Vou primeiro voltar no tempo para depois chegar no lugar onde vivo hoje. Quando eu tinha 10 anos, era muito feliz, em meu país, a Venezuela. As memórias da minha infância são pequenos tesouros escondidos no meu coração, principalmente o aconchego familiar e as brincadeiras de criança. As ruas de Puerto La Cruz eram mui belas, e a nossa cultura mui rica, ainda é, mas um dia tivemos que deixar tudo para traz, foi a única saída que meus pais encontraram para fugirem da crise que instaurou no nosso país.
Antes de virmos ao Brasil, vivíamos uma vida confortável e próspera, nossa família desfrutava de uma situação financeira estável que nos permitia um certo conforto e pensávamos num futuro promissor. No entanto, tivemos que deixar tudo e viemos morar em Boa Vista, Roraima, onde tudo mudou. As mudanças na minha vida trouxeram desafios e uma sensação ruim de perda. De repente, as ruas que eram familiares para mim, deram lugar a um novo cenário desconhecido, onde as barreiras da língua e da cultura se erguiam como obstáculo que eu e minha família precisávamos vencer.
Com o tempo fui me adaptando e conhecendo as ruas e os lugares da cidade. E de tanto andar nas ruas de Boa Vista, comecei a ver muitas comidas e produtos venezuelanos, e cada vez que eu podia comprar uma comida típica do meu país, eu fechava os olhos e me transportava de volta para lá, para ruas de Puerto La Cruz. O sabor das arepas reavivava minhas memórias de almoços em família e a música animada.
A vontade de estar na Venezuela dói dentro do peito, enquanto eu luto todos os dias para me acostumar com essa nova realidade. A incerteza do futuro e a sensação de não pertencer a nenhum lugar é dolorida. As lágrimas, agora, se misturam com a busca por um senso de pertencimento. Sou venezuelano em Boa Vista, ou é Boa Vista que precisa estar em mim? Difícil, não é mesmo?
Mas paro um momento e penso, preciso ser forte e resistente, porque só assim eu vou conseguir mudar a minha história. Assim, sigo andando nas ruas de Boa Vista, construindo novas memórias do lugar onde vivo. E mesmo diante das dificuldades que enfrento e ainda enfrentarei, crio coragem para abraçar o presente e sonhar com um futuro melhor e quem sabe voltar ao meu país, a minha cultura e porque também não dizer, ao meu idioma.
Raiber Alexander Rangel, aluno da 3ª série do Ensino Médio do Colégio Militarizado Professor Camilo Dias.
(Educação Linguística guiada pela Sequência didática do Caderno do Docente “A ocasião faz o escritor”, do gênero crônica da OLP, com a temática “O lugar onde vivo”.)