Uma das jovens envolvidas em uma confusão em um shopping, localizado no bairro Caçari, na terça-feira, 13, entrou em contato com a Folha nesta quarta-feira, 14, para dar a sua versão dos fatos. Segundo relatou à reportagem, ela e a irmã foram injustiçadas.
De acordo com o relato, a irmã, de 34 anos, teria comprado um umidificador de ar em um quiosque a cerca de 10 dias, porém o aparelho apresentou defeito e ela teria ido realizar a troca. Ainda segundo ela, a irmã sofre Transtorno Afetivo Bipolar e Transtorno de Personalidade Borderline. “Esses dois transtornos dificultam as relações sociais dela, o que pode ocasionar alguns surtos de agressividade. Nesse dia, ela não estava muito bem e me chamou para ir com ela”, explicou.
Ao chegar ao quiosque, a atendente disse que iria conversar com o gerente da loja sobre a possibilidade da troca. “Apesar de ter um mês de garantia, a atendente disse que a loja não fazia a troca por mau uso. Ela se sentiu ofendida, pois realizou todos os procedimentos para usar o aparelho e ficamos aguardando o gerente retornar a ligação e falar com ela”, relatou.
Durante a conversa por telefone com o gerente, ele teria dito que apenas com 30 dias poderia da uma resposta sobre a troca. “Ele não foi muito amistoso com ela e disse que só poderia dá um retorno nesse prazo”, disse.
A mulher disse, ainda, que o gerente teria desligado o telefone na cara da irmã, momento em que ela se alterou. “Quem sofre desses transtornos, situações como essas tomam proporções muito maiores que o normal. Ainda mais se a pessoa estiver em adequação de remédio ou com o tratamento estabilizado, como é o caso dela”, explicou.
A envolvida ligou para a Polícia Militar (PMRR), que segundo ela, informou que não poderia ir até o estabelecimento. “Essa resposta da PMRR fez com que ela se sentisse injustiçada, o que agravou mais ainda a situação. Ela informou aos policiais que era Borderline, que não respondia pelas atitudes dela, estava se sentindo mal e que precisava da polícia ali, pois ela queria o dinheiro ou um aparelho novo”, disse.
Nesse momento, a mulher já estava muito agitada e a irmã ligou para uma amiga para ajuda-la. “Nesse momento a minha irmã já estava muito alterada e eu e a minha amiga estávamos tentando tira-la de lá”, relembrou.
“Quando a PM chegou nós informamos que tínhamos sido nós que tínhamos os acionado, porém ele disse que não porque tinha sido do sexo masculino. A moça da loja disse que tinha sido o dono da loja que tinha chamado. Nessa hora, ela tinha se sentido muito injustiçada porque ela já tinha chamado a polícia e por ela eles não tinham ido, mas sim pela loja. O que causou uma crise muito grande nela e ela começou a surtar e querer quebrar os produtos da loja”, relatou.
No momento do surto, de acordo com a irmã, um dos policiais disse que iria prender a mulher. “Eu tentei dizer pra ele que ela era paciente psiquiátrica e que eles precisavam chamar o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) para seda-la. Quando eu falei sobre a situação dela, um dos policiais me mandou calar a boca porque senão ele iria me da voz de prisão”, contou.
No relato, a mulher disse que um dos policiais militares teria dado um golpe chamado de ‘mata-leão’, que é um golpe de estrangulamento usado nas artes marciais japonesas, realizada pelas costas. “Eu achei que ele iria mata-la porque logo ela ficou muito roxa e a minha reação foi de proteger a minha irmã naquela situação”, relatou.
A irmã disse, ainda, que a mulher já teve vários surtos em casa e a Polícia Militar já foi acionada e não teve esse comportamento. “Eles nos trataram como criminosas. Eu gritei para o policial para que ele a soltasse, afastei o braço dele do pescoço dela e imediatamente, ele mandou me algemar e deu voz de prisão”, contou.
A mulher tentou ligar para um irmão, que também é policial, para ele se dirigir ao local. “Enquanto eu estava afastada e tentando fazer a ligação, a situação com a minha irmã se agravou. Ela chegou a agredir uns policiais, eu continuei gritando para eles que ela tinha problemas psiquiátricos e que precisava do Samu”, disse.
De acordo com ela, estavam presentes quatro policiais militares, dois bombeiros militares, dois seguranças da loja e nenhuma policial feminina. “Mesmo com essa quantidade de gente, eles me viam como uma ameaça, eu sai algemada por tentar impedir que um policial invadisse a integridade física da minha irmã. Até esse momento não tinha nenhuma policial feminina, tentaram apaziguar a situação e agiram com truculência, principalmente o comandante da guarnição”, disse.
Após a situação nas dependências do local, as irmãs foram dirigidas à viatura. “Eles queriam colocar ela dentro, eles não se preocuparam com as vestimentas dela. Simplesmente, e jogaram dentro do camburão como se fosse a pior das criminosas. Ela teve as partes íntimas expostas, teve a sandália jogada na cara, não tiveram um pingo de humanidade em conter a minha irmã, mesmo sabendo que ela tem problemas psiquiátricos, estava em surto, não podia fazer nada naquele momento porque estava fora de consciência normal”, explicou.
