OPINIÃO

O homem que tocava – 

Walber Aguiar*

A minha gente sofrida despediu-se da dor, pra ver a banda passar, cantando coisas de amor.                      Nara Leão

Estavam todos no coreto, provavelmente falando dos arrepios que a furiosa proporcionava. Também conhecida como quebra resguardo, pela intensidade e grande poder de emocionar, levantar a moral e mexer com as circunstâncias da vida e da morte.

Traziam à memória a morte de muitos músicos, inclusive a do velho lobo, seu Genésio, como era chamado por Raimundo Nonato da Conceição, o canguru.

Ele estava ali, inerte, sem vida, com um estranho sorriso nos lábios. Seu Genésio morreu sem sofrer, viveu como bem entendeu viver e amou a todos que cruzaram seu caminho, inclusive o inesquecível Dorval de Magalhães, aquele que tinha enorme admiração por meu pai. Aquele que dizia que se todos fossem Genésios, não precisaríamos de polícia nem de justiça. Isso porque o homem do trombone era honrado, respeitado, orgulhoso de nunca ter faltado a um dia de serviço sequer. Daí ter recebido a Comenda dos Pioneiros de Roraima, a medalha da Ordem do Rio Branco, na Assembleia Legislativa do Estado.

Estavam todos ali, reverenciando a figura, o legado histórico do homem que garimpou pedras brutas, transformando cada uma delas em objeto precioso. Ali estava Cleres, a filha dedicada, Creyse, a filha amada, Charles, Genner, Giangleide, Giovama, filha do coração, o clã dos Martins, na figura de Nadir, Paulo, Magno Nádia, nego Amadeu, Necy e Neca.

Um a um, os visitantes, amigos, filhos, como Márcio Henrique, se aproximavam daquela geografia de amor e de saudade. Ângela Portela, visivelmente emocionada, também estava lá, com Fabíola, Cleiuza e Ailton Wanderley. Dos filhos de Iolanda Torreias, José Barbosa Júnior, acenou com o coração miúdo seus mais sinceros sentimentos. Depois Lenize, Moacir e Márcio também o fizeram.

Marcelo Ribeiro, extremamente emocionado, e Rosemberg também estiveram presentes ao evento, juntamente com Adejalmo Abadi, Clarinha, Maria Júlia e Norma. Ali, naquele espaço reservado à morte, a vida escorreu como as águas que caíam do céu, com força e grande assombro. Para minha surpresa, Vivaldo Barbosa, com o coração apertado, também prestou sua última homenagem ao grande maestro da vida, ao músico que tocava os corações empedernidos pela dura realidade.

Estavam todos no coreto quando, de longe, ouviram alguma coisa. E o som foi ficando mais forte, mais intenso, mais emocionante. Era a velha banda de música “Furiosa”, que arrepiava o cabelo da meninada, com aquele som vindo diretamente do coreto celestial, cheio de beleza e grandiosidade.

*Advogado, poeta, professor de filosofia, historiador e membro da Academia Roraimense de Letras. [email protected]