“Hoje se o preso conseguir sair da cela, ele não terá dificuldade para fugir da PAMC”, diz servidor

Quatro presos fugiram da PAMC no dia 2 de setembro

Cela da PAMC (Foto Nilzete Franco/FolhaBV)
Cela da PAMC (Foto Nilzete Franco/FolhaBV)

Há 11 dias o Sistema Prisional de Roraima voltou a ser destaque, após quatro presos fugirem da Penitenciária Agrícola do Monte Cristo (PAMC), o maior presídio de Roraima, por um buraco na parede da cela. Até agora nenhum dos fugitivos foi capturado pelas forças de segurança do Estado.

Estão sendo procurados: Moisés Farias Pinho, Kaique Almeida Vieira, Thiago Edward Cândida Dias e Natanael Araújo de Mesquita. Segundo informações obtidas pela FolhaBV, os fugitivos são membros de uma facção criminosa.

Moisés Farias Pinho, Kaique Almeida Vieira, Natanael Araújo de Mesquita e Thiago Edward Cândida Dias (Foto: Sejuc)

Procurada pela FolhaBV, a Divisão de Inteligência e Captura (Dicap) não se manifestou sobre o andamento das investigações.

Dia da fuga

Um servidor que atua no sistema prisional foi ouvido pela reportagem e revelou que dias antes da fuga, os quatro fugitivos aprontaram durante o banho de sol e foram mandados para a cela do RDD (Regime Disciplinar Diferenciado).

Conforme relatado, os quatro presos estavam juntos na cela e quem determinou a ida deles para lá foi a direção. Segundo a fonte, esse procedimento é errado, e os presos teriam que estar em celas separadas no RDD.

“Eles forçaram para ir para essa cela. O certo seria cada um ir para uma cela e não ficar os quatro juntos. Além disso, ficaram na última cela no fim do corredor e fica próximo ao muro. Lá não tem vigilância externa”, explicou.

Ainda segundo ele, a iluminação no local é inexistente na parte externa dos blocos. Além disso, devido ao baixo efetivo, no dia da fuga, uma das guaritas estava desguarnecida. 

A PAMC, possui 120 câmeras de segurança. que segundo a fonte, estão em locais que não resguardam a segurança dos presos. “Inclusive, algumas delas não cobrem a parte externa e outras não estão funcionando.  No local, existem câmeras com infravermelho só que estão mal localizadas”, disse. Ele acrescentou, as câmeras estão servindo para vigiar o policial penal e não o preso, pois está apontada para a carceragem.

“As câmeras estão mal posicionadas. O preso não foge para dentro do presídio, ele vai para fora. As câmeras tem que pegar a movimentação na parte externa da cadeia também”, pontuou.

A denúncia aponta ainda que o efetivo de policiais penais é de quase 800 agentes, mas a maioria estaria no administrativo. Os que atuam no presídio são 34 profissionais por plantão para cuidar de 1800 presos.

“Todos os dias os presos tomam banho de sol, são levados para a escola, enfermaria, entre outras rotinas do presídio e esse trabalho é feito por poucos servidores, que além de um dia intenso de trabalho, ainda tem que tirar o plantão noturno. No fim do turno, estamos mortos, parecendo zumbi, sem dormir e se alimentar direito”, comentou.

Outra questão apontada foi em relação aos serviços voluntários que segundo a fonte estariam sendo pagas 40h para servidores que atuam no administrativo e apenas 20h para os servidores que estão na linha de frente no operacional.

“Nosso sistema está mal gerido e hoje se o preso conseguir sair da cela, ele não terá dificuldade para fugir da PAMC”, finalizou.

Outro lado

Em nota, a Sejuc respondeu que a instalação das câmeras nas unidades prisionais foi realizada com base em um planejamento estratégico, levando em consideração as áreas mais críticas de monitoramento.

A iluminação externa das unidades prisionais é objeto de revisão e manutenção constante.

A distribuição do efetivo de policiais penais é um desafio enfrentado por todas as instituições penitenciárias. Embora o número de policiais alocados na PAMC à primeira vista possa parecer baixo em relação ao número de presos, a Sejuc está constantemente revisando as escalas de trabalho e considerando a realocação de servidores para aumentar a presença nas unidades prisionais, afim de garantir todas as demandas que envolve o processo de cumprimento de pena.

Em relação à questão dos serviços voluntários, a Sejuc reafirma que todos os servidores são valorizados, independentemente de sua função. As horas de serviço voluntário atribuídas são baseadas em critérios de necessidade e disponibilidade.

Novo presídio

Conforme um levantamento da FolhaBV, a última fuga registrada na PAMC foi em 2018, quando 86 presos fugiram do local. Isso ocorreu um ano após o massacre que vitimou 33 homens.

1 ano e cinco meses depois do massacre, o Governo do Estado, na época Suely Campos, divulgou que iria construir um novo presídio avaliado em R$ 45 milhões. A obra, que vai funcionar o presidio de segurança máxima, deveria ser entregue em 2021, mas até o momento as obras seguem paradas.

Em fevereiro deste ano, a Folha publicou uma matéria sobre o assunto e o a Sejuc informou por meio de nota que está na fase final de conclusão dos estudos para quantificar a remanescente da obra. A previsão é até o final de março os projetos sejam concluídos e enviados à Brasília para análise e aprovação.

Após essa etapa haverá a posterior publicação de nova licitação e contratação de nova empresa para finalizar o serviço.

Obra foi paralisada após o Governo reinscindir o contrato com a empresa (Foto: Arquivo FolhaBV)

Fugas

As fugas na PAMC eram constantes, para se ter uma ideia, de janeiro de 2015 a janeiro de 2018, foram registradas 18 fugas, resultando na evasão de mais de 300 detentos.

Os dados levam em consideração todos os registros de reportagem feitos durante esse período, incluindo as informações oficializadas pela Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc), pasta responsável pela administração do sistema prisional roraimense.

Como forma de controlar o sistema prisional, a Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP) atuou por três anos em Roraima.

Na época da saída da FTIP, em outubro de 2021, um agente denunciou à Folha que o sistema prisional poderia colapsar.

Em setembro de 2022, um bilhete enviado por um detento por meio de um familiar, foi entregue à reportagem da FolhaBV. No papel, o preso descrevia a tensão e medo de um novo massacre na PAMC.

 “Isso aqui é um barril de pólvora que pode explodir a qualquer momento”, dizia trecho do bilhete.

Leia a Folha Impressa de hoje