Há pouco mais de três meses, quando o primeiro caso do novo coronavírus foi confirmado em solo brasileiro, os profissionais de saúde enfrentam diariamente a realidade instalada com a doença. Uma pesquisa elaborada pela Escola de Administração de Empresa de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas (FGV-Eaesp), e divulgada pela Agência Bori revelou que 68% dos trabalhadores que estão na linha de frente do combate à doença não se sentem preparados para agir.
Entre os entrevistados, apenas 15% afirmam estar preparados. O estudo intitulado como “A pandemia de Covid-19 e os profissionais de saúde pública no Brasil” foi realizado entre os dias 15 de abril e 1º de maio de 2020, com 1.456 profissionais que atuam nas diferentes esferas da saúde pública – como agentes comunitários, médicos, enfermeiros e demais integrantes das equipes – em todos os estados do país, por meio de formulário eletrônico.
Neste cenário, 91,25% dos agentes comunitários e dos agentes de combate à pandemia relataram estar com medo de contrair a doença. Entre os médicos, o percentual cai para 77,68%, e com os enfermeiros é de 84,35%. De acordo com as regiões do país, os índices gerais são: Norte (92,3%), Nordeste (90,6%), Sudeste (87,2%), Sul (85%) e Centro-Oeste (82,2%).
A apreensão dos profissionais pode ser explicada pelas mortes de profissionais da saúde. Segundo dados do Conselho Federal de Enfermagem, já morreram no Brasil cerca de 137 profissionais da área em decorrência da Covid-19. Entre os agentes, são 40 óbitos registrados.
Também há preocupação pela baixa distribuição de equipamentos de proteção individual (EPI’s). Ao todo, apenas 32% deles disseram que receberam os materiais – a maior parte deles, médicos. Entre os agentes, são 19,65% os que possuem formas de proteção.
“Os EPIs são, obviamente, uma condição básica para o trabalho na saúde. Todo profissional deveria ter máscara, luva, álcool em gel. Sabemos que o Brasil atrasou muito na aquisição desses equipamentos. Tínhamos cerca de quatro semanas de preparação à frente dos epicentros na Ásia e na Europa, mas o país não fez compras antecipadas, não incentivou a indústria nacional a comprar antecipadamente o equipamento e fomos comprar quando já estava muito em cima”, afirma Gabriela Lotta, professora da FGV e coordenadora do Núcleo de Estudos da Burocracia.
Além disso, o estudo aponta que a maior parte dos profissionais não recebeu um treinamento adequado para o período. Entre os agentes, cerca de 89,32% não foram preparados para agir na pandemia. Médicos e enfermeiros foram os que relataram os maiores índices de ensinamento, com 45,45% e 41,17%, respectivamente. A região Norte foi o local em que menos profissionais afirmaram estar treinados para o cenário.
“Fica muito evidente que as regiões Norte e Nordeste estão piores do que todas as outras. Claramente há uma desigualdade regional em todos os aspectos avaliados. Isso vem da desigualdade de capacidade dos estados. Sabemos por vários indicadores que há uma distribuição desigual de médicos, leitos de UTI e equipamentos no Brasil. No momento de pandemia, essas desigualdades acumuladas explodem”, avalia Lotta.
Para ela, a solução para todos os problemas apresentados na pesquisa é simples. “São necessários testes periódicos do profissional, vídeos de treinamento para esclarecer desde o uso de máscaras até o que é fake news e o que não é, distribuir equipamentos”, explica.