A Folha entrevistou, esta semana, um atravessador de mercadorias que age na fronteira entre o Brasil e a Guiana, a Leste de Roraima. Nascido na região do Bonfim, a 120 quilômetros da Capital pela BR-401, ele garantiu conhecer os principais caminhos que os atravessadores utilizam para contrabandear produtos do país vizinho.
O atravessador revelou que a prática de descaminho ocorre com mais frequência no verão, quando o rio Tacutu, divisor dos dois países, seca e permite que os bandidos o cruzem a pé. “Há uma parte estreita do rio com muitas pedras. Então, a gente nem precisar embarcar. É só atravessar com as mercadorias no ombro”, detalhou.
Sobre tráfico de drogas, o homem afirmou que nunca cometeu este tipo de crime, mas outros, sim. “Jamais! Eu só trago roupas, calçados e aparelhos eletroeletrônicos. Também já trouxe moto da Guiana [marca Jialing], mas nunca trouxe maconha”, afirmou.
Entre os produtos que entram de forma irregular no País, por Normandia ou Bonfim, as roupas e alho continuam sendo os mais comuns, principalmente as camisas que falsifica a marca La Coste. Os tênis que pirateiam a marca Nike e Puma também são muito negociados na Capital. “É o que mais atravesso”, assegurou.
Por mês, o atravessador informou que atravessa até 1.500 camisas e calças. Segundo ele, os clientes fazem a encomenda e dizem o que eles preferem. Depois, como conhecedor da região, ele segue ao país vizinho, compra os produtos e retorna a Boa Vista, sem cruzar o posto da barreira de fiscalização, na BR-401, antes da ponte sobre o rio Tacutu.
“Quando a gente vai comprar muito, no atacado, tem que pegar essas estradas para não correr o risco de ser preso e perder toda a mercadoria. Apesar da fiscalização lá na barreira não ser rigorosa, a gente prefere não arriscar”, comentou.
Ainda segundo o atravessador, as mercadorias da Guiana também são levadas para Manaus (AM). Na semana passada, a Operação Sentinela apreendeu uma grande quantidade de roupa guianense em um ônibus interestadual, na barreira do Jundiá, perto da divisa de Roraima com o Amazonas, Sul do Estado.
Questionado sobre o crime que comete, o atravessador se defendeu reclamando não haver emprego na Capital. Também justificou o descaminho alegando que “quem ganha é o povo” que compra os produtos com preços mais em conta. Antes da prática criminosa, ele era agricultor.
“Não considero crime. Crime é o que o governo faz com a gente. Não há emprego, nem oportunidade para o povo. Tenho filhos para criar, tenho que ganhar dinheiro para comprar a comida deles. E como conheço aquela região como a palma da minha mão, faço a travessia dos produtos e com isso sustento minha família”.
O lucro do atravessador, por mês, varia entre R$ 1.500,00 e R$ 2 mil. Quando atravessa motocicletas Jialing, tira até R$ 3 mil. No momento, o atravessador disse que deu um tempo porque a fiscalização apertou na fronteira, com operações da Polícia Militar e Exército Brasileiro. (A.J.)
Polícia
Atravessadores aproveitam a seca do rio
Fronteira fica mais vulnerável no período de estiagem, quando dá para atravessar a pé pelo rio Tacutu, que divide o Brasil e a Guiana