Política

Linhão deve gerar desmatamento equivalente a 250 campos de futebol

Indígenas permitiram que a obra passe pela terra indígena, mas com a condição de que os danos sociais e ambientais sejam compensados

Após uma exaustiva negociação, o povo Waimiri-Atroari – ou kinja, como se autodenominam –  finalmente autorizou a passagem do Linhão de Tucuruí pelos 123 quilômetros que cortam a terra indígena. Embora busque o desenvolvimento do Estado, a obra deve trazer fortes impactos para as 2.331 pessoas que vivem na região.

Entre os impactos está o desmatamento equivalente ao tamanho de um campo de futebol ao redor de cada uma das 250 torres que passarão pela região. 

São 37 impactos no total, dos quais 27 são considerados irreversíveis e que deverão ser compensadas financeiramente, em um montante ainda inferior ao que se gasta atualmente com a produção de energia termelétrica, como explicou o procurador de Justiça, Edson Damas, única autoridade estadual que participou da reunião final, ocorrida na última quarta-feira (11). 


Procurador de Justiça, Edson Damas, participou de reunião decisiva dos Waimiri-Atroari sobre o Linhão de Tucuruí (Foto: Arquivo Folha)

Em entrevista ao programa Agenda da Semana, da Rádio Folha– FM 100.3, apresentado pelo economista Getúlio Cruz, Edson Damas explicou que a reunião envolveu aproximadamente mil indígenas, quase metade da população da comunidade, e foi marcada pelo esgotamento emocional dos indígenas, dada de tanta pressão que receberam.

“Durante a reunião, eles disseram ‘já que o Estado decidiu que vai fazer [a obra] sem nos ouvir, agora que a gente entendeu os impactos, vocês reconhecem que haverá esse impacto, então nós queremos que vocês nos compensem’”, explicou o procurador. 

O valor solicitado não foi informado, mas segundo o procurador, a estimativa é baseada em parâmetros do Ibama, e deve ser diluído no decorrer de 20 anos. Damas explicou que este montante será investido no desenvolvimento da região, que atualmente é totalmente autossustentável. 

“Eles têm uma associação que emprega quase 60 pessoas, cuidam da vigilância e proteção territorial, saúde, educação, segurança. Lá não há distribuição de cesta básica, nenhuma aposentadoria, não há um centavo de dinheiro público para bancar saúde e educação deles. Eles arcam com todos estes custos. É um povo que não dá despesa para o estado brasileiro”, defendeu.

Por outro lado, a estimativa é que com a construção do Linhão de Tucuruí, que vai interligar Roraima ao Sistema Interligado Nacional, o Brasil deixe de gastar cerca de R$ 1,2 bilhão ao ano com óleo diesel, que atualmente sustenta as termelétricas no Estado. Esse valor é diluído em todas as contas de energia elétrica de brasileiros.

O procurador concluiu que agora o Linhão de Tucuruí só não sai se o governo federal não cumprir a parte dele. “Os índios cumpriram aquilo que prometeram, e agora, a mesma e agilidade e pressa que foi cobrada deles tem que ter por parte do Executivo federal e dos nossos políticos para resolver”. 

Funai foi excluída das discussões

A reunião teve a participação de representantes dos ministérios da Economia, Minas e Energia, Direitos Humanos, Ibama, Universidade Federal de Roraima (UFRR) e Ministério Público Estadual e Federal. 

A Funai (Fundação Nacional do Índio) foi deliberadamente excluída destas discussões.

“Foi a primeira vez que eu vi e presenciei a participação das mulheres. Tanto que eles quebraram uma regra cultural e permitiram até mesmo a fala de uma mulher indígena, para se ter uma ideia da importância desse momento”, exemplificou o procurador.