OPINIÃO

Eleições e a perigosa verdade baseada no autor e não nos fatos

A verdade baseada no autor e não nos fatos

Estamos na ante-sala de uma nova eleição, e as eleições municipais têm características próprias. Há quem odeie e quem ame esse momento, justamente por ser mais passional, contando voto a voto para a maioria dos cargos que estarão à disposição para aqueles que se encontram na corrida eleitoral. Sendo um terreno fértil para as conhecidas fake news, tendo em vista que, para alguns, a verdade é relativa, e hoje a aceitação de uma “história”, por mais inverídica e absurda que possa ser, está mais ligada ao autor da informação do que aos fatos em si, como se a verdade fosse encontrada apenas na voz de determinados arautos.

Imaginem um médico, conhecido por militar politicamente e com grande número de seguidores, passasse a orientar o consumo diário de gasolina, logo de manhã junto ao desjejum, alegando que faz bem à saúde. Ele poderia afirmar que essa maravilhosa descoberta não está sendo divulgada nos jornais e revistas porque a indústria farmacêutica quer esconder a verdade da população. Alguns diriam: “Imagina, se com um litro de gasolina sendo consumido diariamente, os problemas de saúde da nação iriam acabar, junto com as vendas de remédios”.

Não seria surpreendente ver postos de combustíveis lotados de pessoas sedentas pelo milagroso líquido, fazendo uso diário dele e relatando para amigos e familiares os benefícios que o consumo de gasolina no café da manhã trouxe para suas vidas. O que alguns chamam de verdade não é mais buscado nos fatos, mas sim no autor que a profere. Muitas vezes, as pessoas possuem um pensamento egocêntrico, “se ele pensa como eu, esse cara é inteligente e honesto e deve estar munido da verdade”.

E vai se criando no imaginário popular a ideia de que discordar da palavra do médico e de sua inovadora descoberta significa ou não ter caráter ou não possuir o discernimento e o cognitivo necessário para compreender a magnitude da nova descoberta. Temos aí a verdade baseada no autor e não nos fatos.

Quando falamos em eleições, especialmente em tempos de aplicativos de conversa e redes sociais, em que as desinformações são rapidamente propagadas, o perigo se torna ainda mais evidente. Essas mentiras chegam a um ponto tão perigoso que têm o poder de corroer o Estado Democrático de Direito.

Aquelas pessoas que são ludibriadas por mentirosos travestidos de homens bem-intencionados devem ser moralmente absolvidas das críticas, diferente de quem faz uso da mentira para ganhos pessoais.

Daniel Zalewski Cavalcanti, professor e advogado do Núcleo de Práticas Jurídicas da Faculdade Estácio

[email protected]