ASSASSINATO DE AGRICULTORES

Segurança afirma em depoimento que autoridades tiveram conhecimento do crime

O Governo disse por meio de nota que as informações apresentadas pelo investigado são caluniosas e têm o intuito de denegrir a imagem do chefe do Executivo assim como das instituições de segurança pública

Capitão Helton disse que acompanhou Caio até o local do crime (Foto: reprodução)
Capitão Helton disse que acompanhou Caio até o local do crime (Foto: reprodução)

O ex-segurança do governador Antonio Denarium, o capitão da Polícia Militar Helton Jhon da Silva de Souza, de 48 anos, prestou novo depoimento no dia 27 de junho na Delegacia Geral de Homicídios.

Helton é um dos investigados pela morte do casal de agricultores Jânio Bonfim de Souza, de 57 anos e Flavia Guilarducci, 50, ocorrida no dia 23 de abril, na Vicinal do Surrão, município do Cantá.

No depoimento prestado ao delegado João Evangelista, que conduz a investigação, Helton afirma que no mesmo dia do crime teria entrado em contato com o comandante da Polícia Militar, coronel Miramilton Goiano, e que dois dias depois o irmão do principal suspeito do crime, teria ido conversar com o governador.

“Precisando falar com o senhor Urso Urso. O senhor está sabendo da situação ali do Cantá, e ele perguntou se era o caso da família Porto, falei que sim, e disse que estava no meio, e que eu estava lá”, conta sobre a conversa com o coronel Miramilton.

“Aí contei toda a situação lá. Ele disse que estava sabendo e que ia me dar retorno, e perguntou pelo meu celular, se eu estava com o celular lá, falei que estava, aí ele disse, então troca o celular, falei sim senhor”, relatando ao delegado que trocou o aparelho, mas permaneceu com o mesmo número, e que deu o telefone para o seu filho vender.

Ainda segundo Helton, ele continuou tentando falar com integrantes da família do empresário Caio Porto, na tentativa de que o mesmo se entregasse.

 “Fui pra casa, e tentei ligar pro Caio e para o irmão mas não atenderam. Não consegui dormir, no outro dia o irmão dele me ligou e disse que já tinha falado com advogado, e que assim que fosse relaxada a prisão dos dois que haviam sido flagranteados, ele iria se apresentar”, relatou.

“Na quinta-feira assumi o serviço, quando deu por volta das 10h, eu estava na sala da segurança. Quando fomos informados que o governador ia se deslocar pra fazer uma gravação, foi quando saímos pra esperar o governador, e ele vinha descendo, conversando com o irmão do Caio, e outras pessoas. Aí cumprimentei ele de cabeça, ai o governador atravessou pra gravar o convite pro último comício da eleição suplementar de Alto Alegre”, contou.

“O irmão do Caio ficou desse lado e eu perguntei, e aí como é que ficou?  Ele disse que havia conversado com o governador e que ele teria tentado ligar pra delegada geral duas vezes, mas não conseguiu, e que não estava sabendo o que estava acontecendo”.

Segundo o capitão, naquele momento, a delegada teria retornado à ligação para o governador que falou para o irmão do Caio que ele podia falar diretamente com ela. “Aí eu pensei que ele ia se apresentar”, relatou.

Ainda segundo Helton, a única autoridade que ele entrou em contato foi o comandante da PM.

O delegado pergunta a Helton se em algum momento ele disse pra que o capitão se apresentasse, e ele responde que não. E que apenas teria dito pra trocar o celular.

A reportagem entrou em contato com o Governo do Estado, que se manifestou por meio da seguinte nota:

O Governo de Roraima esclarece que é o principal interessado na elucidação do caso e reforça que espera que os culpados pelo crime sejam punidos com o rigor da lei.

Afirma que as informações apresentadas pelo investigado são caluniosas e têm o intuito de denegrir a imagem do chefe do Executivo, assim como das instituições de segurança pública do Estado e ressalta que a atual gestão foi a que mais investiu em segurança pública na história de Roraima.

O governador do Estado de Roraima, Antonio Denarium, não compactua com nenhum tipo de ilicitude e solicita rigor na apuração de qualquer crime, o que não seria diferente neste caso.

O comandante-geral da PMRR, coronel Miramilton Goiano de Souza informa que recebeu com surpresa o teor do suposto depoimento prestado e afirma, de forma categórica, que não recebeu nenhuma ligação telefônica, horas após o crime em que o capitão Helton Jhon é investigado.

