Cotidiano

Uma das profissões mais antigas do mundo ruma à extinção

Trabalhar na produção de tijolos artesanais requer muita vontade, força e persistência. O trabalho começa ao nascer do sol, tem uma parada para o almoço e recomeça até o sol se por, às 18h. Quem passa na BR 401, que liga Boa Vista ao município do Bonfim, logo depois da Ponte dos Macuxi, percebe muitas casinhas, pequenos fornos e muitas pessoas trabalhando. É a Vila Vintém, também conhecida como Vila dos Teimosos, justamente por que quando chove, o local fica completamente alagado e todos têm que sair parando a fabricação de tijolos artesanais. 

Mas essa é apenas uma das dificuldades enfrentadas pelos oleiros. A falta de incentivos, o preço baixo do tijolo e a queda nas vendas, aliado ao trabalho duro diário, está fazendo a profissão quase ser extinta em Roraima. 

O presidente da Associação de Oleiros de Roraima, Perci Moraes, disse que no início da Vila Vintém, criada em 1994 pelo então governador Otomar Pinto, eram mais de quatro mil oleiros trabalhando. 

“Hoje temos pouco mais de 400 oleiros. As dificuldades, a falta de incentivo por parte dos governantes e a baixa procura pelo nosso tijolo está fazendo as pessoas desistirem de trabalhar em olarias”, disse. “Antes o governo botava o barro pra gente trabalhar, mas faz mais de dez anos que isso não acontece mais, e isso desestimulou os oleiros que têm que pagar para colocar o barro, aí o lucro é quase nada”, afirmou.

Para ele, a tendência é a extinção da profissão. Destacou como fator que a sua geração está se aposentando e morrendo, e a nova geração não quer o trabalho de oleiro.  

“Os mais velhos, como eu, não aguentam mais trabalhar fazendo tijolos e os mais novos não querem nem saber de olaria”, disse. “Isso é uma tendência no Brasil todo. Hoje só temos trabalho de olaria em Roraima e no Pará e alguns que ainda produzem para suas próprias construções”, afirmou.

Um exemplo é o senhor Apolinário Raimundo da Silva, mais conhecido por Pulú, que está na profissão de oleiro desde 1988 e hoje, aos 78 anos, ainda trabalha na fabricação de tijolos. Ele é pai de sete filhos, sendo quatro homens e três mulheres. Apenas um filho seguiu sua profissão. 

“Muitos da minha época já morreram, outros não têm condições de botar barro no local para trabalhar e os filhos não querem seguir nesta profissão”, disse. “E cada dia que passa menos pessoas querem trabalhar de oleiro, pois é muito trabalho e pouco dinheiro”, disse. (R.R)   

Produção dos oleiros cai 80% no inverno 


 O presidente da Associação Perci Moraes diz que faltam incentivos públicos (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

O presidente da Associação de Oleiros de Roraima, Perci Moraes, informou ainda que desde o início de maio, quando começou o período de chuvas em Boa Vista, que os oleiros tiveram que deixar o local de fabricação de tijolos artesanais, na Vila Vintém. 

No local, em tempo de verão, cerca de quatrocentas pessoas trabalham na fabricação de aproximadamente 100 milheiros de tijolos por mês. No inverno, a produção cai para zero e apenas 10 pessoas trabalham dentro do terreno da Associação de Oleiros, no bairro 13 de Setembro, sendo que a produção é de apenas 20 milheiros. 

“Todos os anos é a mesma coisa. Começa a chover, temos que sair de lá, pois alaga tudo e não entra carro e nem tem como produzir o tijolo lá”, disse. “Em governos anteriores o barro era colocado para quem quisesse trabalhar na Associação no período do inverno e muita gente continuava trabalhando, mas nos últimos governos não houve mais esse benefício para os oleiros e a produção caiu muito.Tudo depende do Governo, muitos não sabem se organizar e assim poder trabalhar no inverno”, afirmou.

Perci informou que quem não acumulou o barro e nem se preparou para manter o trabalho no período de inverno, procura fazer outras atividades para conseguir alguma renda e sustentar a família.

“Como não temos direito a nenhum benefício, como os pescadores, por exemplo, procuramos outras atividades, como pescar, arrancar juquira, capinar mato e fazer diárias de outras coisas”, disse.

Perci reclama dessa falta de investimentos por parte do Governo, que tem sido o motivo principal para a queda na fabricação do tijolo artesanal. 

“O que oferece mais mão de obra num estado é a Construção Civil, emprega quem faz tijolo, quem faz a telha, o pedreiro, carpinteiro, eletricista e tudo mundo ganha. Mas do jeito que está não tem ninguém ganhando nada”, afirmou. (R.R)

Preço é mantido há seis anos e vendas vêm caindo 


A produção cai por conta das chuvas, mas os preços continuam os mesmos (Foto: Nilzete Franco/FolhaBV)

O preço médio de R$ 350 do milheiro de tijolos de fabricação artesanal vem sendo mantido há aproximadamente seis anos e com registros de casos individuais de queda no preço para até R$ 270 em tempos de crise. Embora com o período chuvoso a produção caia, a venda do tijolo artesanal não obedece a lei da economia, sobre a procura e a oferta, o que faz o preço de mercadorias subir. 

Segundo o presidente da Associação de Oleiros de Roraima, Perci Moraes o milheiro custa R$ 350 e mesmo neste período chuvoso, quando diminui a produção em quase 80%, o preço se mantém.   

“Se aumentar é pior, não vende e ficamos no prejuízo. Então o melhor é manter o preço e vender, embora as vendas caiam naturalmente neste período por conta do fato de ter menos construções na época das chuvas, além do fato de o Brasil e o Estado estarem em crise financeira, o que dificulta mais ainda”, disse.

Ele citou ainda a dificuldade em manter esse preço, já que os valores da matéria prima e dos produtos usados na fabricação do tijolo aumentaram. Perci fez um comparativo apenas em relação aos últimos dois anos. Uma carrada de lenha em 2017 custava R$ 900, hoje custa R$ 1.300; o metro da lona preta, usada para cobrir o tijolo, custava R$ 8 hoje custa R$15 e solda cáustica custava R$ 5 e hoje é vendida a R$ 12. 

“A lenha, além de cara, está em falta no mercado e isso dificulta mais ainda a produção”, disse. 

Mesmo assim, o presidente disse que há momentos em que a associação vende mais barato ainda. “Quando estamos com muito tijolo parado e o comprador quer levar dez milheiros com pagamento à vista, então fazemos um preço melhor”, disse. (R.R)