Walber Aguiar*
Faz escuro mas eu canto, pois a manhã vai chegar
Thiago de Mello
O dia chegou com sua cara de sobriedade, mas a alma, imersa no vazio, passou para o corpo a dor, o cansaço, o sono em demasia, o isolamento social. Ficar só era o que importava, sem nenhum ruído, contato ou conselho. Ligar para o CVV, chamar um amigo, desabafar com Deus, fumar, beber?
A sombra longilínea da depressão ficou mais densa. Alguns emagreciam, outros engordavam, não havia concentração ou tomada de decisões. O mal invisível estava dentro do mundo, dentro de casa, dentro da gente. Atribuída a satanás, a depressão, tratada como doença, tira a força, a fé, a beleza, o amor e a amizade.
Não obstante, o dinheiro apareceu como trilha viável no pântano enganoso da imaginação. Mas nada conseguia comprar a cura, apenas remédios eram adquiridos. Afinal, ricos e pobres estavam nesse barco da melancolia, nesse Titanic da náusea.
Meio dia. Meia dignidade, meio homem, meia felicidade. Tudo estava reduzido pela metade, nesse desesperado universo em desencanto. Descartes, manicômios, lobotomias; todos tentavam explicar o que nem Freud conseguiu em sua totalidade. Três horas da tarde. Sol forte, secura solidão. A noite era a única perspectiva de um dia exatamente igual aos outros.
Novamente o copo d’água e os antidepressivos. Sem piedade a noite caíra, empurrando a barra do dia. Marcada pela nódoa depressiva da apatia, com suas neuroses e legalismos, seus mandamentinhos religiosos, psicológicos e sociais. A comida estava sem gosto, a água não matava a sede. Nesse labirinto a morte foi cogitada, oferecida como tentativa.
Assim, na perspectiva Kierkegaardiana, a vida ganhou cara de tragédia, com feições horripilantes e terrivelmente dolorosas. Uma morte em vida, por assim dizer. Daí o suicídio parecia responder facilmente aos gritos enauseantes da angústia.
Viver ou desagendar o amanhã; importar-se ou isolar-se; entender a intervenção divina ou flertar com a malignidade do inferno?
Sem força para lutar, sem motivos para continuar vivendo, mais um despediu-se da vida, mais um sucumbiu feito pétala murcha na escuridão.
Entretanto, o dia veio de repente. Trouxe luz, trouxe a alegria da simplicidade do rosto de Jesus. Trouxe a vontade de viver…
E era novembro, chuvas e enorme esperança cabiam no coração. E era novembro…
*Advogado, poeta, professor de filosofia, historiador, mestre em Letras e membro da Academia Roraimense de Letras