Com Donald Trump de volta à presidência dos Estados Unidos, o cenário econômico mundial entra novamente em rota de instabilidade. Conhecido por seu perfil protecionista e por decisões geopolíticas imprevisíveis, Trump reassume o cargo com a promessa de colocar os interesses dos Estados Unidos acima de qualquer acordo internacional. Esse reposicionamento da maior potência econômica do planeta tem impacto direto sobre o comércio global, os investimentos e as decisões dos bancos centrais ao redor do mundo. A desaceleração econômica mundial, que pode ser intensificada por medidas unilaterais da nova gestão americana, tem efeitos relevantes sobre dois indicadores centrais da economia: a inflação e os juros.
Em condições normais, uma desaceleração econômica global tende a aliviar as pressões inflacionárias. Com menor demanda por bens, serviços e matérias-primas, os preços tendem a recuar ou, ao menos, estabilizar. No entanto, quando essa desaceleração é causada por choques externos — como guerras comerciais, aumento de tarifas, sanções econômicas ou ruptura de cadeias produtivas — o resultado pode ser o oposto do esperado: uma inflação de custos. Em vez de refletir um mercado menos aquecido, os aumentos de preços passam a ser consequência da dificuldade em produzir, importar ou distribuir mercadorias de forma eficiente. Esse tipo de inflação, combinada com crescimento estagnado, é extremamente desafiador para qualquer governo, pois reduz o poder de compra das famílias ao mesmo tempo em que desestimula investimentos.
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Nesse contexto, a política de juros também entra em uma zona de incerteza. Normalmente, bancos centrais reduzem os juros para estimular o consumo e o investimento em tempos de baixa atividade econômica. Contudo, quando há risco de inflação provocada por fatores externos, os cortes de juros se tornam arriscados. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve pode se ver pressionado a manter os juros elevados mesmo com sinais de enfraquecimento da economia. Já na Europa e em países emergentes, como o Brasil, os efeitos são ainda mais sensíveis. A instabilidade global, provocada por um ambiente político e comercial imprevisível, pode levar a uma fuga de capitais em direção a ativos considerados mais seguros, como os títulos do Tesouro americano. Isso pressiona as moedas locais, como o real, e obriga os bancos centrais a manter juros altos para conter a desvalorização cambial e segurar a inflação.
Para o Brasil, os impactos da nova gestão Trump são duplos. De um lado, o país pode se beneficiar de um realinhamento comercial, especialmente com o endurecimento das relações entre Estados Unidos e China. Por outro lado, a volatilidade dos mercados e a desaceleração global tendem a reduzir os preços das commodities, afetando diretamente as exportações brasileiras. Ao mesmo tempo, a necessidade de preservar a atratividade do país diante dos investidores internacionais pode exigir juros mais altos por mais tempo, mesmo com uma economia doméstica fragilizada.
A nova fase da política americana exige atenção redobrada. Não se trata apenas de uma mudança na liderança dos Estados Unidos, mas de uma inflexão no modelo de governança econômica global. A volta de Trump impõe ao mundo um ambiente de menor previsibilidade, o que dificulta o planejamento de políticas públicas e privadas. Diante disso, é essencial que os países, especialmente os emergentes, adotem estratégias que aumentem sua resiliência, reforcem sua competitividade interna e preparem-se para um ciclo de juros globalmente elevados, inflação instável e crescimento mais lento. O mundo mudou, e o Brasil precisa estar preparado para os desafios que virão.
Jerônimo Goergen
Presidente do Instituto Liberdade Econômica