Polícia

Detento foge do CPP para fazer denúncia no Ministério Público

Na manhã de ontem, 24, o Ministério Público do Estado de Roraima foi procurado por um detento e pela sua família para denunciar os casos de supostos maus-tratos sofridos pelos presidiários que cumprem pena na unidade prisional. Segundo o detento Mário Sérgio Diniz Batistot, vulgo “Pigmeu”, de 36 anos, ele fugiu na noite de quarta-feira, 23, depois de escapar por um buraco da cela do Centro de Progressão Penal (CPP) no bairro Asa Branca, zona Oeste, e pediu ajuda aos familiares.

O promotor Carlos Paixão foi quem recebeu o preso e a família. O detento relatou como fugiu da unidade prisional no dia 23 por uma grade da janela de metalon que estava quebrado. “Como é magro, ele passou por ali. Outro preso, conhecido como Lirney Jeferson, tentou fugir, mas não passou pelo espaço da grade. Ao conseguir fugir, contatou-se à família, que veio apresentá-lo no Ministério Público.  Entrei em contato com o subsecretário da Sejuc [Secretaria de Justiça e Cidadania] e tudo deve ser apurado para ver o que aconteceu. Ele tem algumas lesões pelo corpo, as quais ele diz que foram fruto de agressões por policiais”, destacou o promotor.

Em entrevista para a Folha, o preso contou como ocorrem as agressões e mostrou marcas que seriam decorrentes de uma dessas abordagens policiais. “Sempre em um plantão de 13 ou 15 policiais, que entram no sistema para tirar o reeducando para advogado, oficial de justiça ou demais funções, muitas vezes espancam, tacam bala de borracha, jogam bomba, dão chute, murros, choque, jogam pedra, fazem tudo isso. Na contenção apanha e, quando vai voltar para a cela, apanha também, fica de joelho, apanha nu”, relatou.

O presidiário confirmou que responde por três homicídios e um roubo. “Estou preso desde 2000. Já estava com mais de 10 anos que eu não fugia do sistema prisional”, disse. Em relação ao CPP, disse que o local não atende aos detentos de forma humanizada. “Lá é desumano. A família deixa as coisas na frente e os agentes não entregam. Eu fugi por conta dessas agressões. Me puniram com 10 dias numa tranca. Eu não tinha feito nada. O comandante da tropa do dia 22 disse que eu estava desrespeitando eles. Mandaram eu tirar a sandália e a camisa, começaram a me espancar, me jogaram na contenção. Quando deu 5 horas da tarde me espancaram de novo, levaram para o CPP para poder encobrir, porque lá não se tem acesso à sua família. Até para falar com advogado não tem como porque eles não deixam”, frisou.

O detento negou que pertença à facção criminosa e que o motivo da fuga foi por não suportar as agressões. “Resolvi me entregar porque estão falando que sou de facção, que sete membros de facção foram me resgatar, sendo que eu não faço parte de facção nenhuma. Ninguém me resgatou. Quem me tirou de lá foi meu próprio esforço, porque não suportava mais apanhar, ser humilhado. Eu dei um jeito de sair daquele lugar porque eu senti que iria morrer lá dentro. Eu fugi umas 9 horas da noite, fui para o Caimbé, onde encontrei duas mulheres que fazem visita na Pamc. Elas me chamaram, mandaram eu deitar numa rede, quando eu liguei para minha mãe”, acrescentou.

Quando questionado sobre as mortes dentro da Pamc, Mário Sérgio não soube explicar por que nas últimas semanas dois detentos foram mortos e esquartejados. “Não pega nada para mim porque não tenho problema com preso nenhum. São pessoas [os mortos] que fizeram alguma coisa de errado lá dentro, mas eu não sei explicar”, disse.

A mãe do detento, Edilamar Avelino Diniz, afirma que procurou o MP para pedir socorro. “É por isso que estou aqui, porque sempre que acontece as coisas dentro da Penitenciária e Cadeia Pública, quem socorre a gente é o Ministério Público. Também contamos com a Defensoria Pública diante de toda deficiência dentro da Penitenciária”, disse.

O promotor Carlos Paixão ainda destacou que as mortes no sistema prisional ficam a cargo de investigação da Delegacia-Geral de Homicídios (DGH). “Houve os homicídios e a Polícia Civil deve instaurar o inquérito sobre isso tudo, mas as dificuldades de se chegar ao autor é muito grande. Lá dentro o preso não fala quem fez”, ressaltou.

Paixão também fez críticas à estrutura da Pamc. “O Estado tem que construir presídio, tem que mudar aquela desgraça. Aquilo não serve. Eu falo sempre assim e as coisas estão cada vez pior. Enquanto o Estado não resolver o problema com um presídio novo, vai continuar assim”, salientou.

Quanto à presença de policiais militares, o promotor diz que eles cumprem funções que não são suas. “Não tem agente penitenciário necessário. Existem cerca de 170 agentes carcerários antigos que estão desviados de função. Esse não é o papel da PM, mas se ela não estivesse lá, teria morrido todo mundo. É a Polícia Militar que está conseguindo salvar aquela coisa chamada Penitenciária. Daquela vez que puseram fogo, eles evitaram que matassem cerca de 40, por isso a necessidade da PM”, frisou.

ADMINISTRAÇÃO – O diretor do Departamento do Sistema Penitenciário (Desipe), Alain Delon Correia, afirma que o detento vem dando trabalho ao sistema prisional há muitos anos e que o caso será apurado. “Sobre as possíveis agressões, a gente vai apurar, mas no primeiro momento podemos dizer que ele é um preso muito agressivo, usuário de drogas, o histórico dele de penas acumula no Tribunal de Justiça 58 anos. No momento em que ele causou um tumulto na ala dele, foi posto na contenção da Penitenciária para ser conduzido à tranca. A partir do momento que ficou na contenção, travou luta corporal com ajuda de outro preso, tentando agredi-lo, eu não sei se tentando matá-lo. Então, possivelmente ele se machucou nesse momento e foi para sanção disciplinar”, disse.

Segundo o diretor, o preso pertence ao PCC (Primeiro Comando da Capital) e a fuga será apurada. “Talvez com a ajuda dos que já estavam na tranca, ele teve facilidade de escapar com o rompimento de obstáculo,  barras de ferro foram quebradas, porque ele tem um poder de liderança. Ele liderava ou lidera a ala dele. Ele teve ajuda de terceiros depois que havia se evadido do CPP. Depois foi se apresentar no Ministério Público se passando por inocente, que os policiais estavam agredindo. Essas condutas servem para acalmar os ânimos daquelas pessoas que estão usando drogas. Ele, por ser uma pessoa perigosa, tem determinadas condutas que o policial tem que executar para poder ter o domínio da situação”, enfatizou Alain Delon. (J.B)