Cotidiano

Tribunal de Justiça realiza semana para tratar sobre violência contra a mulher

Ação tem foco em dar celeridade aos processos e aumentar o debate sobre o tema na sociedade

No mês em que se comemora 12 anos da sanção da Lei nº 11.340/2006, mais conhecida como Lei Maria da Penha, o Tribunal de Justiça de Roraima realiza a 11ª Semana da Justiça Pela Paz Em Casa, durante os dias 20 a 24 de agosto, com o objetivo de dar celeridade aos processos de violência doméstica e familiar, além de medidas voltadas à conscientização sobre a violência contra a mulher na sociedade roraimense.

A ação é uma colaboração entre a Coordenadoria Estadual da Mulher Em Situação de Violência Doméstica e Familiar e dos Juizados de Violência Doméstica, além de todas as Comarcas do Estado. Dentre os processos que serão revisados pelo Poder Judiciário, estão os julgamentos de sentenças, audiências e decisões durante a semana. Nesta edição, que é a segunda do ano, o foco será o feminicídio.

Conforme explicou a juíza do 1º Juizado de Violência Doméstica da Comarca de Boa Vista, Maria Aparecida Cury, todos os crimes cometidos contra as mulheres roraimenses são preocupantes, mas o feminicídio é ainda mais agravante porque retrata a morte de mulheres pelos seus companheiros ou ex-companheiros por motivos que não se justificam, como o sentimento de posse sob a mulher. 

“Mulher não é objeto que alguém possui. As mulheres têm o livre arbítrio. Aquele homem que é tóxico para aquela mulher, e passam a ter uma relação doentia, ela tem o direito de dizer ‘não’ e o homem tem que aceitar, não tem que matar a mulher por conta disso”, disse. Maria completou ainda dizendo que os números de feminicídio no Estado ainda não são tão altos como no restante do país, mas que é preciso manter a atenção.

Os dados disponibilizados pelo juizado mostram que atualmente tem uma média de 16 processos ativos de feminicídio no Tribunal de Justiça de Roraima. Em relação à Patrulha Maria da Penha, um projeto em parceria com a Prefeitura de Boa Vista que acompanha mulheres que receberam medidas protetivas, somente em 2018, já foram 355 casos. Desses, 134 são mulheres entre 20 a 29 anos, onde 301 foram na zona Oeste.

Sobre os tipos de agressão relatados pelos dados da Patrulha, a somatória dos números é superior ao número de casos, causando certa incoerência. Foram 272 casos de violência psicológica; 167 de agressão moral; 155 de violência física; já violência patrimonial foram 56 casos; e de violência sexual foram apenas quatro, totalizando 654.

A reportagem entrou em contato com a Polícia Civil solicitando dados de crimes cometidos contra a mulher no Estado e não conseguiu retorno após mais de uma semana do pedido. 

ENVOLVIMENTO EM CRIMES – A juíza também apontou que os casos de mulheres envolvidas em crimes de tráfico de drogas e organizações criminosas também estão dentro dessa realidade, o que mostra a necessidade de diferenciar o feminicídio de um homicídio. 

“Eu não estou dizendo que os homens não matam as mulheres em Roraima por feminicídio, nem que os homens não praticam violência doméstica contra a mulher, praticam e muito. Só que temos que fazer essa distinção, o que é feminicídio e o que é uma morte de mulher por outros motivos. Inclusive saber: essa mulher se envolveu em facções criminosas por causa do companheiro? É uma pergunta a ser feita”, ressaltou.

PROGRAMAÇÃO – Durante a Semana da Justiça da Paz Em Casa, as ações começam na segunda-feira, 20, com o lançamento de concurso para alunos do curso de Publicidade e Propaganda, onde o material vencedor será utilizado na próxima Semana, que ocorre em novembro deste ano. A ideia do concurso é focar nos homens, principalmente os agressores, para que haja a conscientização sobre violência contra a mulher.

Na terça-feira, 21, será feita uma ação na Cadeia Pública Feminina com a Vara de Execuções de Penas (VESP) para fazer a inspeção mensal do presídio e levar a Caravana da Saúde para as mulheres da unidade. Além de panfletagem e conversas sobre o tema.

Na quarta-feira, 22, será realizado o Projeto Maria Vai à Escola, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação, onde será ministrada aula sobre a temática, focando na igualdade de gêneros e direitos humanos. 14 escolas já receberam o programa, com 1.700 alunos trabalhados.

A programação segue na quinta-feira, 23, com a assinatura de renovação do termo de cooperação entre o Tribunal de Justiça e o município de Boa Vista para o trabalho da Patrulha Maria da Penha. Por fim, a semana encerra com atividades na sexta-feira, 24, com trabalhos no município do Bonfim, onde a Comarca tem um número significativo de processos de violência doméstica. Haverá também roda de conversas com as mulheres sobre esclarecimentos acerca do assunto.

Juíza acredita que educação precoce é o caminho para conscientização

Visando aumentar o debate relacionados à violência contra a mulher e violência doméstica e familiar, a juíza do 1º Juizado de Violência Doméstica da Comarca de Boa Vista, Maria Aparecida Cury, acredita que a educação das crianças é o meio para mudança de pensamentos na sociedade brasileira.

“Como vamos mudar essa face feia do nosso país, essa cultura machista e preconceituosa – porque não morre só as mulheres, morrem os negros, os homossexuais -? Pela educação. Não tem outro caminho”.

Além disso, a juíza acredita que é necessário dar mais efetividade a aplicação da Lei Maria da Penha, pois é uma das melhores leis em combate à violência contra a mulher, mas a mudança de pensamento é necessária.

“A sociedade precisa entender que violência contra a mulher é uma violência contra os direitos humanos. É um problema da sociedade, não é da mulher, então a sociedade brasileira precisa parar com esse jargão de que ‘em briga de marido e mulher, ninguém mete a colher’, mete sim. Nós sempre encontramos meios para justificar as ações dos homens e imputar culpas às mulheres, que na verdade são as vítimas”, finalizou. (A.P.L)