Na manhã dessa terça-feira a Polícia Federal (PF) deflagrou a Operação Cravada para desarticular o núcleo financeiro de facção criminosa (PCC), responsável pelo recolhimento, gerenciamento e emprego de valores para financiamento de crimes nos estados do Paraná, São Paulo, Mato Grosso do Sul, Acre, Roraima, Pernambuco e Minas Gerais. Em Boa Vista, dois mandados de busca e apreensão foram cumpridos, mas ninguém foi preso.
As investigações tiveram início em fevereiro deste ano. Dos 30 mandados de prisão expedidos, 26 foram cumpridos, por outro lado, todos os 55 mandados de busca e apreensão foram efetivados pelos policiais federais. Durante o cumprimento das ordens judiciais, duas pessoas foram presas em flagrante delito e autuadas em flagrante. Entre do material apreendido estão celulares, papéis da contabilidade da movimentação dos valores, pequenas quantidades de drogas, pendrives e HD. As ações ocorreram dentro e fora de presídios.
Dos mandados, oito foram cumpridos contra indivíduos que já estavam recolhidos ao sistema prisional e dos 22 restantes foram cumpridos 18, restando quatro foragidos. Em algumas regiões do país, as visitas foram interrompidas para cessar as ações dos líderes da facção. Em Roraima, as visitas de familiares foram retomadas há pouco tempo, mas com algumas restrições. Segundo o Coordenador da Operação, delegado federal Martin Bottaro Purper, a investigação foi intensa.
“Exigiu bastante da equipe, que num curto espaço de tempo teve que observar a dinâmica da organização criminosa e realizar ações efetivas com os parceiros para conseguir interromper esse modus operandi que consistia em ‘arrancar’ valores dos comparsas através de ‘rifas’ que eram cobradas de dois em dois meses. Eles têm uma mensalidade e esses valores sobem dentro de uma pirâmide. Esse valor sai da base e chega aos principais líderes, quem administra o dinheiro. Um detalhe interessante é que esse dinheiro é administrado em prol dos nobres”, explicou.
Cerca de 400 contas bancárias estão bloqueadas pela Justiça
As investigações ainda apontam que quem estava na base da pirâmide contribuía sem receber retribuição razoável. Os líderes recebiam o valor em cota única, utilizando contas bancárias de várias pessoas. Pelo menos 400 contas foram bloqueadas. Os criminosos utilizavam as contas de forma intercalada e a cada mês eram trocadas por outras contas para impedir fiscalização do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras] e dos próprios bancos.
“Para fazer isso, eles criaram códigos para identificar essas contas. Foram códigos difíceis de se descobrir, mas conseguimos entender. O código de identificação era basicamente passar o número do terminal onde foi feito o depósito, a hora e a primeira letra do nome [do tilular da conta]. Nós fizemos antecipações telefônicas e outros meios de investigação e conseguimos identificar tudo isso e realizar as medidas, como o bloqueio dessas contas”, acrescentou o delegado.
Os códigos eram colocados em planilhas para contabilidade. O controle dos valores que entravam e saíam era manuseado pelos responsáveis por fazer o que chamavam de fechamento, sendo também os que supervisionavam o dinheiro que precisava sair das contas e chegar ao destino final. “Muitas vezes foi possível acompanhar que havia pessoas devendo. As pessoas que devem ou pagam ou são excluídas ou são espancadas, e em algumas ocasiões pediam para praticar crimes. Se valem dos meios bárbaros para conseguir arrecadar dinheiro para que os líderes sejam sustentados pela base e consigam praticar os crimes contra toda a sociedade”, ressaltou Martin Bottaro.
Organização criminosa movimentava até R$ 1 mi por mês
Os valores movimentados todos os meses variam num montante entre R$ 800 mil e R$ 1 milhão. Nas Penitenciárias foram apreendidas planilhas comprovando que os visitantes dos presos recebiam valores como forma de contribuição pelas informações que entravam e saíam. “Nós chegamos a verificar R$ 311 mil entregues aos visitantes das penitenciárias federais. Quem está no topo da pirâmide não paga nada”, revelou o coordenador da operação.
As contas são denominadas pela Polícia como “contas de passagem”, porque nelas não eram depositadas grandes quantias, apenas serviam de caminho para que o dinheiro chegasse ao destinatário. “Esses valores eram gastos para comprar armas e drogas o tempo todo. Não para. Eles atuavam em todo o Brasil. Temos que fazer esse trabalho contínuo, buscando as lideranças e onde o dinheiro está para deixá-lo sem condições de atuar. Sem dinheiro, o crime não vinga, não sobrevive”, concluiu o delegado que presidiu as investigações.
O total dos valores bloqueados nas contas não foi informado porque a Polícia Federal disse que ainda vai receber os números finais dos bancos. Alguns bilhetes foram localizados pela Polícia Federal, que seriam levados para dentro das Unidades Prisionais.
CRAVADA – O nome da operação faz referência a uma jogada de xadrez em que uma peça, quando ameaçada de captura pela peça adversária, fica impossibilitada de se mover em razão de haver uma peça de maior valor em risco. De igual forma, a operação deflagrada visa sufocar as reações das lideranças de facções criminosas, atingindo os núcleos importantes de comunicação e de gerenciamento financeiro. (J.B)