Esclarece que recebeu uma ligação do capitão Helton dias após o crime ocorrido. No entanto, em nenhum momento da conversa o capitão lhe confessou qualquer cometimento de crime, até porque seria ilógico alguém confessar um crime por ligação telefônica.

O coronel afirma ainda que não houve nenhuma orientação para que Helton se desfizesse de telefone e que, assim que ocorreu a divulgação do áudio e a suspeição de envolvimento do capitão no crime, a orientação sempre foi para que o militar se apresentasse e expusesse sua versão às autoridades.

O capitão Helton Jhon foi apresentado à Polícia Militar e ficou à disposição das autoridades policiais e Judiciária. Ele não ficou foragido e encontrava-se em serviço administrativo na corporação.

Neste sentido, todas as ações tomadas pelo comandante-geral da PMRR em relação ao caso foram tratadas dentro dos canais institucionais apropriados, de forma a garantir que as investigações ocorressem de forma isenta e imparcial.

A delegada-geral da Polícia Civil de Roraima, Darlinda Moura Viana, reforça que não reconhece nenhuma das supostas afirmações alegadas pelo capitão investigado e lamenta este tipo de postura com fins políticos, frente a um crime que tem recebido toda a atenção das forças de segurança pública estaduais.

Fazenda 3A onde o crime foi cometido (Foto: Divulgação)

A dinâmica do crime  

Ainda durante o depoimento, o capitão detalhou como teria sido a dinâmica do crime.

Segundo Helton, ele foi procurado por Caio um dia antes, o chamando para ir até o local, tendo em vista que teria alguém fazendo uma cerca na fundiária de seu terreno. “Eu estava de serviço e disse que não poderia ir, mas pedi para que ele me contasse o desenrolar da situação quando retornasse”, contou.

“A noite deixamos o governador em casa, e voltamos ao palácio para desarmar, foi quando o Caio me ligou e perguntei como tinha sido lá, ele me disse que o cara queria tomar a terra, e já tinha pasto lá, e que seria uma invasão antiga. Ele disse ainda que encontrou até um cara com um rifle lá.  Pergunte se ele também estava armado e ele disse que estava com uma 380, e que teria ido na companhia do Jabá, o caseiro e um tal de mira”, relatou.

“No outro dia ele me ligou, e perguntou se tinha como ir na S-10, e disse que a Ranger tinha quebrado, e que ia deixar na oficina. Aí fui buscar ele em uma casa do lado de um salão de beleza, e fomos só nós dois”, relatou.

“Quando chegamos ao local por volta das 9h, ele mesmo abriu a porteira, e disse que o terreno era do pai dele. Passamos pelo caseiro que estava trabalhando com uma roçadeira. Chegando na residência, o casal estava sentado na mesa. Eu vi que ela pegou o celular. Falei bom dia, peguei na mão do Jânio. Sentei na mureta e o Caio sentou na cadeira. Aí começaram a conversar”, disse.

Ainda segundo Helton, a conversa durou mais de 20 minutos, e que a gravação divulgada estaria em pedaços. “Não foi só chegar lá e discutiu e atirou não. Ela disse que tinha se sentido ameaçada, e que ele tinha ameaçado o policial com a arma no dia anterior. Quando ele começou a conversar comigo, o Caio levantou e falou, [Ah vocês estão falando que estou armado, e estou armado mesmo], aí ele atirou no Jânio e depois na mulher, gritei três vezes não, não, não”, acrescentou.

As vítimas Jânio Bonfim e Flavia Guilarducci

Arma do crime

Ainda no depoimento, o capitão da Polícia Militar confessou ao delegado que escondeu a arma do crime, em uma edícula na própria casa, segundo ele, para que Caio não se desfizesse do objeto. Durante o depoimento, investigadores foram até a casa de Helton e a encontraram no local indicado por ele.

A reportagem entrou em contato com os advogados de Caio Porto, que se manifestou por meio da seguinte nota:

A recente história política do país está repleta de acusações em processos penais que, sem a devida fundamentação legal, levaram à destruição da reputação de muitas pessoas.

Não por acaso, Tribunais em todo o país vêm, sistematicamente revendo parte expressiva desses processos.

No mais, devemos dizer que não tivemos acesso integral aos elementos do inquérito policial. Portanto, não podemos manifestar sobre o conteúdo das investigações que, por sinal, estão sob sigilo por ordem judicial.

A reportagem também procurou a defesa do capitão Helton Jhon, mas não obteve retorno.