Na manhã desta terça-feira, 15, foi deflagrada pela Polícia Civil de São Paulo a Operação Anteros, com o objetivo de combater uma organização criminosa que praticava crimes virtuais de extorsões, denominado “romance scammes”. O crime ocorria através de redes sociais ou por aplicativos de namoros virtuais. Simultaneamente, a operação foi deflagrada em outros seis Estados.
Em Roraima, a Polícia Civil cumpriu dois mandados de busca e apreensão e dois mandados de prisão em desfavor de um brasileiro, de 28 anos, preso no bairro Liberdade, e de uma venezuelana, de 31 anos, presa no Buritis.
A pedido da polícia de São Paulo, ambos passaram por interrogatório. Ela, na sede da Delegacia de Acidentes de Trânsito (DAT) e, ele, na sede do 5º Distrito Policial (5º DP).
Posteriormente, o homem foi encaminhado à Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (Pamc) e a mulher à Cadeia Pública Feminina de Boa Vista. Ambos ficarão à disposição da Justiça de São Paulo, mas a Justiça de Roraima será comunicada.
Além disso, foi solicitado que a Polícia Civil de Roraima providenciasse uma vídeo conferência, de forma que um oficial de Justiça do Estado de São Paulo procedesse com a citação dos réus.
A INVESTIGAÇÃO – De acordo com a Polícia Civil de São Paulo, a operação Anteros é uma fase que teve origem com a operação Voo de Ícaro, cujo objetivo foi desarticular, em 2019, uma organização criminosa que atuava em estabelecimentos prisionais com entrega de materiais por meio de drones. Após analisar o celular de um preso naquela ação, foi identificada farta movimentação bancária, o que teria motivada a nova etapa investigativa.
Com o uso de ferramentas de inteligência e investigação formal, que perdurou por mais de um ano, os investigadores descobriram uma complexa organização criminosa que possui tentáculos em diversos países e grande atuação no Brasil.
Conhecidos por “romance scammers”, os criminosos são especializados em fraudes/golpes na internet utilizando perfis fakes onde, depois de cooptadas as vítimas, eram iniciadas as extorsões e, com os valores recebidos, a lavagem de capitais em, ao menos, 24 Estados da Federação.
Os crimes eram cometidos através de redes sociais ou por aplicativos de namoros virtuais, onde os criminosos enviavam solicitação de amizade a potenciais vítimas, em especial funcionários públicos e idosos, independente do sexo. Todas as vítimas eram detentoras de faixa salarial que demonstrava poder aquisitivo superior, identificadas por pesquisas em redes abertas, como as redes sociais.
Durante as investigações, foram identificadas 437 vítimas que registraram ocorrência da mesma natureza criminal e que tiveram prejuízo superior aos R$24 milhões de reais.
Em todos os Estados da Federação, contando as subnotificações, os números superam duas mil vítimas que tiveram um prejuízo estimado, nos últimos três anos, de R$250 milhões movimentados por essa organização criminosa.
O Delegado de Polícia responsável pelas investigações, além de determinar o indiciamento de 210 pessoas, representou pelas medidas cautelares, com parecer favorável do Ministério Público Paulista e deliberação convergente do Poder Judiciária, pela decretação de 181 mandados de prisões preventivas, 216 mandados de busca e apreensão e o sequestro de R$5 milhões de reais, entre bens móveis e imóveis, além do bloqueio e também sequestro bancário de 329 contas (de pessoas físicas e jurídicas), visando afastar a continuidade dos delitos e protegendo as vítimas iminentes, bem como na tentativa de recuperação e devolução dos valores desviados.
ATUAÇÃO DOS CRIMINOSOS – Após contatos iniciais de amizade e de diálogo convincente, os criminosos iniciavam o namoro virtual e, aos poucos, as vítimas, em sua maioria, acabavam por enviar fotos ou vídeos íntimos que posteriormente eram utilizados na extorsão.
