OPINIÃO

Em busca da outra metade

Walber Aguiar*

Porque a vida só se dá pra quem se deu, pra quem amou, pra quem chorou, pra quem sofreu…                                             Vinicius

Era junho. Inverno de insetos e fecundações, de desejos reprimidos e comunhão de afetos, de aventuras conjugais e ilusões necessárias. Ali, entre a sobriedade da dor e a loucura do sentimento, brotou da lama das chuvas, a intensa vontade de partilhar, de criar vínculos, de entender a felicidade do ponto de vista do jugo, da parceria, do homem enquanto ser gregário.

Condenado a ter esperança, surgia agora uma alternativa. Isso porque, confrontado com a ótica divina da conjugalidade, ao homem restava apenas a felicidade a dois, a tentativa de fundir as vontades, o desejo de caminhar e olhar na mesma direção.

Ora, sob a dimensão e a realidade da queda, o que era sólido tornou-se esboroável, o que se afigurava como eterno, relativizou-se diante da dúvida, das angústias e da complexidade conjugal. Nesse tempo de hermeticidade do sentimento, não há mais a inocência em relação ao mal; advindo daí o ciúme, a inveja, a cobiça, as relações por interesse.

Assim, nesse tempo das flores vermelhas da paixão e das flores amarelas do medo, da busca desesperada pelo complemento afetivo, há uma necessidade premente de se ver e se perceber como uma espécie de náufrago do afeto, onde seguir sozinho é uma possibilidade.

A partir daí nos deparamos com as paixões de Vinicius de Morais e seu essencial existencialismo do “mas que seja infinito enquanto dure”. Por outro lado, Mário Quintana optou pela solidão, pela ruminância das horas silenciosas, à semelhança de Carlos Drummond de Andrade.  Dizia ele que as mulheres são seres complicados.

O que fazer com o casamento, a união estável, a proposta divina, a família como ideia de Deus? O “pra sempre” foi relativizado na poeira dos dias apressados, da desconfiança, da incompatibilidade de gênios, do cansaço relacional, quase sempre desgastado pela sufocante poeira do cotidiano sem aventura.

Era inverno. Tempo de solidão, de imaginação fertilizada pelo desejo de amar e ser amado; ou de, simplesmente, amar a si mesmo, incondicionalmente, lançando um novo olhar sobre a felicidade desacompanhada.

Estaríamos preparados para amar individualmente, para estimar nossa vida em solitude, essa inquietante filosofia do afeto?

*Advogado, poeta, professor de filosofia, historiador e membro da Academia Roraimense de Letras

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