A mulher relatou também que os policiais ameaçaram pessoas que tentaram ajudar a irmã. “Eles falaram que quem chegasse perto, eles iam prender”.
Após sair do shopping, a mulher em surto foi encaminhada ao Hospital Geral (HGR) para atendimentos médicos. “Quando estávamos nos deslocando ao HGR, o policial perguntou sobre o estado de saúde dela, eu expliquei que tinha todos esses problemas e estava em surto”, disse.
Estiveram no HGR, familiares e a médica que acompanha a mulher. O Comandante de plantão, responsável pela equipe foi chamado e disse que “a partir dali disseram que dependia da família qual interpretação eles iam ter da atitude da polícia, eu estava na viatura. Nesse momento, o comandante da guarnição, entrou na viatura e disse eu estou pensando em liberar vocês, eu não vou fazer o Termo Circunstanciado de Ocorrência (TCO), eu só vou fazer um relatório e colocar você como envolvida, mas você precisa me prometer que não irá registrar queixa contra mim, não irá me processar, se não a situação vai evoluir”, relatou.
Ela disse está em choque, chorando muito e apenas concordou que ele tirasse as algemas. “Eles liberaram a gente. Minha irmã foi para casa medicada e eu voltei para o meu trabalho. O meu advogado disse que a força da polícia usada em proporção a mim, que foi equivocada e que não precisavam ter me algemado, que teria sido uma prisão irregular”, comentou.
Ela e o advogado concordaram em ir até uma delegacia de polícia registrar um Boletim de Ocorrência (B.O). “Expliquei ao meu advogado que me senti coagida pelo policial, mesmo tento os meus direitos desrespeitados. Chegando à delegacia, assim que nós entramos, o plantonista disse que estava sem sistema e que não poderia realizar. Os mesmos policiais da ação estavam na delegacia”, disse.
Ainda na delegacia, de acordo com ela, o policial que teria feito o acordo teria gritado e dado voz de prisão para ela, no local. “No momento que ele viu que eu ia fazer um BO, ele se exaltou e eu fui impedida de fazer o BO porque o policial disse que eu estava descumprindo o acordo que ele fez, ele ia me da voz de prisão novamente. Ele foi muito grosso, bateu boca com o meu advogado e bateu nos peitos dele”, relatou.
Após esse episódio, ela concordou ir até a Central de Flagrantes, foi feito o cadastro e aguardaram a delegada de plantão para ouvir os depoimentos. “Eu estava detida por ter ido fazer um Boletim de Ocorrência contra um policial que teve uma conduta arbitraria comigo, que sou a irmã da vítima e que também fui vítima”, relatou.
Os policiais, segunda ela, confeccionaram o Relatório de Ocorrências Policiais (Rop). “Em nenhum momento eles citaram por tentar fazer um BO contra ele. Relataram também que resisti a prisão”, relembrou.
Após ser ouvida pela delegada ela foi liberada. “Eu não fui presa por desacato e sim por tentar fazer um BO contra um policial”, finalizou.
Confira a nota da Polícia Militar na íntegra
A Polícia Militar de Roraima informa que, por volta de 14h30 desta terça-feira, recebeu um chamado via Centro Integrado de Operações de Segurança Pública para atender uma ocorrência em um shopping, localizado no bairro Caçari, zona Leste de Boa Vista. Segundo a denúncia, estaria havendo uma ocorrência de “importunação” em um dos quiosques do prédio comércio.
Ao chegar ao local, encontrou no local uma mulher, de 34 anos, que estava alterada emocionalmente. A equipe da PM começou os procedimentos de intervenção, primeiramente solicitando que ela se acalmasse.
Nesse momento, a pessoa proferiu palavras de baixo calão contra uma funcionária do quiosque e contra a equipe da PM, bem como quebrou itens do estabelecimento comercial e ameaçou pessoas no local. Em determinado momento, ela agrediu com tapas no rosto e cuspiu um dos policiais presentes.
Presente na hora do ocorrido, a irmã da pessoa que apresentava alteração emocional, recebeu voz de prisão por desacato após avançar contra dois policiais no momento em que a irmã mais velha tentou agredir a funcionária do estabelecimento comercial.
Foram utilizadas técnicas policiais militares para conter as duas mulheres, sendo necessário chamar reforço.
Após recolhimento das duas mulheres, a equipe conduziu a mulher de 34 anos para o Hospital Geral de Roraima Rubens de Souza Bento, onde foi atendida por uma médica especialista que já acompanhava o caso clínico.
A irmã foi conduzida pela guarnição para o 5° Distrito Policial. Os itens pessoais da mulher foram entregues ao advogado da conduzida. Uma mulher, de 49 anos, também foi conduzida para testemunhar sobre a situação.