Walber Aguiar*
Ocupar-se de viver ou ocupar-se de morrer…
Tim Robbins
Há duas grandes escolhas: ocupar-se de viver ou ocupar-se de morrer. O que não se pode é estar numa região neutra, num espaço interseccional, sob pena de passarmos ilesos pela vida, sem nenhum conflito ou arranhão existencial.
Se começamos a morrer no exato momento da concepção, o que nos resta nesse breve ensaio é passarmos por essa experiência diária com a cabeça erguida. Temos que transformar o deserto que nos sufoca, entender a solidão urbana, o caos social e político, o declínio econômico, as armadilhas do existir.
Contudo, há aqueles que vivem amargos e sem nenhuma perspectiva de graça, beleza ou mudança. Adotam a filosofia do “quanto pior melhor”, enxergando apenas a profecia do terror, o vaticínio da tragédia, vendo nisso um sinal de esperança. Contabilizam guerras, terremotos, epidemias e conflitos no Oriente Médio. Confundem esperança escatológica com escapismo histórico, ao enfiar a cabeça no buraco da ignorância e de suas “verdades” fundamentalistas.
Nesse tempo de masmorra existencial, experimentamos a “síndrome de Barrichelo”, uma espécie de sentimento de inferioridade, onde o segundo lugar parece ser extremamente natural. Pensar assim é ocupar-se de morrer, é passar pela experiência tanatológica antes do tempo, é entregar-se à loucura do mundo, ao cinza das horas e à hermeticidade do existir.
Nessa ótica, o todo tem enorme relevância. Ora, se percebemos apenas a objetividade, o utilitarismo e a compensação financeira, então a vida se nos apresentará engessada, partida, esquizofrenizada. E uma vida assim não pode ter significado; será somente uma passagem inútil pelo universo. Sem cor, sem gosto, sem cheiro, sem verso. Se desacelerar um carro é sinal de prudência, desacelerar a vida significa redução, encolhimento diante daqueles que mandam.
Assim, quem tem poder sobre a vida e a morte a ponto de decidir o destino dos outros; quem pode marionetar a vida das pessoas, arrancando-lhes a dignidade? Se Deus nos “condena” ao livre arbítrio , haverá alguma força que nos faça frear nessa “pista” limpa chamada liberdade? Contudo, até a obediência tem seus limites. Quando temos que nos curvar diante do despotismo e da ridícula tirania, então é chegada a hora de resistir. No entender do poeta negro Paulo Colina, resistir nunca será um equívoco.
O Jesus histórico ocupou-se de viver, quando resistiu à tentação de amealhar tudo que lhe foi oferecido, Dietrich Bonhoeffer também ocupou-se de viver ao celebrar uma ceia num campo de concentração nazista, mesmo que isso implicasse em morte. Por pregar o ainsa, ou a não violência, Gandhi resistiu ao imperialismo dos ingleses, aceitando todas as implicações.
Ocupar-se de viver é quebrar convenções estabelecidas, é passar por cima de tradições caducas. Significa resistir ao medo e à subserviência, ao conformismo e à covardia conivente. Nessa perspectiva, quem busca o significado da vida nunca desacelera, sempre avança. Certamente, o segredo não está no fim da linha, mas em cada esquina do existir…
Poeta, professor de filosofia, mestre em Letras, historiador e membro da Academia Roraimense de Letras.