Um dos exemplos é a do “fakelover”, denominação dada pela investigação ao núcleo que mantinha os contatos diretamente com as vítimas. O autor declarava morar no exterior e informava que havia recebido uma herança e que precisava enviar para o Brasil, incentivando a vítima a ajudá-lo com promessa de vantagem. Assim, era solicitado que a vítima recebesse o material em sua residência.
Contudo, quando o suposto material “chegava” ao Brasil, outra pessoa, se passando por funcionário da alfândega, contatava a vítima e informava que seria preciso quitar os impostos de importação, mas que por um valor menor ela conseguia a liberação do material. Desta forma, a vítima realizava esse pagamento menor e marcava a data da retirada do produto.
Na data de retirada, a vítima recebia outra ligação informando que, para a liberação, o valor deveria ser em dólares, enquanto a vítima havia depositado em moeda brasileira, necessitando então de complementação. Outros artifícios também eram utilizados, como taxas de diplomacia, taxas de transporte de valores e outros.
Ainda segundo a Polícia Civil de São Paulo, como a vítima não conseguia a liberação do material (inexistente) mesmo realizando todos os depósitos solicitados, ao insistir que queria o produto, ou que iria denunciar a polícia, os criminosos consumavam outro crime, informando que a vítima havia caído em um golpe.
Eles ainda ameaçavam as vítimas, dizendo que, se as autoridades fossem acionadas, fotos comprometedoras seriam divulgadas em redes sociais. Dessa forma, exigiam ainda mais valores para a não consumação.
Esse tipo de crime, segundo os investigadores de São Paulo, ocorre desde 2014. No entanto, muitas vítimas, por vergonha, constrangimento e medo, acabaram não denunciando o fato para a polícia, beneficiando os marginais e o enraizamento da organização criminosa no Brasil nos últimos anos.
A ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA – As investigações da Polícia Civil de São Paulo conseguiram demonstrar como a organização criminosa era estruturada. Há, inicialmente, a figura do “Fakelover”, responsável por contatar as potenciais vítimas.
Outro ramo da organização era o denominado “o oficial”, que se passava por funcionário da alfândega, diplomatas e outros.
Havia também a ala dos “recrutadores” de contas e também os “operadores”, que repassavam o dinheiro rapidamente entre várias contas, após o depósito, dificultando o rastreamento.
Ligados aos recrutadores, há os “correntistas”, que recebiam de 7 a 10% dos valores arrecadados somente para emprestar sua conta corrente e fomentar a operacionalização, proporcionando o aumento crescente dos crimes, como eixo necessário de um mesmo mecanismo.
Por fim, foram identificados também os agentes da lavagem de capitais, cuja finalidade é “esquentar”, ou seja, tornar o dinheiro ilegal em lícitos imóveis.
ANTEROS – O nome da Operação foi escolhido em respeito ao sentimento das vítimas. Na mitologia grega, Anteros é o deus do amor retribuído, literalmente “amor devolvido” ou “contra amor” e também punidor daqueles que desprezam o amor e os avanços de outros ou o vingador do amor não correspondido. É o Deus da desilusão, ordens, manipulação.
AÇÃO CONJUNTA – A operação foi deflagrada em São Paulo, por intermédio do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) de Presidente Prudente. O delegado geral de São Paulo, Ruy Ferraz Fontes, solicitou apoio ao trabalho em Roraima junto ao delegado geral, Herbert de Amorim Cardoso, que coordenou a ação no Estado. A ação operacional foi executada pelo diretor do Departamento de Operações Especiais (DOPES), Maurício Nentwig.
Participaram ainda policiais do Grupo de Resposta Tática (GRT), da Delegacia de Acidentes de Trânsito (DAT), Polinter (Delegacia de Polícia Interestadual), do 5º Distrito Policial e Grupo de Resposta Imediata (GRI), além dos delegados Juseilton Costa e Cândida Magalhães Senhoras.