu a foto dele e disse para mim que ele era safado. Ela pediu para eu teclar com ele para saber onde era a casa dele e tudo mais. Só que eu comecei a dar em cima dele, ele me disse onde mora, só que estou pedindo ajuda dos irmãos para ir na casa dele, na esquina dele. Estou batendo a transparência aí para vocês”, informou.

A jovem complementa dizendo que “lixo”, termo usado para se referir aos rivais, vai para o “sal” (morre) e que os irmãos de facção iriam com ela na casa do jovem, onde iriam “meter marcha”, ou seja, realizar a execução juntos e “derrubar o lixo safado”. “Eu fiz a mente dele mesmo para ele cair na minha”, revelou a suspeita, demonstrando raiva do rapaz.

Um print feito da tela do celular que possivelmente seja da vítima, mostra uma conversa que o jovem teve com a suposta arquiteta do crime. Na ocasião, ela diz, “Salva aí, já mandei tuas conversas também. Vou falar mais nada não. Seu bode [risos]”. Já a vítima teria respondido: “Beleza, vamos ver quem tem mais moral”, encerra a conversa. 

Os “irmãos” no crime acrescentam a fala da jovem e um deles diz: “Vamos meter macha nesse lixo safado, entendeu? Não pode ficar ‘moscando’ [dando bobeira] com ele. Se nós não derrubar ele, ele derruba nós”.

Há quem não gostou do fato da jovem ter se comunicado com alguém que supostamente fosse rival. “Cadê a danadinha para bater a transparência para nós. Quais as ideias mesmo hein?”. Uma outra suspeita cobra resposta da jovem. “Ei, responde aí. Ela está falando e você não respondeu ela”, instigou.

Chateada com a situação, a jovem chegou a sair do grupo, o que fez com que a desconfiança aumentasse: “Se ela não deve, não teme. Por que ela saiu do grupo? Ela ciscou [está arisca]. Essas ideias estão muito tortas. Se ela tiver com ideias para cima de vocês, meus irmãos, é sal e coloral nela. Se for gata de “lixo”, é lixo também. Tá ciente da parada. Tá louca? Essa besta pagando de Noiola [com esperteza]. Desde a manhã estou ouvindo essas histórias aí. Se ela for… na moral, é sal”, enfatizou.

Uma outra garota afirma que a jovem já se contradisse em sua fala, quando afirmou não saber o nome da rua, mas sabia onde era a casa da vítima porque já tinha ido por lá. “Pois é, eu achei estranho. Ela mandou um áudio que ele [vítima] falando assim: ‘tá com saudade de mim?’, então, no caso, eles já se viram. Eu achei a caminhada torta por causa desse áudio. Se ela for… sal e coloral”, frisou.

Depois do clima ficar tenso no grupo dos membros da facção, a suposta mandante do crime grava um novo áudio, dessa vez chorando e pedindo que os “parceiros” ouvissem os áudios. “Não é assim não, tem que ouvir primeiro para depois falar. Aqui é caminhada certa [fiel ao grupo], nunca colei com lixo, até porque tenho dois irmãos batizados. Tu tá doido é?”, finalizou.

Uma outra jovem pede o comparecimento do bando na sua “numeral” [casa] para esclarecer os fatos porque estava impaciente e se fosse preciso fazer “condução” estava pronta.

Alguns indivíduos defenderam a jovem, dizendo que todos estavam na mesma caminhada e que ninguém deveria acusá-la porque estavam na pista, não brincavam de ser PCC (Primeiro Comando da Capital). “Eles não estão brincando de ser CV [Comando Vermelho]. Eles metem marcha. Se nós não meter marcha, vamos pegar marcha. Antes a mãe deles sofrer do que a nossa”, disse.

Áudios apontam que apenas um dos jovens era alvo da facção rival

Um dos elementos grava um áudio explicando que já estava com a ferramenta [arma], mas não tinha carroça [carro] para levá-los à casa das vítimas. A demora para matar o jovem deixou a suposta mandante chateada. “Por isso que ela está com raiva. Ela fala: ‘Os irmãos não me ajudam. Ela pensa que é assim, de um dia para o outro. Nós já sabe que ele [a vítima] é segurança, que tem um ferro e que é CV mesmo. Nós vamos atrás dele. Já foi decretado. Já foi dado na linha, nós três e já era mano, é sal e coloral. Só que ela quer que seja agora, porque ele está ameaçando”, revelou.

Em dois áudios um jovem, que supostamente seja a vítima, diz que a garota poderia ir até a casa dele porque estaria esperando. Em seguida, ele diz que está na esquina, esperando pelos rivais. “Toma cuidado tu, tio. Toma cuidado você, mano. Manda eles viram aqui, fica só ameaçando, fazendo “zuada” [barulho] e não faz nada. Cadê, eu tô aqui. Tu não sabe onde eu moro? Vem aqui, tu e teus parceiros, vamos trocar uma ideia aqui no meu portão”. Depois, no segundo áudio afrontra: “Quer foto, quer bebezinha? Tá com saudade? Estou aqui na avenida”, respondeu.

Em outro momento, o suposto executor informa aos demais que estava aguardando o carro de um “irmão”, que é albergado no CPP [Centro de Progressão Penitenciária] porque não teriam como ir andado para invadir a casa. “O irmão tem que ir às 8h para o CPP, onde fica de albergue, aí essa missão não vai ser para hoje, vai ser para amanhã. Nós somos espertos. Nós mata ele e pega a arma dele. Aí o crime vai render. Já é uma ferramenta a mais para a família”, ressaltou.

Num último áudio, os suspeitos conversam sobre a conclusão do crime. “E aí, como ficou a situação dessa caminhada? Foi tudo resolvido? não rolou nada na “sintonia” [trabalho em equipe]? O “irmão” mandou mensagem dizendo que já foi resolvido, que foi para a “sintonia” e o CV vai perder a cabeça. Só isso que eu sei”, finalizou. 

O caso está sendo investigado pela Delegacia Geral de Homicídios (DGH). A Folha suprimiu algumas informações para não atrapalhar a investigação policial. Até o fim da tarde de ontem, dia 5, nenhum suspeito do crime tinha sido preso. (J.B)