Polícia

Presos usam celular para denunciar que estão sendo privados de seus direitos

Ao alegar que estão sem receber visita, atendimento médico e alimentação adequada, presos não escondem que têm celulares à disposição

Os detentos da Penitenciária Agrícola de Monte Cristo (PAMC) mais uma vez ligaram de celular de dentro do presídio para denunciar a situação em que se encontra a maior unidade prisional do Estado. Eles relatam que desde o dia 26 de outubro, data em que ocorreu a última rebelião, estão sendo privados de alimentação, atendimento médico, kits de higiene e do direito à visita de familiares e advogados.
Por telefone, detentos relataram que a população carcerária está sendo negligenciada pelo Governo do Estado. “Há quatro meses estamos sem receber o nosso kit de higiene pessoal. Já faz alguns dias que estamos sem tomar banho e utilizando a mesma roupa”, disse um preso que relatou ainda que a fossa séptica da unidade está aberta e que o poço artesiano não passa por manutenção. “Estamos expostos a todo tipo de doença aqui dentro. A fossa aberta pode contaminar a água que consumimos. Já relatamos esta situação para a direção da penitenciária, mas nenhuma providência foi tomada”, reclamou.
Conforme ele, os presos doentes não estão sendo levados para o Hospital Geral de Roraima (HGR) e alguns dos feridos na última rebelião ainda não receberam atendimento. “Tenho um companheiro que foi ferido por um estilhaço de granada. Até agora ele não foi atendido por um médico”, relatou.
Desde a última rebelião, os detentos foram privados do direito a visitas de familiares, advogados e defensores públicos, pois os agentes penitenciários que são responsáveis pela condução dos presos aos locais de visita estão em greve. “Estão tentando calar as nossas bocas, pois se não recebemos visitas, não contamos o que ocorre aqui dentro. Felizmente não ficamos totalmente incomunicáveis, pois temos celulares”, frisou.
O detento relatou que centenas de presos estão passando fome. A comida que é fornecida não está vindo em quantidade suficiente. Em alguns casos, uma marmita é dividida entre dois ou três detentos. “Vejo homens de todos os lados sem forças físicas, debilitados, bebendo água quente e cozinhando folhas de rúcula e cheiro verde para não passar fome”, disse.
Conforme o detento, durante as visitas os familiares levam medicamentos, como analgésicos e anti-inflamatórios para os doentes, mas os agentes penitenciários não os entregam. “Os agentes jogam tudo fora. Isso é uma fata de respeito para com os nossos familiares, que gastam dinheiro e se dão o trabalho de vir até aqui”, reclamou. 
CARTA – Com base no relato dos detentos, a Associação de Familiares e Amigos dos Reeducandos de Roraima (AFAR-RR) elaborou uma carta expondo toda a situação. Conforme o presidente da entidade, Saturno Souza, o documento será entregue ao Ministério Público do Estado de Roraima (MPRR), Ordem dos Advogados do Brasil Seccional Roraima (OAB-RR), Assembleia Legislativa de Roraima (ALE-RR) e Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania (Sejuc).
“Pedimos o apoio da sociedade para que juntos possamos verdadeiramente reeducar aqueles que estão ali por um motivo ou outro. Lembramos que, ao término de suas penas, todos irão retornar ao convívio social. Queremos que eles retornem melhores e mais humanos e não piores do que entraram”, disse Sousa.
Ele frisou que o Estado não cumpre a Lei de Execução Penal, que determina que todo detento tem direito à assistência jurídica, material de higiene pessoal, além de direito à saúde, educação e a visitas de familiares, advogados e defensores públicos. “Queremos apenas que a lei seja cumprida”, destacou.
Sejuc nega problemas e diz que vai agir para apreender celulares
Por meio da assessoria de comunicação, a Sejuc informou que, quanto à comida, os internos faltam com a verdade, pois o Estado dispõe de nutricionistas que acompanham todo o processo de produção, inclusive com prova degustativa dos alimentos diariamente.
A nota enviada à Folha informa que há uma equipe de saúde que atua dentro da unidade e que atende a todos os internos, de acordo com a necessidade. Afirmou que, apesar da greve dos agentes penitenciários, o grupo de intervenção tática (GIT), juntamente com a Força Nacional, vêm realizando todo o serviço de escolta aos hospitais sempre que há a necessidade de um atendimento médico diferenciado, quando a unidade não tem condições de atender.
“No entanto, tomamos conhecimento de denúncias de que agentes penitenciários não estariam repassando medicamentos levados por familiares aos reeducandos e esse fato será averiguado pela gestão da Sejuc”, frisou.
VISITAS – Conforme a Sejuc, nem o banho de sol e tampouco as visitas estão normalizadas na Pamc devido aos danos ocasionados pelos internos na unidade, tendo em vista o estrago ter comprometido a estrutura predial, inclusive comprometeu a segurança interna e externa do local.
CELULARES – Quanto aos possíveis celulares em posse de internos, a Sejuc juntamente com as demais forças policiais do Estado afirmou que tomará todas as providências cabíveis para encontrar e apreender tais materiais.
“Apesar de todo o esforço empreendido e das revistas minuciosas feitas em quem adentra na unidade, ainda nos deparamos com tais atos vergonhosos, de internos se comunicando com pessoas fora do sistema via celular, algo totalmente proibido e condenável por lei.  Não compactuamos com ilícitos de nenhuma natureza e os culpados e/ou facilitadores/transgressores, quando identificados, serão punidos de acordo com os rigores da lei”, diz a nota.
Informou ainda que é importante salientar que as situações adversas, tais como restrições de visitas de familiares e advogados, são ocasionadas justamente pela indisciplina e furor de alguns internos que, ao agirem de tal forma, comprometem a segurança do local, bem como põem em risco a vida de quem ali adentra.
“A gestão não está medindo esforços para sanar os problemas apresentados na unidade, porém é importante lembrar que uma segurança pública eficiente, de um modo geral, só pode ser realizada de forma conjunta, com o apoio e esforço de todos, inclusive da sociedade”, encerra a nota. (I.S)