Walber Aguiar*
Quem vive da busca não morre
…vai garimpar estrelas… Drummond
Estava ali, no escritório, conversando com o meu amigo causídico, Marco Pinheiro. Mas não era um longo diálogo, como breve a vida. Geralmente, nossas conversas eram curtas. Só nos demorávamos um pouco mais quando o assunto descambava pra poesia e música. Principalmente, se o lúdico percorresse os caminhos da música de Gonzaguinha e Cartola.
Conversávamos amenidades. Coisas do cotidiano, da vida, dos dias apressados. De vez em quando um poema era solto no ar. Uma pausa para o lírico, romântico, poético, ainda que as letras jurídicas nos perseguissem, como de costume. Um romance criminal, um caso tenebroso, o desejo de trabalhar para os mais pobres, embora o direito/ advocacia fosse a ferramenta do dinheiro, o meio usado para capitanear os recursos necessários ao existir.
Não conheci pessoalmente seu Antônio Pinheiro de Oliveira nem dona Francisca da Silva Pinheiro. Mesmo assim, Marco foi a grande somatização dessa gente boa, uma semente germinada nesse tempo árido, num universo frio, mudo e assustador.
Um dia ele me falou de seu pai, antigo e brilhante advogado de Manaus, do Estado do Amazonas. Também foi trazido à memória, um dos maiores advogados da pátria das águas, o Dr. Caio Fábio de Araújo, por mim conhecido como “velhinho da fé”. O homem que deixaria a seara jurídica e mergulharia de cabeça na grandeza da fé e na pregação do evangelho de Jesus.
Naquele tempo, na antiga Manaus, os dois grandes juristas, viram seus filhos fazerem parte da geração dourada, com suas motos barulhentas, seus tamancos, seu estilo hippie, suas lutas praticadas nas ruas, praças e avenidas.
Marco fez parte da geração dourada, mas, um dia foi apresentado ao direito. Já o Caio Filho saltou vertiginosamente na misteriosa e estranhamente deliciosa direção de Deus. Uma de nossas últimas conversas girou no sentido da ética e da espiritualidade. Do “ethos”, da cobertura, do telhado que encobria a casa individual, que emprestava caráter ao cidadão, ao homem que não precisava fazer parte da maioria moral, de uma média ponderada, para ser visto pelos homens.
Marco Antônio, um nome de imperador. De gente séria, augusta, livre , soberana. Gente que, apesar de carregar todo esse acervo de vida no nome, tinha tempo pra cantar, servir, gargalhar e desfraldar toda sua humildade.
Naquela manhã ele fez uma foto e nos despedimos. Depois nos veríamos, para tratar de todas as coisas do coração, da lei e do cotidiano. Para rir das piadas do Guedes, do Públio e Samuel Moraes, do punk, das tiradas da Gláucia e de tantos outros.
Marco vivia pra lá e pra cá com sua Dani, com sua menina Julia. Os outros filhos eu não conheci. Mas, conheci o “Dude”, Márcio, uma figura cômica e interessante, seu irmão.
Não, não vai ter como não chorar. Afinal, não somos tão duros quanto parecemos. Ainda mais, se a brincadeira de Marco um dia nos alcançou.
Vá em paz, mano. Um dia nos encontraremos debaixo das frondosas mangueiras do infinito, sob os campos de morango da eternidade…. e não haverá nem grito, nem pranto, nem dor….
*Advogado, poeta, historiador, professor de filosofia, membro do Conselho de Cultura e membro da Academia Roraimense de letras.